Título: O mundo atento ao discurso de Barack Obama
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Fonte: Gazeta Mercantil, 20/01/2009, Internacional, p. A14
Washington, 20 de Janeiro de 2009 - Embora seja o orador mais brilhante a ocupar a Casa Branca em uma geração, Barack Obama enfrenta hoje uma missão assustadora. Suas palavras deverão ser transformadoras. Precisam dar início à mudança da qual falou durante 18 meses em sua campanha eleitoral - quase uma convocação. Seus discursos o ajudaram a vencer as eleições.
Entretanto Obama subirá à tribuna para seu discurso de posse, encarando uma recessão econômica. E o presidente eleito enfrenta uma tarefa gigantesca de equilibrar uma mensagem de esperança e sacrifício com a realidade de que não haverá soluções da noite para o dia, e que poderá levar anos - talvez todo o seu mandato - para que a economia se recupere.
Os discursos de posse tentam, habitualmente, elevar o espírito americano e são endereçados ao mundo em nome da democracia. Incitam ao bipartidarismo e à coesão. E mesmo quando não é politicamente necessário, na maioria das vezes pedem por mudanças.
Obama já minimiza a crença internacional de que será o salvador do mundo. Já falou com severidade sobre o tempo que levará para uma recuperação econômica. "Desde a noite da eleição, Obama não usa de retórica entusiástica. Ao contrário, diminui as expectativas", disse David Kusnet, ex-redator de discursos para Bill Clinton e professor do Economic Policy Institute.
Ray Zeuschner, especialista em discursos políticos na California Polytechnic State University- San Luis Obispo, disse que será difícil conseguir o equilíbrio. "Obama precisa manter elevadas as expectativas e esperanças, mas não demais porque isso irá desencorajar as pessoas."
As posses presidenciais com frequência acontecem em momentos difíceis na história do país. Tomemos o discurso de posse de Abraham Lincoln em 1861, às vésperas da Guerra Civil, ou o de John F. Kennedy, em 1961, na turbulência da Guerra Fria, quando disse: "Que nunca negociemos movidos pelo medo. Mas que nunca tenhamos medo de negociar."
Em meio ao arrocho econômico , vamos recordar os discursos em 1933 e 1981 respectivamente de Franklin Roosevelt e Ronald Reagan. Ambos mandaram mensagens - dentro de cenários políticos específicos - sobre como resolver a crise financeira do país.
Depois de dizer que "a única coisa que devemos temer é o próprio medo", Roosevelt incitou "ao fim da especulação com o dinheiro dos outros, e deve haver uma providência para que haja uma moeda adequada e saudável."
Especialistas em oratória e ex-redatores de discursos presidenciais antecipam que Obama irá incitar os americanos ao sacrifício e energia em nome do país - tema comum em sua campanha - e talvez repita em 2009 a famosa frase de Kennedy em 1961: Não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer por seu país." Esses analistas também estão ansiosos para ver se Obama irá adotar um discurso simples ao estilo de Lincoln: "Meus compatriotas, pensem bem e com calma sobre esse assunto. Não se perde nada empregando o tempo para pensar."
Ao herdar uma crise econômica sem precedentes e vários conflitos no Oriente Médio, Obama precisará de todo seu carisma para semear confiança depois de oito anos de governo de George W. Bush, mas a verdade é que o novo presidente americano não possui uma varinha de condão.
Glorificado por um fervor popular extraordinário, o 44 presidente dos EUA sabe que não tem o direito de decepcionar seus correligionários. "Primeiro presidente negro. Melhor que seja bom", disse sua filha Malia, de 10 anos, referindo-se ao discurso de posse que Obama pronunciará hoje ao meio dia de Washington (13h de Brasília) no balcão do Capitólio, segundo uma matéria divulgada pelo The Washington Post.
A necessidade de receber boas notícias é tanta que o piloto do avião que fez um pouso de emergência no rio Hudson, em Nova York, salvando a vida de todos passageiros e tripulantes, foi transformado em um herói nacional, e receceu telefonemas de Bush e Obama.
Mas antes de instalar-se definitivamente no Salão Oval, Obama não se cansa de repetir aos compatriotas a gravidade da situação, para adverti-los que não poderá consertar tudo com uma varinha de condão, quaisquer que tenham sido as promessas de campanha. Já começou a seguir este conselho no início do mês, ao declarar: "a estrada será longa. O custo será duro. Pode ser que não consigamos em um ano ou, até mesmo, em um mandato, mas eu jamais estive tão cheio de esperanças de que conseguiremos". "É provável que as coisas piorem antes de melhorar", advertiu para convencer o Congresso a votar o mais rapidamente o segundo plano resgate econômico, de US$ 825 bilhões.
No plano internacional Obama também dissemina grandes expectativas. O vice-presidente eleito Joe Biden se manifestou "inquieto" pelas esperanças depositadas nele no estrangeiro.
E, enquanto isso, Robert Gates, secretário de Defesa de Bush e de Obama, estará ausente na cerimônia de posse porque foi designado para assegurar a presidência dos EUA caso ocorra um atentado contra Obama e Biden.
(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 14)(The New York Times e AFP)