Título: Em busca do livre comércio
Autor: Hessel, Rosana; Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 20/03/2011, Política, p. 12

Dilma Rousseff e Barack Obama defendem a redução das barreiras e o aumento dos investimentos, mas câmbio é problema

Os presidentes Dilma Rousseff e Barack Obama mandaram mensagens parecidas sobre a necessidade de derrubar barreiras comerciais e estimular investimentos entre os dois países aos empresários convidados para o almoço realizado ontem no Palácio do Itamaraty. ¿Os Estados Unidos e o Brasil perseguem, juntos, a conclusão bem-sucedida da Rodada Doha, da OMC (Organização Mundial de Comércio), com regras de comércio mais transparentes e mais justas¿, disse Dilma. ¿No comércio bilateral, estou certa de que é mútuo o interesse de promover a geração de fluxos mais equilibrados, tanto em termos quantitativos como qualitativos.¿

Em seu breve discurso, Obama destacou o ganho de importância do Brasil no cenário político e econômico mundial e procurou reforçar as vantagens de laços mais estreitos entre Washington e Brasília. ¿Hoje, estamos diante de uma histórica oportunidade. Nós estamos fincando os alicerces para uma grande cooperação e parceria entre nossas nações para as próximas décadas que virão. E eu firmemente acredito que isso significará mais prosperidade e mais segurança ¿ não somente para as pessoas das duas nações mas também para os da América Latina e do mundo¿, disse o presidente norte-americano.

Pouco antes do almoço, 18 presidentes de empresas brasileiras e norte-americanas se reuniram no Itamaraty para a 6ª reunião do Fórum de CEOs (principais executivos das companhias), grupo criado em 2007 e integrado pelos gigantes brasileiros Banco Safra, Camargo Corrêa, Coteminas, Cutrale, Embraer, Gerdau, Odebrecht, Stefanini, Vale e Votorantim e pelas norte-americanas Anadarko, Cargill, CH2Hill, Citibank, Cummins, Illinois Tool Works, International Paper e Praxair. Numa reunião, eles entregaram aos mandatários uma lista de recomendações para a ampliação da cooperação comercial e econômica.

Após o almoço, o assessor de Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, informou que os assuntos previstos na pauta foram abordados no encontro dos dois governantes. ¿Foi uma conversa muito boa, cordial, mas franca. E, de uma certa maneira, abrangente. Nós insistimos muito na necessidade de estabelecer um equilíbrio maior no comércio e a presidente Dilma mencionou que, para enfrentar bem o problema comercial, temos vários caminhos¿, disse, citando a conclusão da Rodada Doha de liberalização comercial.

¿Também chamamos a atenção para o fato de que existem constrangimentos cambiais para o comércio¿, completou Garcia, em referência à guerra de desvalorização das moedas provocada pelos EUA que eleva o valor do real e prejudica as exportações brasileiras. Segundo o assessor, Dilma destacou na conversa que pretende transformar o Brasil em um exportador de petróleo e de derivados.

Acordos Na manhã de ontem, representantes dos governos do Brasil e dos EUA anunciaram a assinatura de 10 acordos de cooperação bilateral em diversas áreas. A maioria desses documentos ainda não apresenta passos concretos em busca da ampliação do comércio entre os dois países ¿ no ano passado, os EUA perderam para a China o posto de principal mercado para os produtos brasileiros. A balança comercial entre Brasil e Estados Unidos tem oscilado bastante nas últimas duas décadas, mas o deficit brasileiro é crescente, chegando a US$ 7,7 bilhões em 2010 (veja gráficos).

Para o professor do Instituto de Relações Internacionais da UnB Flávio Saraiva, nenhum dos documentos firmados promove mudanças radicais. ¿Os acordos são protocolares, compõem um conjunto de ações planejadas para o momento. O principal motivo da visita de Obama é política¿ afirmou. ¿Os acordos representam um desvio calculado na área econômica para que não houvesse fracassos durante a visita. O que importa, porém, não são os acordos, um tanto genéricos, mas a retomada de um fluxo histórico de colaboração política entre os dois países.¿

O primeiro dos acordos anunciados pelo Itamaraty foi o de Comércio e Cooperação Econômica (veja quadro), que prevê a criação de uma comissão para facilitar as trocas de produtos e os investimentos. Também deverá incentivar os objetivos comuns na OMC, onde o Brasil tem ganho causas importantes dos norte-americanos. Outro convênio formalizou o acordo ¿Céus abertos¿, firmado em dezembro do ano passado para a queda gradual dos limites do número de vôos entre os dois países até a total liberalização em 2015.

MINISTROS REVISTADOS » O severo esquema de segurança do serviço secreto norte-americano irritou os ministros Guido Mantega (Fazenda), Edison Lobão (Minas e Energia), Aloizio Mercadante (Ciências e Tecnologia) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento). Indignados com a revista na porta do Centro de Convenções Brasil 21, abandonaram o local antes do discurso do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, considerou um absurdo o governo federal ter permitido que ministros de estado brasileiro fossem revistados em solo nacional. ¿Não acho que houve abuso. Não é um problema com eles (norte-americanos). É uma questão nossa. Nós não devíamos permitir¿, afirmou ao deixar o encontro e ouvir relatos de que funcionários da própria embaixada americana e jornalistas também foram barrados na porta do evento.

Estreitando os laços

Ontem, os governos do Brasil e dos Estados Unidos anunciaram a assinatura de 10 acordos de cooperação bilateral. Veja os principais.

» Comércio: o acordo prevê a formação de um colegiado envolvendo os ministros da área econômica para melhoraras relações comerciais entre os dois países, incluindo a redução das barreiras comerciais. Um roteiro foi desenhado para os trabalhos.

» Jogos esportivos: intercâmbio na preparação da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. Estão previstas visitas a antigas sedes norte-americanas dos dois eventos e capacitação profissional.

» Pesquisa: termo assinado entre as duas principais instituições de pesquisa dos dois países, Fulbright e Capes, para intensificar seminários e programas de mestrado e doutorado.

» Transporte aéreo: o protocolo flexibiliza a operação comercial das empresas de aviação civil nos dois países, com o objetivo de incentivar o aumento de linhas e a diminuição nos preços das passagens.

» Infraestrutura: os EUA vão emprestar US$ 1 bilhão para financiar projetos de infraestrutura para o setor petrolífero brasileiro. Outros recursos serão direcionados a projetos conjuntos de companhias brasileiras e norte-americanas em terceiros países, principalmente na África.