Título: Cenário de recuperação não está assegurado, diz ex-presidente do BC
Autor: Stecanella,Vanessa
Fonte: Gazeta Mercantil, 07/05/2009, Brasil, p. A6

7 de Maio de 2009 - A atividade econômica brasileira sinaliza uma estabilidade sustentada pela política monetária (juros mais baixos), aumento da oferta de crédito e manutenção real da massa salarial, entretanto, ainda é cedo para falar em recuperação. A avaliação é do economista Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (BC). "Cenário de recuperação não está assegurado. Em 2009, o consumo será o carro-chefe para a economia, mas a demanda externa por commodities deve ajudar também. Por outro lado, vamos continuar com um investimento muito baixo", disse.

Loyola projeta um crescimento de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, mas essa expansão vai depender de uma aceleração da economia no segundo semestre. E caso isso ocorra os segmentos voltados para o mercado doméstico têm mais chances de recuperação rápida. "As perspectivas para o PIB deste ano não são boas, pois com a paralisação de investimentos, a economia deve sofrer, entretanto, o varejo pode ser o responsável por amenizar esse efeito. Isso porque a massa salarial se encontra em um bom nível se configurando no único vetor do ano passado mantido em 2009", afirma Loyola.

Para Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro das Comunicações, a crise mundial brecou o crescimento brasileiro, entretanto, não derrubou a economia, que apesar da turbulência vivida a partir do último trimestre de 2008 já começa a dar sinais de estabilidade. "O Brasil passou pela crise com mérito", destaca. Segundo ele, a prova disso é a força do real que chegou a ter valorização de 20% no pior momento desde a sua criação. "O real se mostrou uma moeda forte na pior fase da economia", disse. Na ocasião, o real foi uma das moedas que menos se desvalorizou frente ao dólar, apesar disso, a divisa nacional sofreu uma queda de 42% entre setembro e dezembro.

Mendonça de Barros diz que mantém o otimismo, mas prevê uma contração do PIB entre 1% e 1,5% neste ano. "A queda se deve ao cancelamento de investimentos que vinham impulsionando a atividade. Isso fica evidente observando a redução da produção de máquinas e equipamentos nos primeiros meses do ano", salienta.

Para Loyola, o grande problema do varejo será o crédito. "Os bancos privados precisam voltar a emprestar, entretanto, isso deve ocorrer já a partir deste trimestre. E com os juros mais baixos, os spreads caindo e a criação do cadastro positivo, o varejo pode ser beneficiado."

O ex-presidente do BC afirma que a crise contribuiu para o Brasil levar os juros à patamares "normalizados". "Podemos nos acostumar com juros mais baixos de forma sustentada. Pela primeira vez estamos conseguindo fazer política monetária", comenta. Depois de manter a taxa básica de juros no mesmo nível - 13,75% ao ano - praticamente todo o segundo semestre de 2008, o Comitê de Política Monetária (Copom) iniciou em janeiro um processo de afrouxamento dos juros. Neste ano, foram três cortes consecutivos que levaram a Selic a 10,25% ao ano ¿ o último na semana passada.

Para o economista, a solidez do sistema bancário doméstico garante rápida recuperação do crédito, ao contrário dos países desenvolvidos. "Países emergentes também sofrem com a crise, mas o Brasil administra bem seu sistema. O que vamos ver muito é a inadimplência, mas trata-se de um efeito defasado que a partir do segundo semestre será resolvido. É claro que não vamos retomar os níveis de financiamento anteriores a setembro, mas aos poucos estamos retomando."

Loyola estima que a economia mundial vai sofrer uma retração de 1,3% em 2009. A China mantém crescimento elevado (6,5%), mas menor que nos anos anteriores. "A crise é mesmo pior nos países desenvolvidos". O economista projeta que os Estados Unidos vão apresentar queda de 2,8% no PIB, seguido pelos países da zona do Euro (-4,2%) e Japão (- 6,2%). "O nosso carro parou por falta de gasolina, nos EUA parou porque o carro bateu e se estraçalhou todo."

Para Loyola, o clima de otimismo com relação ao fim do pior período para a economia internacional tem motivos, mas deve-se tomar cuidado pois de fato a crise mundial ainda não terminou. "A boa notícia é verificar que o fundo do poço já foi atingido, o que causa uma percepção de melhora por conta da gestão dos BCs e dos governos no mundo todo", disse.

Para ele, depois do "erro crasso" no caso do Lehman Brothers, as autoridades monetárias tomaram medidas para evitar um efeito cíclico no sistema financeiro internacional. Neste momento a preocupação deve ser o surgimento de bolhas, haja visto os esforços do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), que lançou mão de medidas que não se sustentaram ao longo da crise. "Basta olha para os EUA e ver que os pacotes de estimulo não puderam se sustentar por muito tempo", avalia.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 6)(Vanessa Stecanella InvestNews