Título: O PT jogou de salto alto
Autor: Sérgio Prado
Fonte: Gazeta Mercantil, 28/09/2004, Opinião, p. A-3

Em São Paulo, tinha tudo para vencer de ponta a ponta. Bem ao gosto futebolístico de Luiz Inácio Lula da Silva, o PT paulistano se alinha com aquele time que usa salto. De uns 20 centímetros. Parece aquela seleção brasileira de 1950, que caiu diante do Uruguai num jogo tido como imperdível, na final da Copa do Mundo, no Maracanã. Pois a prefeita petista Marta Suplicy, que concorre à reeleição na maior cidade do País, ao iniciar o campeonato, jogando em casa, tinha tudo para fazer uma campanha vitoriosa de ponta a ponta da tabela de classificação.

Além do fator campo, o retrospecto lhe era favorável nos últimos quatro anos. Tem realizações a mostrar, em especial na educação e transportes, que sem sombra de dúvidas estão hoje melhores. Beneficiada pelo posto, Marta tinha ainda mais espaço que os adversários nos meios de comunicação.

Afinal, qualquer ato como a simples vistoria de um túnel em construção lhe proporciona uma cobertura capaz de invadir a casa de milhões de paulistanos, seja por rádio, jornal ou televisão.

Outro ingrediente visto como determinante era a presença de Lula a seu lado, fortalecido pelo bom desempenho da economia e índices crescentes de aprovação do governo. Diante de um cenário como esse, poucos analistas e políticos da esquerda à direita se arriscaram ao prognóstico de uma goleada para o tucano José Serra, derrotado por Celso Pitta em 1996 na corrida pela prefeitura. E outra vez batido de forma impiedosa por Lula, em 2002, quando tentou o terceiro mandato consecutivo para o PSDB no governo central.

Mas eis que, quando a bola rola, a equipe petista começa a tropeçar no próprio esquema de ataque. Vacilante, ensaia uma campanha dita cheia de propostas. Entretanto, com o placar desfavorável antes do fim do primeiro tempo, Marta desceu do salto e cometeu falta digna de cartão vermelho. Numa cópia mal acabada do que fizera seu concorrente em 2002, pregou o medo na torcida.

Ao dizer que, se Serra vencesse, o País entraria numa crise política, ela deu um arranhão no conceito de democracia, que ficará gravado no seu currículo. Mas as jogadas feias e os chutões não ficaram só nesse lance lamentável. Até o técnico do escrete pisou na bola. No momento em que inaugurou uma obra na zona leste, há duas semanas, esqueceu o posto de chefe do Executivo, que ajudou a financiar o empreendimento, para agir como cabo eleitoral de Marta. Desculpou-se por ter ferido o regulamento, mas ficou no ar o mau-cheiro de que não sabe distinguir governo de partido.

Para completar o desastre, a torcida organizada também fez sua patacoada.

Na semana passada, um grupo dizendo-se militante do PT protagonizou um tumulto na zona sul de São Paulo, ao tentar impedir Serra de fazer campanha. Novo pisão na tal democracia, que todos alardeiam ser o alvo máximo. Noves fora, Marta pode até virar o jogo no segundo tempo, pois tem todas as condições para tanto. Mas a truculência de sua campanha merece um sonoro "Já para o chuveiiiiiiiiro!".