Título: Apreço, nada além disso
Autor: Jeronimo, Josie; Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 20/03/2011, Política, p. 5

A VISITA DE OBAMA Obama distribuiu sorrisos e desfilou afagos ao Brasil no discurso, mas, na prática, o apoio à entrada do Brasil no Conselho de Segurança ficou apenas no plano simbólico. Para o Itamaraty, ainda assim houve uma vitória a ser celebrada

Um apoio a uma ¿expansão limitada¿ do Conselho de Segurança das Nações Unidas e um ¿apreço à aspiração¿ do Brasil em tornar-se membro permanente do seleto grupo. Foi esse o máximo que o país conseguiu do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, durante sua primeira visita ao Brasil. Comparado ao apoio dado pelo líder americano à Índia em novembro, o avanço parece tímido, mas foi suficiente para contentar o governo brasileiro. O tom da declaração de Obama no Palácio do Planalto e do texto do comunicado conjunto agradou o Itamaraty, que considerou a passagem do americano por aqui mais positiva do que se esperava.

Reconhecido pela boa retórica, Obama fez um discurso elogioso ao Brasil, no qual disse que não só reconhece o crescimento do país, como o ¿apoia entusiasticamente¿. Entretanto, o excelente orador deixou para o comunicado conjunto a parte enfática ao anseio brasileiro de entrar, como membro permanente, no Conselho de Segurança. Em sua fala, só lembrou que o Brasil aspira ao posto e que os EUA vão continuar trabalhando com outros países para tornar o órgão ¿mais efetivo, eficiente e representativo¿. No texto divulgado após o encontro, Obama ¿manifesta apreço à aspiração do Brasil em tornar-se membro permanente do Conselho¿. Em sua visita a Nova Délhi, contudo, ele foi muito mais claro: ¿Anseio uma reforma do Conselho de Segurança da ONU que inclua a Índia como membro permanente¿.

Segundo o Itamaraty, a menção ao tema, com a precisão que está no comunicado, só foi conseguida na véspera da visita. E, só por isso, já seria uma conquista. ¿Não esperávamos uma manifestação mais explícita. Até ontem não havia no comunicado menção à aspiração do Brasil¿, disse o porta-voz do Itamaraty, Tovar Nunes. Para o ministério, isso mostra que houve intervenção direta da Casa Branca, já que a decisão foi tomada ¿do mais alto nível¿, isto é, pelo próprio Obama.

No discurso, o presidente americano também destacou o momento de aproximação que os dois países estão vivendo. ¿A presidente Rousseff e eu acreditamos que a visita é uma oportunidade histórica de colocar os EUA e o Brasil no caminho em direção a uma cooperação ainda maior¿, disse. Ele destacou o trabalho conjunto dos dois países em fóruns como o G-20, e como essa instituição permitiu a países do porte do Brasil terem ¿mais voz¿.

Franqueza Para o governo brasileiro, a boa interação no diálogo e o reconhecimento feito pelo presidente Obama do Brasil como ator global surpreenderam positivamente. ¿Foi um encontro de cordialidade, mas de franqueza¿, afirmou o porta-voz do chanceler Antonio Patriota. A franqueza teria sido observada especialmente quando os dois conversaram sobre a situação da Líbia. Quando Obama afirmou ser iminente uma intervenção militar no país de Muamar Kadafi, Dilma alertou para os custos e benefícios da ação, que poderia levar a uma onda ainda maior de violência. O Brasil, na última semana, se absteve de votar a resolução para criar uma zona de exclusão aérea na Líbia, por considerar o texto vago e com brechas para uma atuação mais opressiva contra o país árabe.

Obama destacou, em sua declaração, que seu país quer ser ¿um dos principais consumidores¿ do petróleo brasileiro. ¿Com as novas descobertas de petróleo no Brasil, a presidente Rousseff já disse que o país quer ser um dos principais fornecedores de energia. Eu disse a ela que os EUA querem ser um dos principais consumidores, o que seria uma situação `win-win¿ (de lucro) para os dois países¿, disse. No comunicado conjunto, os dois países dizem que há ¿interesses convergentes¿ nos setores de petróleo, gás natural, biocombustíveis e outras fontes renováveis, e os EUA expressam o desejo de se tornar ¿parceiro estratégico¿ do Brasil na área de energia. Uma dessas parcerias seria na área de tecnologia para a perfuração em águas profundas e extração de petróleo.

Ausência Apesar de todo o interesse expressado pelo lado americano, no entanto, o secretário de Energia, Steven Chu, cancelou, de última hora, a participação na comitiva. O governo brasileiro disse não ter recebido explicação para a ausência. Com Obama, vieram dois importantes secretários: Timothy Geithner, do Tesouro, e Gary Locke, do Comércio. Também vieram o representante de Comércio, Ron Kirk, o vice-conselheiro nacional para assuntos econômicos internacionais, Michael Froman, e o subsecretário de Estado para Assuntos do Hemisfério Ocidental, Arturo Valenzuela.

A área de Defesa foi representada pelo assessor de Segurança Nacional, Tom Donilon, uma vez que o secretário da pasta, Robert Gates, não integrou a comitiva. Segundo o governo brasileiro, o tema de Defesa foi, inclusive, abordado de maneira breve no encontro entre os presidentes. Obama não teria, inclusive, falado sobre a venda dos caças com a anfitriã ¿oportunidade perdida, já que os Estados Unidos participam da concorrência FX-2 da Força Aérea Brasileira (FAB) com o F-18 Super Hornet, da Boeing. Em seu discurso, Obama citou o tema apenas para falar da parceria dos países no Haiti e destacar a parceria contra o narcotráfico.

Lamento olímpico O visitante arrancou risos dos presentes ao afirmar que sofre até hoje ao lembrar que o Brasil venceu os Estados Unidos na escolha para sediar as Olimpíadas de 2016. Chicago, a cidade em que morou mais de 20 anos ¿ e onde vivia com a família antes de se mudar para a Casa Branca, perdeu para o Rio de Janeiro na disputa. ¿Como o Brasil se prepara para sediar a Copa e as Olimpíadas ¿ o que me machuca até hoje dizer ¿ estamos assegurando que as empresas americanas possam participar dos projetos de infraestrutura necessários para esses jogos¿, disse. Um dos memorandos assinados entre os países prevê a cooperação para a organização de grandes eventos esportivos, inclusive com a promoção de parcerias público-privadas em apoio aos preparativos.