Título: O delator no banco dos réus
Autor: Tahan, Lilian; Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 31/03/2011, Cidades, p. 31

TJDFT analisa hoje se benefícios concedidos a Durval Barbosa, por ele ter colaborado com investigações, serão mantidos Os benefícios da delação premiada de Durval Barbosa serão testados hoje no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT). Os desembargadores da 2ª Turma Criminal vão julgar duas denúncias do Ministério Público local contra a principal testemunha da Operação Caixa de Pandora. Nos dois casos, ele foi condenado em primeira instância por contratar, sem licitação, prestadoras de serviço ao Governo do Distrito Federal. Está em jogo a manutenção da redução de penas ou até mesmo o perdão judicial pela colaboração de Durval nas investigações sobre o suposto Mensalão do DEM.

Num dos processos, Durval foi condenado pela 4ª Vara Criminal do DF a quatro anos e sete meses de reclusão por contratar, em junho de 2004, a Patamar Manutenção de Domínios Ltda., empresa de informática investigada na Operação Megabyte, para cuidar do sistema de gestão da Secretaria de Educação. Por causa da delação, a Justiça reduziu a pena para dois anos e 13 dias, em regime semiaberto. Ele também deverá devolver aos cofres públicos o valor do contrato com a Patamar, ou seja, R$ 9.879.600,00, com correção monetária, além de multa correspondente a 4,5% desse montante. Sem contar a atualização, os recursos devidos chegam a R$ 10,3 milhões.

Na outra ação penal na pauta de hoje, Durval também requisitou a redução da punição pela delação no Inquérito nº 650, em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que resultou na derrocada do governo de José Roberto Arruda (sem partido), na cassação do mandato da deputada Eurides Brito (PMDB) e na renúncia dos ex-distritais Júnior Brunelli e Leonardo Prudente (ambos sem partido). A 4ª Vara Criminal do DF condenou o ex-secretário de Relações Institucionais a quatro anos de detenção em regime semiaberto e determinou a devolução de R$ 616.395,00, valor correspondente ao contrato firmado com a empresa Evidência Pesquisa de Opinião e Mercado Ltda., por meio do Instituto Candango de Solidariedade (ICS), extinto em 2007. A prestadora foi contratada para elaborar pesquisas de coleta de dados de informações socioeconômicas para a Codeplan.

Na sessão de hoje, a 2ª Turma Criminal do TJDFT vai apreciar pedido de extinção da punibilidade ou redução de dois terços da pena estabelecida pela 4ª Vara Criminal, transformando-a em um ano e oito meses de detenção. Durval alega que colaborou intensivamente com as investigações do Ministério Público ao entregar os beneficiários dos desvios de recursos de contratos com o GDF. O relator do processo, desembargador Alfeu Machado, na sessão de 3 de março, negou o perdão judicial por considerar muito graves as acusações contra Durval, mas acatou o pedido de redução da pena para um terço do período estabelecido em primeira instância, levando em conta a delação premiada.

O julgamento em relação à condenação pela contratação da Evidência foi suspenso por pedido de vista do desembargador Roberval Belinati, presidente da 2ª Turma Criminal, relator da ação penal que trata da dispensa de licitação no caso da Patamar. Procurado pelo Correio, Belinati não quis se manifestar, sob o argumento de que o processo tramita em segredo de Justiça. Os promotores encarregados do caso, pelo mesmo motivo, também não falam sobre o assunto.

Outros processos Nas duas ações, Durval Barbosa foi condenado em primeira instância sob o mesmo fundamento. Ele é acusado de contrariar o artigo 89 da Lei nº 8.666/93, que trata de Licitações e Contratos, com o agravante de cometer o crime no exercício de função pública. Além dessas ações penais, Durval responde a outros 16 processos, sendo dois por peculato e dois por formação de quadrilha. Ele está com os bens bloqueados, por decisão judicial. O pedido de perdão que Durval fez ao Tribunal de Justiça do DF se baseia na Lei nº9.807/99, que trata de benefícios para criminosos que decidem relatar fatos dos quais participaram e entregar comparsas.

Em um dos processos, houve conflito dentro do próprio MP sobre favorecer ou não Durval com todas as vantagens que a legislação estabelece. Os promotores responsáveis pela denúncia e investigações contra Durval, que tiveram acesso às provas e depoimentos prestados pelo delator, defenderam nas alegações finais o perdão judicial no processo relacionado à empresa Patamar. Mas ao analisar o caso, a procuradora Conceição de Maria Pacheco Brito deu parecer pela manutenção da pena de dois anos e 13 dias, com redução em virtude da colaboração, mas sem extinguir a punibilidade.

Lavagem de dinheiro Deflagrada em 3 de junho de 2008 pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) com o auxílio da Polícia Federal (PF), a Operação Megabyte teve como objetivo apurar suposto esquema de corrupção com contratos públicos no setor de informática do GDF e lavagem de dinheiro. Houve mandados de busca e apreensão em sete endereços, entre eles, a casa de Durval Barbosa. Também foram alvo da PF a loja da então mulher de Durval, no Lago Sul, e a casa de uma ex-mulher dele, além de empresas de informática que prestam serviço ao governo.

O que diz a lei O perdão judicial, com a consequente extinção da punibilidade, está previsto na Lei nº 9.807/99, que estabelece normas para a organização e manutenção de programas especiais a vítimas e testemunhas ameaçadas. É um benefício estabelecido para incentivar denúncias feitas por quem participou ou foi alvo de crimes, uma testemunha que conhece como ninguém os fatos investigados. Caso seja concedido, o réu sai em liberdade do processo, mesmo tendo confessado o delito. A decisão de propiciar tal vantagem a um criminoso, no entanto, depende de alguns critérios.

De acordo com o artigo 13 da Lei nº 9.807/99, o juiz poderá, de ofício, a requerimento do réu ou do Ministério Público, conceder o perdão judicial ao acusado. Para que isso ocorra, o criminoso que entregou comparsas tem de ser primário e precisa ter colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal. A ajuda tem de resultar na identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa; na localização da vítima com a sua integridade física preservada, em caso de sequestros; e na recuperação total ou parcial do produto do crime.

Durval Barbosa aceitou prestar depoimentos na Operação Caixa de Pandora de olho nessas vantagens legais. Ele já era alvo de várias ações. O parágrafo único da referida lei estabelece também que, ao conceder o perdão judicial, o magistrado deve levar em conta a personalidade e a periculosidade do beneficiado, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão dos crimes praticados. (AMC)