Título: Relações em transição
Autor: Fleck, Isabel
Fonte: Correio Braziliense, 25/03/2011, Mundo, p. 20

A posição do Brasil sobre a questão iraniana vem mudando na passagem da Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva para Dilma Rousseff

O voto de ontem no Conselho de Direitos Humanos da ONU confirmou um ajuste de tom que começou a ficar perceptível antes mesmo da posse de Dilma. Em entrevista ao jornal norte-americano The Washington Post, ainda como presidente eleita, ela explicitou sua discordância com a abstenção do Brasil em uma votação sobre o tema na ONU e afirmou que, no exercício do cargo, teria dado orientação diferente. Em 8 de março passado, por ocasião do Dia Internacional da Mulher, a Embaixada do Brasil em Genebra, sede do conselho, homenageou a ativista iraniana Shirin Ebadi (foto), ganhadora do Nobel da Paz e uma das opositoras mais notórias e veementes do regime islâmico.

Apedrejamento

A condenação da iraniana Sakineh Ashtiani (foto) à morte por apedrejamento (pena depois alterada para enforcamento), sob as acusações de adultério e cumplicidade no assassinato do marido, foi tratada por Lula como uma questão de foro doméstico do Irã. Embora tenha se manifestado contra a sentença, em termos brandos, o ex-presidente se absteve de interceder diretamente, a não ser pela oferta de receber Sakineh como asilada, se essa fosse uma solução aceitável ¿para o meu amigo Ahmadinejad¿. Dilma, antes de empossada, condenou de maneira veemente a condenação de Sakineh e usou o termo ¿barbaridade¿ para classificar a execução por apedrejamento.

Programa nuclear Lula assumiu progressivamente uma postura de protagonismo em relação ao impasse entre o Irã e as grandes potências, embora alegando que o fez a pedido de outros governantes, entre eles o presidente americano, Barack Obama. Essa postura culminou com o acordo assinado em Teerã (foto), em maio passado, pelo qual o regime islâmico se dispunha a aceitar que o urânio destinado a um de seus reatores fosse enriquecido fora do país ¿ concessão ignorada como insuficiente e tardia pelas potências, que aprovaram mais uma rodada de sanções. Até aqui, inclusive porque o assunto não voltou à agenda internacional, o governo Dilma não se pronunciou sobre ele.