Título: Lula trabalha para evitar que crise contamine a sucessão
Autor: Lavoratti,Liliana
Fonte: Gazeta Mercantil, 20/01/2009, Brasil, p. A10

São Paulo, 20 de Janeiro de 2009 - O alvo do novo pacote de medidas em elaboração no Palácio do Planalto, e que deve ser anunciado até o final deste mês, não se restringe à economia. Além de estimular a atividade econômica interna e, com isso, conter as demissões de trabalhadores no País, as pouco mais de dez iniciativas em análise têm um objetivo político certeiro: evitar que o mau desempenho dos principais indicadores econômicos contamine 2010, ano da sucessão presidencial. "O governo está fazendo tudo para que no início do próximo ano existam bons resultados para divulgar", afirma o cientista político da Arko Advice Análise Política, Cristiano Noronha.

Está em análise no governo um conjunto de mais de dez iniciativas que complementam as anunciadas no final de 2008, quando o foco foi o setor automobilístico, por meio da isenção e redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Desta vez, a maioria das medidas é voltada para beneficiar a construção civil, pelo seu elevado potencial de empregar mão-de-obra, mas existem também estímulos pontuais para o agronegócio, infra-estrutura e emprego - ampliação para dez meses do prazo de suspensão temporária do contrato de trabalho. A redução da taxa de juros básica (Selic), na primeira reunião do ano do Comitê de Política Monetária (Copom), hoje e amanhã.

"Como um médico que fica o tempo todo medindo a pressão e a temperatura do paciente que está na UTI, o governo vai monitorar todos os sinais da economia. Se as medidas tomadas ano passado não apresentarem a reação esperada até o final de março, é possível que novos estímulos sejam adotados, inclusive a prorrogação da isenção e redação das alíquotas do IPI para além do final de março, enfatiza Noronha. Segundo ele, a renovação do benefício fiscal teria o objetivo de manter pelo menos as vendas de veículos novos em um patamar seguro para que a queda na taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), em 2009, não vá além das últimas previsões. Para o mercado, neste ano a economia brasileira terá um incremento de cerca de 2%, menos da metade dos 5% estimados para 2008.

A preocupação do Palácio do Planalto não é à toa, esclarece o cientista político da Arko Advice. O último relatório oficial do governo dá conta de 654 mil demissões apenas no mês de dezembro, praticamente o dobro da média histórica do período, que gira em torno de 300 mil demissões. E a elevada popularidade do presidente Lula, nos últimos seis anos, esteve ancorada basicamente em três pilares: a estabilidade econômica, o crescimento do emprego e os ganhos de renda por meio dos reajustes salariais, do salário mínimo e dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família. Segundo a última pesquisa do Ibope, divulgada em 8 de dezembro, 73% dos entrevistados consideram o governo Lula "bom ou ótimo". Um ano antes, esse contingente ficava em 51%. A aprovação pessoal do presidente também subiu muito. Pulou de 65% para 84%.

Na opinião de Noronha, se a crise abalar fortemente, em parte ou no todo, esses eixos de sustentação da avaliação positiva desfrutada pelo governo e pelo presidente da República, o prestígio junto à população também será prejudicado. E, em consequência, a capacidade do presidente Lula eleger seu sucessor, apontada pelas atuais pesquisas, pode sofrer um baque razoável. "Se não existissem vários outros motivos para combater os efeitos nocivos da crise global no mercado interno, essa já seria uma boa razão", salienta o analista político. Nos quatro anos do primeiro mandato e nos dois primeiros do segundo, o atual governo contou com a benevolência de uma conjuntura externa favorável, com a economia mundial puxando o crescimento interno. Esse cenário, no entanto, começou a mudar com o surgimento da crise global, representando uma pedra no caminho dos planos de eleger a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), que pelo tudo indica, é a candidata preferida do presidente Lula.

"Sair do governo em um momento difícil é muito ruim para um político e Lula está experimentando a possibilidade disso acontecer em 2010. Minimizar o estrago é o desafio que está sendo encarado pela equipe econômica. O eleitorado tende a se lembrar mais do final do mandato do que os tempos áureos do início e do meio, especialmente quando começa a perder o emprego e sentir no bolso os problemas", enfatiza Noronha. Entretanto, ele faz uma ressalva: por enquanto, o presidente Lula está obtendo sucesso com o discurso de que a crise não é nossa, não resulta de erros governamentais na condução da política econômica. "Essa ideia já foi internalizada e, isso, em certa medida, reduz o estrago na imagem do governo e do presidente da República", comenta.

Ainda de acordo com Noronha, "Lula é tão sortudo" que a crise surgida durante seu governo vem dos países desenvolvidos. Isso pressupõe maior poder de fogo para atacar os problemas e, portanto, a chance de uma recuperação rápida. "Por enquanto não se está questionando a qualidade da nossa economia e do governo", conclui.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 10)(Liliana Lavoratti)