Título: Esquenta a disputa por mercado postal
Autor: Gláucia Abreu Andrade
Fonte: Gazeta Mercantil, 27/09/2004, Legislação, p. A-11

Juiz decide que Flash Courier pode retomar entrega de documentos bancários em Belém. A disputa por uma fatia do mercado de serviços postais brasileiro, que movimenta cerca de US$ 4 bilhões, segundo informações de uma fonte ligada a Empresa de Brasileira Correios e Telégrafos (ECT) que não quis se identificar, acaba de ganhar mais um capítulo. Uma decisão de segunda instância do desembargador federal Fagundes de Deus, do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1) determinou que a empresa de encomendas expressas, Flash Courier, pode retomar as entregas de documentos bancários em Belém (PA).

Segundo a advogada Elaine de Oliveira Santos, do escritório GGOS Advogados Associados, no início de agosto foi concedida uma liminar pela Justiça Federal de Belém aos Correios determinando que a Flash Courier e outras empresas do segmento suspendessem suas atividades na região de Belém. "A liminar impunha também que qualquer correspondência contendo documentos bancários fosse enviada por meio dos Correios, seguindo o suposto e pretendido monopólio", informa a advogada Patrícia Gebara Garcia, do mesmo escritório.

Ela argumenta que, na Constituição de 1988, há expressa previsão dos serviços considerados objeto de monopólio da União, mas não estão inclusos na mesma os serviços postais. Para reforçar a tese, as advogadas apresentaram parecer do jurista Celso Bastos, que defende a não existência de monopólio e confere às empresas privadas total liberdade quanto à execução desse serviço.

Para rebater o argumento de que o monopólio dos Correios é uma questão de segurança nacional, essencial e estratégica, Elaine Santos afirma que, se assim fosse, a estatal não poderia se recusar a fazer alguns tipos de entregas. "Há casos, dependendo da localização, em que a empresa se recusa a fazer entregas por motivos de segurança." Ela lembra que há ações contra o monopólio dos Correios em todos os estados. "Apenas esse tribunal já havia julgado outros 31 processos da mesma natureza, sendo que, em 29, havia dado ganho de causa aos Correios", garante Patrícia Garcia. O gerente de marketing da Flash Courier, Guilherme Juliani, comemorou a liminar favorável às empresas de encomendas expressas. "O mercado experimenta uma nova fase de crescimento e começa a ver a possibilidade de `virar o jogo¿ no assunto monopólio", diz Juliani.

Disputa antiga

Em julho do ano passado, a este jornal noticiou a disputa entre a Associação Brasileira das Empresas de Distribuição (Abraed) e a ECT. De acordo com informações da Abraed, que continua questionando o monopólio na Justiça, a fatia de mercado que eles pretendem atingir movimenta cerca de R$ 7 bilhões por ano. O advogado Dauro Löhnhoff Dórea, do Advocacia Dauro Dórea, que patrocina a causa da Abraed, afirma que seu entendimento é que a atual Constituição não agasalhou o monopólio postal, fazendo, via de conseqüência, a revogação tácita de leis anteriores infraconstitucionais, como é o caso da Lei 6.538/78. "A atividade postal é econômica, não constituindo-se um serviço público essencial", assegura. Na sua avaliação cabe ao Estado, apenas manter o serviço postal em todo o País. "A garantia da manutenção de um serviço postal não significa monopólio, que é a exceção. Exemplificando, cabe ao governo manter serviços financeiros com acesso à população, o que não significa que exista monopólio."

Para ele, enquanto ao Estado cabe manter o serviço postal até nos locais mais inóspitos e inviáveis economicamente, a iniciativa privada tem a opção de explorar essas atividade nos locais economicamente viáveis. "Não podemos, na era da globalização, da livre concorrência aniquilar a concorrência em prol de uma só empresa", afirma. "O setor de distribuição emprega atualmente cerca de 1,2 milhão pessoas, sendo 90 mil empregados pelos Correios, é um mercado de fundamental importância para a economia."

"Estamos aguardando decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em uma ação de argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), cujo relator é o ministro Marco Aurélio de Mello", revela. "A Abraed tem cerca de 50 associados que seriam beneficiados por uma decisão favorável. No entanto, o mercado conta com mais de 15 mil empresas no ramo."

Na decisão, o desembargador vislumbrou o efetivo prejuízo da iniciativa privada e conseqüente avalanche de demissão de funcionários que a liminar concedida anteriormente provocaria. Segundo a decisão, "...não há risco de a ECT sofrer prejuízos irrecuperáveis com a continuidade do serviço prestado pela empresa agravante, tanto é que, na inicial da ação originária, nem sequer é alegada a existência de tal pressuposto à concessão da tutela antecipada. De outro lado, se efetivada a decisão judicial, a agravante, pessoa jurídica de direito privado, poderá vir a sofrer danos de elevada monta e até mesmo, como se alega, ter de encerrar suas atividades, com a demissão de empregados, o que caracteriza o denominado `dano inverso¿".

A ECT não quis comentar o assunto, mas informou, por meio da assessoria de imprensa, que vai recorrer da decisão.

kicker: Empresas disputam fatia de mercado que movimenta cerca de R$ 7 bilhões por ano