Título: Copom muda meta de inflação de 2005
Autor: Alessandra Bellotto e Jiane Carvalho
Fonte: Gazeta Mercantil, 24/09/2004, Finanças & Mercados, p. B-1

Na ata divulgada ontem, o BC afirma que passará a buscar 5,1%, em vez dos 4,5% fixados. O Banco Central admitiu, pela primeira vez, que está abandonando o centro da meta de inflação para 2005, fixado em 4,5%. Segundo a ata divulgada ontem, a autoridade monetária passa agora a perseguir uma meta ajustada de 5,1% - a banda de acomodação de até 2,5 pontos para cima ou para baixo está mantida, o que significa que permanece o teto de 7% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Apesar da flexibilização informal - já que apenas o Conselho Monetário Nacional (CMN) pode alterar as metas de inflação -, o Comitê de Política Monetária (Copom) deixou claro que será menos tolerante a choques que possam elevar a inflação do próximo ano.

A meta central de 4,5% já vinha sendo criticada por analistas. Para o sócio da Modal Asset Management, Alexandre Póvoa, o patamar anterior era fictício para um país com tarifas indexadas e baseado no ano-calendário. O ex-diretor do BC e chefe do departamento de economia da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, concorda. "A ata divulgada pelo Copom oficializa algo que o mercado já sabia: a meta anterior de inflação, de 4,5%, era considerada irreal."

Para Gomes, nem mesmo a nova meta definida pelo BC, de 5,1%, pode ser viável. "A própria ata dá destaque relevante ao principal fator de pressão inflacionária, que são os preços administrados. O Copom sabe que não há crescimento da demanda pressionando os preços", argumenta o economista da CNC. A sinalização, segundo ele, vem do próprio comunicado, que reconhece que existe uma "desaceleração espontânea do ritmo de crescimento".

Olhada isoladamente, a mudança da meta, de acordo com Póvoa, é positiva. O problema para ele está no "timing". "Apesar da transparência, a estratégia é arriscada demais", diz. Isso porque, segundo o sócio da Modal, a elevação informal da meta poderá ofuscar a tentativa do BC de imprimir um discurso duro, ao explicitar riscos inflacionários como a oferta não responder no ritmo desejado ao crescimento da demanda; a alta do petróleo; a contaminação dos altos preços no atacado para o varejo; dos núcleos em patamares muito elevados; a capacidade utilizada em nível perigoso; entre outros.

Na avaliação de Póvoa, o BC deveria ter insistido no discurso mais duro e na elevação gradual do juro até pelo menos o final do ano. "Se o tiro sair pela culatra, pode haver uma piora das expectativas de inflação e uma pressão a mais nos preços. E, nesse caso, o BC poderá ser obrigado a promover uma alta mais agressiva no juro", ressalta.

Para Luis Fernando Lopes, economista-chefe do Banco Pátria de Negócios, esta foi uma das atas mais confusas. "Há duas mensagens frontalmente opostas", diz. Na sua opinião, apesar de reconhecer que a meta de 4,5% para 2005 não é plausível e passar a mirar o centro de 5,1%, o BC diminuiu sua margem de erro. "Não foi um ajuste na meta, porque o teto permanece em 7%", explica. Com isso, continua Lopes, os choques negativos tendem a ser melhor ponderados, a fim de evitar uma inflação acima da nova meta. "O risco, então, é de uma alta maior do juro, a partir de 0,5 ponto."

Ele destaca, porém, que isso deverá ficar mais claro a partir dos próximos índices de preços e ainda do relatório de inflação, que deverá ser divulgado pelo BC na próxima semana - na ocasião, será conhecido o IPCA com que a autoridade está trabalhando para 2005. "Se a estimativa do BC vier em linha com os 5,1%, a alta de juro poderá ser gradual. Se ficar próximo do número do Focus (5,8%), a elevação deverá ser mais agressiva, principalmente se levarmos em conta na última reunião três diretores votaram a favor de uma alta de meio ponto", diz Lopes.

Para Gomes, da CNC, apesar de reconhecer que existe uma desaceleração do ritmo de crescimento e que não há ainda uma pressão de demanda, o Copom deverá aumentar os juros nas próximas reuniões na tentativa de impedir uma alta dos preços livres para compensar a elevação nos administrados. A tendência, segundo ele, é de uma elevação superior a 0,25% na próxima reunião. "Para 2005, acredito que o Copom vai aguardar o primeiro trimestre, a fim de ter uma visão melhor do comportamento da economia, para só depois reiniciar uma possível redução da Selic", afirma. Ele destaca ainda que o BC reconhece a dificuldade de medir o ritmo da economia real e, portanto, a flexibilização que deve se acentuar ainda mais em 2005.

Segundo o economista do Banco WestLB, Adauto Lima, o impacto da divulgação do documento nos ativos financeiros, principalmente no segmento de juros futuros, foi positivo. "O mercado entendeu a ata como uma redução do prêmio de risco", afirma. Lima ressalta que, embora a ata jogue alguma incerteza quanto aos próximos movimentos do BC, por outro lado deixa claro que não haverá choque de juros. "Ninguém vai ser pego de surpresa com um aumento abrupto dos juros, como já ocorreu no passado. A percepção de risco no longo prazo melhorou e, por isso, os juros caíram na BM&F."