Título: Batalha perdida para o vício
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Fonte: Correio Braziliense, 28/03/2011, Opinião, p. 10

O consumo de drogas, como crack e cocaína, há tempos deixou de ser problema isolado no Distrito Federal. Basta um passeio pelo Setor Comercial Sul, pela Rodoviária, pelo Setor Bancário Sul ou no Paranoá, ao fim da tarde, para constatar que usuários e traficantes circulam e negociam sem pudores. As Polícias Federal e Civil, cientes do aumento no número de viciados, tentam agora fechar o cerco ao narcotráfico na cidade. O Correio Braziliense revelou que a pasta-base proveniente da Bolívia já é refinada em laboratórios improvisados no Entorno do DF, um triste indício da importância adquirida pelo mercado local.

A descoberta das rotas desse comércio criminoso ajudará as autoridades a chegar aos vendedores e fechar pontos de distribuição. A pasta-base boliviana entra no país por ônibus, carros, pela circulação de pedestres entre fazendas ou em aviões particulares rumo a Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Centros de refino na região do Entorno funcionam como intermediários que preparam o produto para venda e adicionam outras substâncias à cocaína e ao crack, de forma a aumentar o volume. E a oferta maior responde a uma demanda maior.

Se há duas décadas o Brasil era conhecido internacionalmente como caminho entre os produtores colombianos, bolivianos e peruanos e os consumidores na África e na Europa, nos últimos anos ele desenvolveu clientela importante para psicotrópicos. Não há números críveis sobre viciados em drogas no país, mas a frequência maior de apreensões de carregamentos por parte das polícias e de busca por ajuda em clínicas de tratamento especializadas em desintoxicação indicam que o desafio é, hoje, mais árduo. Ainda neste semestre, devem ser divulgados os primeiros resultados de uma pesquisa promovida pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, com 25 mil pessoas, para mapear o consumo de crack em todo o território nacional.

No DF, teve início este ano uma operação integrada de combate ao crack ¿ cujo consumo excessivo dá, ao viciado, uma expectativa de vida de apenas cinco a 10 anos. A Secretaria de Segurança Pública identificou 64 pontos de tráfico do entorpecente, especialmente no centro de Brasília, no Paranoá e no Recanto das Emas. A situação é mais grave no DF devido à constatação, em análises técnicas, de que os narcóticos vindos de plantações bolivianas estão entre mais nocivos à saúde. Eles são misturados com querosene, gasolina, solução de bateria de veículos e até hormônio para a engorda de gado.

É preciso que organizações não governamentais, associações de parentes de vítimas e, sobretudo, autoridades públicas se empenhem nas ações contra o narcotráfico e no acompanhamento dos dependentes químicos. Maior controle sobre a fronteira, aeroportos e pistas clandestinas ajudaria a estrangular o transporte ilegal. Apenas entre 2000 e 2007, a quantidade de laboratórios de pasta-base de cocaína pulou de 630 para 4,1 mil na Bolívia. Todo o esforço deve ser empreendido no intuito de salvar jovens e adultos que continuam perdendo a luta para o vício.