Título: CNA leva ao Congresso nova proposta
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Fonte: Gazeta Mercantil, 04/05/2009, Brasil, p. A10

4 de Maio de 2009 - A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Sociedade Rural Brasileira (SRB) entregam nesta semana ao Congresso Nacional uma proposta de reformulação ampla do Código Florestal, elaborado semana passada e contendo as principais reivindicações do setor. "Teríamos de comprar uma área equivalente ao Uruguai para ficar na legalidade", afirma o presidente da SRB, Cesário Ramalho da Silva. Segundo ele, a agropecuária utiliza atualmente em torno de 35% do território nacional, enquanto a legislação vigente manda ocupar apenas cerca de 25%. "Se as regras não mudarem, teremos de devolver para a preservação ambiental 4 milhões de hectares no Paraná, 3,5 milhões de hectares em São Paulo, entre outras conseqüências", diz.

Segundo Cesário, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou "escandalizado" com o estudo da Embrapa . Essa reação deixou os produtores rurais otimistas com a possibilidade de aprovação de mudanças na legislação, via Congresso Nacional e, principalmente, a suspensão do decreto 6.514, de 22 de julho de 2008, que regulamenta a Lei de Crimes Ambientais e penaliza com multas a partir de dezembro próximo as propriedades que não fizeram a recomposição das reservas legais. A ideia é aprovar as alterações ainda este ano. "Uma coisa é a nossa proposta de alteração abrangente do Código Florestal, outra é o projeto conduzido pelo ministro Reinhold Stephanes, mais pragmática e com amplo apoio parlamentar", ressalta Cesário.

O presidente da SRB reconhece que o debate é "polêmico, politizado e ideológico", mas pelo fato de tratar-se de "uma questão muito grave para o País", ele acredita na superação de divergências partidárias ou entre oposição e governo. Cesário explicou que a linha geral das mudanças previstas na proposta da CNA e SRB é trabalhar por uma legislação possível de ser cumprida. Até a semana passada, existiam 33 propostas de alteração do Código Florestal protocaladas na Câmara e Senado.

Entre os pontos defendidos, estão a possibilidade de recompor as Áreas de Proteção Permanente (APPs) em qualquer lugar do País, e não no mesmo bioma; o reconhecimento e anistia para quem quiser se regularizar; a manutenção das áreas consolidadas ¿ como as plantações de arroz em várzeas no Sul; a composição de 50% da reserva legal com espécies exóticas ¿ hoje é obrigatório o plantio de árvores nativas; redefinição do tamanho das APPs a ser feita pelos estados, entre outros.

Alguns desses pleitos já são permitidos em São Paulo. Decreto recente do governo estadual autoriza a recomposição fora da propriedade, com o produtor rural arrendando floresta de terceiros, que estejam na mesma bacia hidrográfica e com a mesma importância ambiental. Além disso, possibilita também que a reserva legal seja refeita em até 50% com espécies exóticas, de uso econômico, como eucalipto e seringueira. Entretanto, a outra metade precisa ser de espécie nativa.

"Essas alterações vão dar viabilidade econômica às reservas legais, além de tornar a legislação possível de ser cumprida, pois atualmente coloca na ilegalidade 1 milhão do total de 5 milhões de produtores rurais existentes no Brasil", acentua o presidente da SRB. "O ministro está tendo a coragem de enfrentar um tema complexo, mas que precisa ser discutido. A legislação ambiental brasileira tem que ser modificada para efetivamente cumprir seu papel de conservação, sem barrar a produção e o desenvolvimento do País."

O primeiro debate público no Legislativo sobre a reformulação do Código Florestal foi uma mostra da elevada sensibilidade do assunto. Audiência pública conjunta entre todas as comissões do Senado, na última sexta-feira, durou toda a manhã e o início da tarde, reunindo pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), do Ministério do Meio Ambiente, da Fundação Nacional do Índio (Funai), de senadores que defendem diferentes posições, como Marina Silva (PT-AC) e Kátia Abreu (DEM-TO).

A maioria dos senadores concorda que o código precisa ser revisto, já que a lei é de 1965. Não há, entretanto, consenso quanto às mudanças que precisam ser feitas. Kátia Abreu, que também preside a CNA, defende um código nacional com diretrizes gerais sobre as leis florestais, mas que cada estado e município deliberem sobre as peculiaridades referentes a seu relevo e tipo de solo, por exemplo.

"A Constituição de 1988 é clara quando diz que essa é uma matéria de competência concorrente [deve ser dividida entre União, estados e municípios], e nós inclusive já temos jurisprudência sobre isso no Supremo Tribunal Federal (STF). Se o governo federal decentralizou a saúde e a educação, por que não o meio ambiente também?", questionou a senadora.

Já Marina Silva é contra a idéia de dividir com os outros entes federados a legislação sobre a preservação das florestas e outros biomas, como o Pantanal e o Cerrado. "A proposta de cada estado ter um código florestal é a atomização da legislação ambiental brasileira e a desconstituição do Sistema Nacional de Meio Ambiente, o que seria altamente prejudicial para o Brasil", afirmou Marina.

A proposta inicial de Kátia Abreu, que apresentou os requerimentos para a audiência conjunta, é que após as discussões seja apresentado um projeto de lei para substituir ou mudar o código.

Até o autor do estudo que sustenta a campanha pela alteração das leis, o pesquisador da Embrapa Evaristo Eduardo de Miranda, defendeu uma certa cautela com o tema. Na audiência pública no Senado, ele disse que a reforma do código é válida, desde que isso seja feito de maneira a impedir que aconteçam mais desmatamentos. Ele apresentou aos senadores o sistema de gestão territorial da Embrapa, que monitora por satélites, entre outros dados, as extensões territoriais destinadas à preservação ambiental.

De acordo com o especialista, um dos cenários, em uma possível alteração do Código Florestal, seria a inclusão dessas APPs (Áreas de Preservação Permanente) no cálculo da área das reservas legais, o que elevaria para 41% a área disponível para as atividades agropecuárias.

Ele também chamou a atenção para a necessidade de, ao se fazer a modificação, levar-se em conta a complexa situação de ocupação ilegal de atividades agropastoris do país, práticas que perduram há mais de um século, com plantio de café em São Paulo e Minas Gerais; arroz e vinhedos no Rio Grande do Sul; pecuária no Pantanal; e irrigação no Nordeste.

L.L. com agência Brasil e Senado

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 10)(L.L. com agência Brasil e Senado)