Título: Governo vai intensificar fiscalização de alimentos
Autor: Daniel Pereira
Fonte: Gazeta Mercantil, 22/09/2004, Legislação, p. A-8

O governo não pretende dar trégua aos fabricantes de alimentos que trabalham com organismos geneticamente modificados (OGMs). Ontem, o diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça, Ricardo Morishita, reconheceu que a possibilidade de liberação de cultivo e plantio de soja transgênica nas próximas safras é um tema polêmico, capaz de dividir opiniões inclusive dentro do governo.

Mas ele destacou ser incontestável o direito dos consumidores à informação clara e transparente acerca da composição dos alimentos. Morishita prometeu fiscalização rigorosa sobre o setor alimentício a fim de verificar se tal direito, inscrito há 14 anos no Código de Defesa do Consumidor (CDC), está sendo respeitado. "Todos sabem que é uma pauta mínima de nossa sociedade informar adequadamente o consumidor sobre se o produto que ele consome é transgênico ou não."

Na verdade, o trabalho de fiscalização já está em curso. No último dia 25 de agosto, o DPDC coordenou uma ação entre órgãos de defesa do consumidor de nove estados brasileiros, distribuídos pelas cinco regiões do País, que recolheu em supermercados amostras de 45 produtos com soja na composição. Entre eles, sopas, biscoitos e torradas. O material está sob análise do laboratório francês SGS. Pretende-se descobrir quem no setor produtivo está desrespeitando o Decreto 4.680/03.

O texto diz que a embalagem de todo alimento destinado ao consumo humano ou animal em cuja composição haja participação de mais de 1% de transgênicos precisa alertar os consumidores sobre a presença de OGM, seguindo regras em vigor desde 2003. Além disso, a embalagem tem de conter o rótulo de transgênicos definido pelo governo, no ano passado, após uma consulta pública. "Espero profundamente que as empresas estejam cumprindo os direitos dos consumidores, que o discurso de respeito a eles seja uma prática", disse Morishita.

Se os resultados da perícia, que devem ficar prontos na primeira semana de outubro, mostrarem o contrário, o DPDC abrirá processos contra as empresas, que correm o risco de pagar multas entre R$ 212 e R$ 3,2 milhões. "As empresas terão de explicar aos consumidores por que deixaram de informar, por que optaram por agir às escuras, por que faltaram com a transparência, a boa-fé e a lealdade", declarou Morishita. No governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, a obrigação de informação aos consumidores sobre a presença de transgênicos só existia a partir do percentual de 4%.

"O decreto anterior isentava quase a maioria dos produtos", afirmou o diretor do DPDC, ao explicar o motivo da mudança da regra. "A União Européia trabalha com percentual de 0,9%. Ninguém está inventando nada." Pelo menos dois dispositivos do CDC garantem aos consumidores o direito a informações transparentes. O artigo 6º, por exemplo, obriga o setor produtivo a providenciar "informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentam". O CDC seria tão claro e contundente que Morishita concorda com a decisão do senador Ney Suassuna (PMDB-PB), relator da nova Lei de Biossegurança no Senado, de retirar do projeto toda a parte relativa à rotulagem de transgênicos. "Não vejo o menor problema. O sistema está posto com muita estabilidade", disse Morishita.