Título: Recuperação de preço agrícola não viabiliza safra 2009/10
Autor: Botelho,Gilmara
Fonte: Gazeta Mercantil, 29/01/2009, Agronegócio, p. B9

São Paulo, 29 de Janeiro de 2009 - A inversão do cenário baixista no mercado agrícola promovida pela alta do dólar e pela escassez de oferta acentuada em decorrência das perdas climáticas não deve gerar recursos próprios grandes o bastante para financiar a safra seguinte (2009/10). E ela, a próxima safra, vai depender sobremaneira deste tipo de financiamento, prevê a AgraFNP.

Presos a uma dívida rural superior a R$ 130 bilhões, dos quais apenas R$ 75 bilhões foram renegociados, os produtores brasileiros financiaram menos da metade da atual safra com recursos oficiais. Foram R$ 40 bilhões gastos para custear uma produção que demandou pelo menos R$ 87 bilhões para ser cultivada. Outros R$ 25 bilhões foram emprestados a juros oficiais e destinados à investimentos e comercialização da safra que já começou a ser colhida.

As tradings, comercializadoras de grãos e de créditos extraoficiais, já reduziram em 10% o volume de recursos na atual safra em comparação com a anterior. E, de acordo com José Vicente Ferraz, diretor-técnico da AgraFNP, elas "estarão amarradas para financiar", já que dependem em demasia do mercado externo para alcançarem o crédito que repassam aos agricultores brasileiros. "As tradings não têm condição de repatriar o recurso necessário em tempo hábil", adverte Ferraz.

Para o analista, a safra 2008/09, que já começou a ser colhida, não absorveu o impacto da restrição de crédito inaugurada a partir da falência decretada pelo Lehman Brothers em 15 de setembro e da consequente crise financeira que se instaurou na economia mundial. "O maior entrave da agricultura brasileira se deslocou do custo de produção para o financiamento", avalia.

A queda no preço do petróleo, impulsionou uma desvalorização dos insumos de maneira geral. Segundo levantamento da AgraFNP, de agosto do ano passado até o primeiro mês deste ano, os preços dos fertilizantes já recuaram cerca de 20%. A demanda por adubo acompanhou a tendência e fechou o ano de 2008 10% menor que a registrada em 2007. "E o efeito residual dos fertilizantes usados em safras passadas que sustentou parte da produtividade no campo na atual, não vai mais fazer garantir resultados na próxima", acredita Ferraz.

Resposta indireta à safra americana, a produção agrícola brasileira a ser colhida ainda em 2010, mas já semeada a partir do segundo semestre deste ano, deve demandar R$ 150 bilhões, entre custeio, investimento e comercialização, estima a AgraFNP. A previsão da consultoria já leva em consideração uma redução de 3% na área plantada com milho e um aumento de 6% nos hectares cultivados com soja em solo americano. Para o Brasil, a previsão é de estagnação na área plantada total.

A expectativa de rentabilidade do milho que ainda vai ser colhido nos próximos meses é negativa, pontua Jacqueline Bierhals. As contas da equipe técnica da AgraFNP apontam para um prejuízo médio de R$ 400 por hectare, "isso se mantiverem os atuais patamares de preços", pondera a analista. Já a soja, negociada por mais de R$ 40 a saca, deve render R$ 600 de margem por hectare ao produtor - 3% da oleaginosa já foram colhidos.

"O fundamento que vai reger o mercado em 2009 é de escassez de oferta. A crise vai determinar sim uma queda na demanda, mas essa retração vai ser bem menor que a registrada na quantidade de grãos ofertada", conclui Bierhals.

(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 9)(Gilmara Botelho)