Título: Protestos invisíveis a Obama
Autor: Iunes, Ivan; Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 20/03/2011, Política, p. 8

a Visita de obama O forte esquema de segurança impediu que as manifestações chegassem próximas do presidente dos Estados Unidos

No dia em que Estados Unidos e França iniciaram os ataques contra as forças militares do ditador da Líbia, Muamar Kadafi moradores de Brasília de origem árabe aproveitaram a presença do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, para um protesto silencioso, individual e ¿ ainda assim ¿ carregado de revolta. Eles defenderam a revolução árabe em curso e a autonomia de seus países. Horas antes dos primeiros ataques empreendidos por Estados Unidos e França contra a Líbia, o sentimento predominante entre essas pessoas que procuraram ver Obama era de preocupação sobre a possível ofensiva bélica dos norte-americanos.

¿O quartel-general de Kadafi deve ser bombardeado, mas as ações devem ser empreendidas pela Organização das Nações Unidas. Os Estados Unidos não estão se importando com a situação¿, disse o líbio Abdalla Al Hamdy, 47 anos, que compareceu à Praça dos Três Poderes com uma bandeira da Líbia e com uma faixa onde estavam escritos dois recados, um para Obama ¿ em inglês ¿ e outro para a presidente Dilma Rousseff. ¿Kadafi agradece e oferece a você mais petróleo com sangue líbio¿, escreveu Abdalla a Obama. A Dilma, ele escreveu: ¿Seu silêncio ajuda o tirano da Líbia.¿ Nem o presidente dos Estados Unidos nem a mandatária brasileira leram os recados. A distância mínima entre Abdalla e os dois era de 500 metros.

Para o egípcio Amro El Seoudi, 28, os líbios podem se livrar do ditador Muamar Kadafi sem a intervenção militar dos Estados Unidos, a exemplo do Egito. O tradutor marroquino Abderrahman Belhaddan, 42, defende que os Estados Unidos tomem uma posição mais clara em relação aos ditadores de países árabes. ¿Não se deve esperar o tempo passar para saber quem vai ganhar força nas revoluções.¿ Amro e Abderrahman formavam o pequeno grupo de árabes que tentou ver Obama no Palácio do Planalto. Não portavam faixas ou cartazes. Para protestar, usaram o material levado por militantes do PSol e do PSTU. Os esquerdistas ¿ cerca de 15 pessoas ¿ também protestaram contra a interferência dos Estados Unidos na Líbia e em outros países árabes.

Recados O discurso contra o ¿imperialismo¿ norte-americano incluiu a defesa dos interesses econômicos do Brasil. Nas poucas vezes em que os militantes do PSol e do PSTU se manifestaram verbalmente, entoaram um grito de guerra: ¿Obama, não venha não. No pré-sal você não põe a mão¿. O fechamento da Praça dos Três Poderes impediu a aproximação desses militantes, o que provocou mais protesto, ainda que sem força e presença expressiva de partidários. ¿É uma falta de democracia não deixar ninguém chegar mais perto, inclusive pessoas que vieram para apoiar Obama¿, disse Ana Beatriz Serpa, integrante da Diretoria do PSTU no Distrito Federal.

O grupo que esteve mais perto de dar um recado direto a Obama foi o de 30 jovens das Uniões Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Nacional dos Estudantes (UNE) e da Juventude Socialista (UJS). Posicionados em frente ao Ministério do Trabalho, o ponto mais perto do Itamaraty, os estudantes estenderam uma faixa gigante em que ¿mandavam¿ Obama de volta aos Estados Unidos. Quando o carro com o presidente passou pelo local, a faixa já havia sido retirada e os manifestantes tinham ido embora. Um erro de cálculo de 30 minutos. A UJS estendeu uma faixa no alto da Rodoviária do Plano Piloto com palavras de ordem contra Obama.

Um homem fez um protesto solitário contra a política trabalhista norte-americana, portando uma faixa com dizeres em inglês. Ele veio de São Paulo especialmente para a visita de Obama. Depois de cinco anos trabalhando em Boston, na mesma empresa e pagando todos os impostos exigidoss, ele foi demitido e ficou sem seus direitos trabalhistas.

Familiares e amigos de vítimas do acidente envolvendo o Boeing da Gol, em 2006, também protestaram. Eles pediram punição para os pilotos norte-americanos que operavam o Legacy que se chocou no ar com o Boeing, que fazia o voo 1907. Os pilotos serão ouvidos neste mês pela Justiça brasileira, por videoconferência. Cerca de 20 pessoas vestiam camisetas e portavam faixas que pediam a Obama sua interferência no caso. ¿Os pilotos, até agora, saíram impunes¿, disse Anne Caroline Rickli, 33. A mãe dela, Maria das Graças, estava no voo 1907.