Título: Sequência de equívocos
Autor: Rizzo, Alana ; Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 25/03/2011, Política, p. 2

Entrevista - Marco Aurélio Mello Defensor da não aplicação da Lei da Ficha Limpa na eleição de 2010 desde o início das discussões, o ministro Marco Aurélio Mello comemora a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e critica o fato de a Corte eleitoral ter dado esperanças à sociedade sobre a punição dos políticos condenados.

Desde o início o senhor defendeu insistentemente que a regra só poderia valer para 2012. O resultado da votação mostra que o senhor tinha razão?

O resultado mostra que prevaleceu o direito e o texto previsto na Constituição. Para a sociedade, que tem visão leiga sobre a legislação, pode até não parecer, mas houve avanço cultural com essa votação. Digo isso porque mostramos o preço que se paga por viver em uma democracia e respeitar e cumprir as leis. Nem sempre isso resulta no que gostaríamos.

O senhor não teme que em uma matéria tão polêmica e com tamanho peso na opinião pública não pareça que o STF protegeu os políticos com ficha suja?

É bom que se esclareça que ninguém na Corte é contra o afastamento de quem claudicou. Somos a favor da lei aprovada pelo Congresso. Concordamos com ela e defendemos a aplicação. O que não permitimos, como juízes, foi que sua importância ultrapassasse as barreiras do texto constitucional que proíbe mudanças nas regras eleitorais quando falta menos de um ano para a realização do pleito.

Como o senhor analisa a decepção instaurada na sociedade e nos setores que brigaram e articularam a votação dessa lei?

Claro que sabemos desse anseio social por uma política mais limpa e por representantes sem condenações. Isso é válido. No entanto, como ministros, temos que ter em mente que processo não tem capa. Tem conteúdo. Não somos justiceiros e nossa atuação não é ligada ou dependente da opinião pública. Infelizmente, a postura do TSE diante do assunto criou uma falsa expectativa na sociedade.

Então o senhor acha que o TSE errou na condução do tema?

Sem dúvida errou muito. Houve uma sequência de equívocos da Justiça Eleitoral e isso criou toda essa confusão. Primeiro porque a Corte não poderia ter respondido a uma consulta sobre o assunto em pleno andamento dos preparativos para o pleito eleitoral. Tradicionalmente não se responde a consultas sobre eleições com o processo em curso. Até chamei a atenção para isso, mas mesmo assim o TSE respondeu. Bem, desde então, teve início uma sequência de interpretações sobre a lei que apontavam apenas para possíveis tendências. Foi um erro atrás do outro. Daí tamanha frustração da sociedade sobre um assunto que juridicamente estava resolvido desde o início. (IT)