Título: Debate nuclear
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 24/03/2011, Brasil, p. 10

Senadores vão visitar Angra 2 para averiguar a falta de licença de operação, conforme o Correio denunciou ontem

A divulgação pelo Correio da inexistência de licença definitiva para o funcionamento da usina nuclear Angra 2, em Angra dos Reis (RJ), despertou a reação de senadores, que já questionavam o programa nuclear brasileiro desde a ocorrência do acidente radioativo no Japão, há duas semanas. Durante a audiência pública promovida por três comissões do Senado na manhã de ontem, os senadores Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), presidente da Comissão de Meio Ambiente, e Lindbergh Farias (PT-RJ), que integra a Comissão de Infraestrutura, cobraram do presidente da Eletrobras Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro, uma posição sobre a operação de Angra 2 sem a Autorização de Operação Permanente (AOP). O diretor de Radioproteção e Segurança Nuclear da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), Laercio Antonio Vinhas, também precisou dar explicações aos parlamentares sobre a irregularidade. A comissão de 10 senadores que visitará Angra 1 e 2 na próxima semana vai, inclusive, solicitar à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma explicação sobre a inexistência da licença.

Othon Luiz e Laercio Antonio atribuíram a responsabilidade à PGR, que não liberou as duas estatais do cumprimento de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado anos atrás. Cláusulas do TAC impedem a concessão da licença definitiva a Angra 2 enquanto todas as exigências não forem cumpridas. A Eletronuclear e a Cnen argumentam que todas as exigências ¿ a maior parte delas relacionada ao plano de emergência em Angra dos Reis e a impactos ambientais na região ¿ foram atendidas, não havendo, portanto, razões para a continuidade do TAC. Ao Correio, entretanto, a 4ª Câmara de Coordenação e Revisão da PGR, responsável por questões relacionadas às usinas nucleares, confirmou que diversas cláusulas do TAC não foram cumpridas. Entre elas estão a exigência de planos básicos ambientais e de monitoramento dos efluentes líquidos e da água do mar. ¿As informações solicitadas sempre chegam incompletas¿, sustenta a PGR.

A audiência no Senado foi convocada depois da tragédia nuclear em Fukushima, no Japão. Os dirigentes da Eletronuclear e da Cnen foram chamados para prestar esclarecimentos sobre Angra 1 e 2, em pleno funcionamento; Angra 3, que está em construção; e sobre as oito novas usinas previstas para o Nordeste e o Sudeste brasileiro. A informação de que Angra 2 funciona há 10 anos somente com uma Autorização de Operação Inicial (AOI), sucessivamente renovada pela Cnen, norteou a discussão na audiência pública. ¿Para mim, o debate começa por essa informação. É preciso esclarecer as razões para a autorização permanente não ter sido expedida ainda pela Cnen¿, disse o senador Lindbergh Farias.

¿A empresa obteve a licença inicial e depois houve `n¿ renovações, a cada ano. A Eletronuclear cumpriu todos os requisitos para ter a autorização definitiva¿, justificou o presidente da estatal responsável pela construção e operação das usinas nucleares, Othon Luiz. ¿As dívidas não são nucleares. O que existe são pequenas dívidas ambientais, como um viaduto, uma ponte.¿ Para o diretor da Cnen, Laercio Antonio, não há razões para se preocupar. ¿Esse não é um problema preocupante, é um problema administrativo. Todos os requisitos para a concessão da licença já foram cumpridos pela Eletronuclear.¿

Ibama Angra 2 é uma usina nuclear sem licença ambiental ¿ atribuição do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ¿ e sem autorização de operação definitiva, responsabilidade da Cnen, ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). As duas permissões são necessárias para a operação de um reator nuclear. A primeira, para verificar o impacto ambiental. A segunda, para controlar os riscos de radioatividade. Depois que a Cnen expediu a autorização inicial, o reator passou a ser observado para a concessão da autorização permanente. Se não existem riscos à segurança, a licença precisa ser concedida, o que não ocorreu. Os problemas são estritamente ambientais, segundo a Cnen, e não envolvem a parte nuclear da usina. ¿Aparentemente, o MPF está com problema de isenção¿, criticou o presidente do órgão, Odair Dias Gonçalves. Ele participou ontem de outra audiência sobre energia nuclear, promovida pela Comissão de Minas e Energia da Câmara.

Três usinas no Nordeste A Região Nordeste vai receber as três primeiras usinas nucleares fora da região de Angra dos Reis (RJ) porque precisa de energia para sustentar seu crescimento econômico. É o que afirmou o engenheiro nuclear José Mauro Esteves dos Santos, ex-presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), em palestra a alunos do UniCeub, na noite de ontem. ¿Só restam 10% do potencial hidráulico do Nordeste para serem utilizados. Como a região precisa crescer, necessitará de energia nuclear¿, disse o especialista. A previsão é que duas dessas usinas estejam construídas até 2021. A terceira, até 2030. (VS)