Título: Produção industrial cai 14,7% no trimestre
Autor: Saito,Ana Carolina
Fonte: Gazeta Mercantil, 06/05/2009, Brasil, p. A4

São Paulo, 6 de Maio de 2009 - A forte retração da produção industrial nos primeiros três meses do ano indica que a economia brasileira não escapou do quadro de recessão técnica, caracterizado por dois trimestres consecutivos de queda. Por outro lado, para analistas consultados pela Gazeta Mercantil, há sinais de que a indústria deve começar a reagir a partir do segundo trimestre deste ano.

Em março, a produção industrial apresentou uma leve recuperação, com crescimento de 0,7% sobre fevereiro, mas retração de 10% em relação a igual mês do ano passado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com o resultado, acumulou três primeiros meses do ano uma queda de 14,7% na comparação com o primeiro trimestre do ano passado, o pior desempenho desde o primeiro trimestre de 1991. "O crescimento de 0,7% é muito tímido. Mesmo a indústria crescesse 2%, todos os meses, ainda fecharia o ano no negativo", diz o economista Rogério César de Souza, do Instituto para Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi). Em 12 meses, a produção recuou 1,9%.

Segundo o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, a produção industrial cresceu apenas 4,8% entre janeiro e março em relação aos níveis de dezembro do ano passado, após uma redução de 20,1% nos últimos três meses de 2008 do patamar de atividade pré-crise, em setembro. "A indústria recuperou apenas um quarto das perdas", afirma o economista.

A consultoria projeta uma queda de 0,5% a 1,5% do Produto Interno Bruto no primeiro trimestre do ano em relação aos último três meses de 2008. Na comparação o primeiro trimestre do ano passado, a retração deve ser de 1,5% e 2%. "E, se isso se confirmar, será interrompida uma sequência de 28 trimestres consecutivos de desempenho positivo na comparação anual", diz Borges.

Mas atividade pode começar a reagir a partir do segundo trimestre. Na sua avaliação, o Brasil seguiu o roteiro dos Estados Unidos, onde o consumo de estoques foi responsável por metade da queda de 6% do PIB. No caso brasileiro, sem a influência dos estoques, o PIB ficaria estável em relação ao trimestre anterior. "O lado bom é que, no segundo trimestre, a indústria vai ter que reagir. As empresas começaram abril com os estoques normalizados", diz Borges, que prevê uma retomada dos patamares de produção mais próximos do período pré-crise só no segundo semestre. Para o ano, a projeção é de crescimento de 0,9% do PIB.

Marianna Costa, da Link Investimentos, que espera uma expansão de 0,5% do PIB em 2009, também projeta uma recuperação da atividade apenas em meados do ano. Para a economista, a produção industrial deve levar o PIB do primeiro trimestre a uma queda de 1,3% na margem e de 2,4% em relação ao mesmo período de 2008. "A indústria continua mostrando a tendência nos últimos meses. A atividade ainda está deprimida."

Para Ariadne Vitoriano, da Tendências Consultoria Integrada, a produção industrial deverá apresentar alta mais significativas apenas no segundo trimestre de 2009. Esta melhora será resultado do efeito da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados, das vendas firmes do varejo, da queda da Selic que começa a surtir efeito na economia e dos ajustes de estoques. O ganho em março ainda é marginal e o desempenho da indústria "permanece fraco", assinala. Segundo Ariadne, mesmo com uma retomada da atividade industrial em meados deste ano ao patamar de desempenho de 2008 está fora de alcance para a indústria. A projeção é de um recuo de 5% da produção industrial de 2009.

Inês Filipa Marques Pereira, da Arkhe Corretora, destaca que com uma base de comparação alta em 2008 e o desaquecimento da economia, as taxas mensais ainda deverão mostrar desempenho negativo, enquanto nos dados com ajuste sazonal a indústria deve mostrar recuperação moderada. Para a economista, o resultado de março mostra uma atividade produtiva operando sem uniformidade, com uma parte mostrando recuperação, caso do setor automotivo e impacto positivo sobre toda a cadeia que o alimenta. "Porém, algumas atividades ainda sofrem com o arrefecimento econômico, principalmente os setores ligados à produção de bens de capital, refletindo um menor nível de investimentos", disse.

Investimentos em queda

Em março, a indústria automobilística apresentou boa recuperação e puxou a alta da produção, com crescimento de 7% no mês, além do crescimento do setor farmacêutico (9%), produtos químicos (3,5%) e instrumentos médico-hospitalares (20,8%). O pior desempenho de março ocorreu em bens de capital, que fechou o mês com recuo de 23%. No primeiro trimestre, o setor acumula queda de 20,8%, após 22 meses trimestres de crescimento. Segundo Ariadne, da Tendências, a indústria de máquinas e equipamentos terá uma recuperação lenta porque depende de outros segmentos para conseguir crescer. "Se o investimento é adiado, compromete a produção futura. Esperamos que isso se reverta nos próximos meses", completa Souza, do Iedi, defendendo incentivos fiscais para que as empresas voltem a investir.

Com o resultado, a LCA projeta uma queda de 11% da formação bruta de capital fixo no primeiro trimestre em relação ao mesmo período do ano passado. No quarto trimestre de 2008, o investimento ainda estava em alta, de 3,8%, na comparação com 2007.

No setor de máquinas e equipamentos, as quedas mais expressivas ocorreram na produção de bens de capital para energia elétrica ( - 51,8%) e construção ( - 68,9%). A retração acentuada na fabricação de bens de capital para o setor elétrico e de construção, é decorrente de um movimento pontual, analisa Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib).

As distribuidoras de energia elétrica não sofreram impactos significativos com a retração da atividade econômico. "Pode ter ocorrido postergação de compras regulares na distribuição", comenta Godoy. Na indústria de construção civil, o recuo é "relativamente normal" neste período. Sem perspectiva de expansão, as construtoras utilizam capacidade ociosa adiam a decisão de investir.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 4)(Ana Carolina Saito, Jaime Soares de Assis e Vanessa Stecanella/INvestnews)