Título: Democracia na AL precisa ser reavaliada, dizem ex-presidentes
Autor: Vizia,Bruno De
Fonte: Gazeta Mercantil, 09/03/2009, Brasil, p. A6

O conceito de democracia na América Latina (AL) é incerto, e há uma certa indulgência em chamar de democracia determinados regimes latino-americanos. Esta foi uma das constatações feitas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), durante reunião com outros ex-presidentes latino-americanos em São Paulo, na última sexta-feira. "Daqui a pouco estamos chamando de democracia coisas comuns a regimes ditatoriais, com referendos e consultas à população que não refletem de fato a vontade popular" afirmou FHC.

A crise financeira mundial também afeta duramente os países deste continente, na avaliação da maior parte dos dignatários presentes ao encontro. O ex-presidente da Bolívia, Carlos Mesa, destacou que a turbulência financeira deverá testar se "a democracia na América Latina é um produto da bonança econômica que vivemos nos últimos anos, e que agora acabou, ou se é uma tendência permanente". Para Mesa, a tendência é que a economia informal, que ocupa de 30% a 60% do total da produção, dependendo do país analisado, cresça em todo o continente nos próximos meses.

Obama

Em relação ao presidente norteamericano recém-eleito, Barack Obama, as expectativas do continente são altas. "O Obama tem uma chance grande de melhorar as relações dos Estados Unidos com a América Latina, principalmente em temas como uma relação comercial mais equitativa e aquecimento global", salientou Alejandro Toledo, ex-presidente do Peru. Ele pediu que Obama envie um representante que possa "escutar a América Latina". Já o boliviano Mesa espera que o presidente norteamericano acabe com o bloqueio à Cuba, que é uma questão "não só obsoleta, como estúpida". Mesa sugeriu que a suspensão do bloqueio seja realizada de maneira unilateral pelos EUA, "para jogar a pressão moral para Cuba".

Críticas a Lula

Após considerações sobre a América Latina, Fernando Henrique disparou críticas à Lula e seu governo. Segundo FHC, Lula faz "propaganda do otimismo" na crise, mas não apresenta medidas concretas. "Na bonança não fizemos as reformas, agora se dá a impressão de que faremos tudo de uma vez", disse o ex-presidente brasileiro, que criticou o programa habitacional do atual governo, que pretende construir 1 milhão de habitações para famílias com renda de até três salários mínimos: "Não dizem de onde virão os recursos, nem se tem os materiais".

Afogando o PAC

FHC também centrou fogo no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), menina dos olhos do presidente Lula: "o PAC não está sendo afogado por falta de recursos, mas sim por falta de competência". Para Fernando Henrique, não faltam projetos, e o investimento em infraestrutura no País ainda é "muito pouco, não chega a 1% do Produto Interno Bruto (PIB), e tem que contar com investimentos privados".

O ex-presidente brasileiro considera que o atual governo "talvez esteja exagerando na liberação de recursos", o que poderá gerar "novos esqueletos ou problemas de caixa no médio prazo". Ele acrescenta que falta um marco mais claro ao País, estabelecendo mecanismos mais claros pelo qual devemos fazer os investimentos.

A expansão dos gastos de custeio, que tem impacto marginal na elevação do consumo, também foi apontada por FHC: "com gastos com salários são crescentes até 2012, e não tem volta, porque a constituição não permite".

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 6)(Bruno De Vizia)