Título: Políticas protecionistas preocupam
Autor: Monteiro, Ricardo Rego; Hessel, Rosana
Fonte: Gazeta Mercantil, 17/04/2009, Word Economic Forum, p. A14
Relatório elaborado pelos participantes do WEF prevê medidas para enfrentar a crise.
Os participantes da versão latinoamericana do World Economic Forum (WEF) demonstraram preocupação com o recrudescimento do protecionismo comercial, explicitada no documento final do evento encerrado ontem, no Rio de Janeiro. Internamente, no entanto, persiste entre os representantes do setor privado no comitê organizador o temor de um maior cerco ao sistema financeiro internacional, como consequência da crise mundial.
A declaração final, preparada pelos mais de 600 participantes dos dois dias de debates, será apresentada aos chefes de Estado e de governo que estarão reunidos hoje e amanhã na Cúpula das Américas. O diretor para a América Latina do WEF, Emilio Lozoya, informou que o documento foi encaminhado ao secretário geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Miguel Insulza, para que ele entregue em mãos aos presidentes presentes em Port of Spain, em Trinidad e Tobago.
Ausente do documento, no entanto, o tema regulação financeira veio à tona nas palavras do vice-presidente para América Latina e Caribe do Itaú-Unibanco, Ricardo Vilella Marino, no painel final do evento. Organizador do Fórum na categoria de Jovem Líder Global, o executivo afirmou que a redução dos riscos no sistema financeiro internacional precisa passar pela adoção de ¿um sistema de supervisão bancária inteligente¿, e não pela ¿regulação excessiva¿ dos mercados.
¿É importante que as discussões sobre o sistema financeiro internacional não resultem em um excesso de regulação, mas em um sistema de supervisão bancária inteligente¿, recomendou o executivo.
O documento prevê medidas para enfrentar a crise no curto e no longo prazo, de modo a assegurar um crescimento sustentável para os países da região. Para isso, explicou Lozoya, foram enumerados cinco passos para uma agenda que deverá ser discutida durante a cúpula de hoje.
O diretor do Fórum destacou, como primeiro ponto, a necessidade de um programa de crédito dos organismos multilaterais mais amplo para ajudar a recapitalização dos países mais vulneráveis.
Revelou, ainda, que os executivos presentes ao Fórum desejam a ampliação dos programas de estímulo econômico de curto prazo que tenham eficácia comprovada.
Parcerias ¿O Bolsa Família é um exemplo, mas é importante também tomar medidas de longo prazo que garantam um crescimento mais sustentável, como investimento em infraestrutura¿, afirmou Lozoya, ao acrescentar que o momento atual é de comprometimento tanto de governo quanto do setor empresarial para promover parcerias público-privadas em investimentos de infraestrutura que garantam o crescimento e novos investidores para a região.
Aliás, o cenário hoje é bastante particular, ressaltou o diretor do WEF, uma vez que o Brasil hoje transformou-se em credor do Fundo Monetário Internacional (FMI) e a atual crise financeira teve origem nos países desenvolvidos.
¿Pela primeira vez, a América Latina não faz parte do problema (a crise financeira), mas não deve perder a oportunidade de ser parte da solução. Este é o momento para que a região se torne atraente para os investimentos futuros¿, afirmou Lozoya.
Sustentabilidade Durante o painel final, o presidente do Grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, manifestou confiança no que classificou como oportunidade de inaugurar um novo paradigma de crescimento, pautado pela sustentabilidade, a partir da crise mundial. Para o executivo, a solução da turbulência deve passar necessariamente pela inclusão social, que poderá contribuir para a incorporação de novos contingentes de consumidores ao mercado mundial.
¿Imaginem se a população latinoamericana como um todo passar a consumir como hoje o fazem europeus e americanos. Isso será parte da solução para a crise, porque hoje o europeu e o americano não têm mais como consumir em níveis superiores aos atuais¿, afirmou Odebrecht.
Integração Econômica Além da necessidade de reforçar as conquistas sociais, um dos pontos mais destacados pelos palestrantes do painel final diz respeito ao esforço contra o protecionismo.
O ministro de Indústria, Comércio e Turismo da Colômbia, Luiz Gullermo Plata, lembrou que o aumento da integração econômica é fundamental para ampliar o consumo e a renda mundial.
¿Se todos adotarem medidas protecionistas, não vai ajudar a sair da crise, porque reduz o mercado¿, alertou Plata.
A secretária executiva da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), divisão da ONU para o continente, Alicia Bárcena, destacou a necessidade de parcerias público-privadas para o fortalecimento dos negócios no continente. ¿Para seu êxito, necessita-se de um Estado com capacidade para ser sócio crível: profissionalismo, integridade, conhecimentos tecnológicos, e solidez fiscal que permitam financiar programas e incentivos que ajudem as empresas a buscar novos mercados¿, disse.
A Cepal avalia com preocupação o impacto da crise de demanda sobre as economias latinoamericanas, na medida em que a China tem desovado enormes estoques para o mundo, prejudicando as exportações de economias menores. Calcula-se que cerca de 15 milhões de pessoas ficarão abaixo da linha de pobreza por causa da crise.
Ontem, o WEF divulgou pela primeira vez um estudo sobre competitividade só sobre o Brasil e convidou alguns especialistas para participar da elaboração do documento como a Fundação Dom Cabral e a consultoria McKinsey. Anualmente, o Forum realiza um comparativo sobre a competitividade. Este ano, foram pesquisados 134 países e o Brasil ficou na 59ª classificação geral, mas em alguns itens como desvio dos fundos públicos, confiança nos políticos, desperdício de gastos públicos, acabou ficando entre os últimos lembra a economista Claudia Costin, secretária de Educação da cidade do Rio de Janeiro.
¿Houve algumas melhoras, mas as instituições brasileiras ainda estão na adolescência¿, afirmou Costin.
Para o professor da Fundação Dom Cabral e que ajudou na elaboração do estudo, Carlos Arruda, na última década, houve muitas mudanças mas o que mais garante a competitividade brasileira ainda é a capacidade do empresário. ¿O brasileiro se reinventa diante das dificuldades da burocracia e da infraestrutura que o País ainda enfrenta¿, afirmou.
Para completar, o diretor da McKinsey Nicola Calicchio, lembrou que se fosse analisado somente o setor privado, o Brasil ainda estaria entre os 30 melhores colocados na pesquisa do WEF.