Título: Seguro ambiental é avanço, se não for obrigatório
Autor: Andrea Vialli
Fonte: Gazeta Mercantil, 29/09/2004, Meio Ambiente, p. A-11
A Unibanco AIG é pioneira no lançamento do produto no Brasil. Dois projetos de lei em trâmite na Câmara sugerem vincular a emissão de licenças ambientais à contratação de seguro obrigatório de responsabilidade civil por dano ambiental. Enquanto o PL 2313/03 propõe a obrigatoriedade da contratação do seguro para atividades potencialmente causadoras de dano ambiental, o PL 937/03 não tem caráter obrigatório, mas estabelece requisitos para concessão de licença ambiental vinculada à contratação do seguro, além de auditorias e acompanhamento das etapas do empreendimento por corpo técnico especializado.
A transformação desses projetos em lei pode fazer mais mal do que bem à proteção do meio ambiente, na avaliação de especialistas. "Ambos os projetos são temerários. O PL 937/03 coloca o seguro como possível exigência mas não fornece detalhes de como isso será feito. Na prática, poderá funcionar como mais um entrave burocrático para o licenciamento ambiental", alerta a advogada especializada em seguros Vera Carvalho Pinto, do escritório Stroeter, Royster e Ohno Advogados.
No caso do PL 2313/03, a obrigatoriedade do seguro impõe à iniciativa privada obrigações que competem aos órgãos públicos, como a realização de auditorias para verificação de passivos. "Se houver obrigatoriedade, as seguradoras não vão ter o produto no mercado. Isso pode tornar a emissão de licenças ambientais mais lenta", explica Maria Alice Doria, advogada especializada em meio ambiente, também da Stroeter.
Na prática, o mercado brasileiro de seguros ainda não está maduro o suficiente para suportar o aumento da demanda pelo produto, que a obrigatoriedade traria. E o seguro ambiental ainda é novo por aqui - as empresas interessadas freqüentemente contratavam apólices de responsabilidade civil com cobertura para dano ambiental, oferecida pela maior parte das seguradoras que atuam no País. "A rigidez da legislação ambiental brasileira e os altos valores que serão envolvidos na contratação de apólices e pagamento de prêmios indicam um grande nicho para o mercado segurador", explica Maria Alice Doria.
Produto inédito
A aposta nesse nicho já foi feita pela seguradora Unibanco AIG, que lançou no ínicio de setembro o primeiro seguro brasileiro para danos causados por poluição ambiental. Além da cobertura por dano súbito - em caso de acidentes - a inovação é que este seguro cobre também a poluição gradual, a exemplo do que acontece em países onde o mercado para seguros ambientais está mais amadurecido, como é o caso dos Estados Unidos.
A cobertura da apólice será de até US$ 35 milhões e cobrirá custos com limpeza, contenção dos contaminantes, gastos judiciais e lucros cessantes dos segurados. "Mesmo quando houver danos preexistentes, ou passivos ambientais, também haverá cobertura", garante Luis Nagamine, superintendente de produto da Unibanco AIG.
"Não havia no mercado brasileiro um produto acabado com enfoque ambiental. Em todas as apólices oferecidas, havia exclusão parcial da cobertura por crime ambiental, o que é uma lacuna. Esse seguro é mais do que necessário", acrescenta Nagamine, lembrando que a Lei dos Crimes Ambientais (9605/98) estipulou multas de R$ 50 a R$ 50 milhões, de acordo com a gravidade do dano.
Ainda não existem informações concretas sobre o quanto o mercado de seguro ambiental deverá movimentar no Brasil. Nos EUA, são US$ 2 bilhões anuais e no restante do mundo, US$ 300 milhões. Mas a demanda pelo produto recém-lançado pela Unibanco AIG já dá uma prévia da potencialidade desse nicho: desde o início do mês, já foram 400 consultas de empresas interessadas em contratar apólices, e algumas já estão em estágio mais avançado de negociação. De acordo com Nagamine, a indústria é o grande cliente potencial desse seguro, com destaque para os setores de química e petroquímica, papel e celulose, siderurgia e metalurgia, mineração e geração de energia, entre outros.
No cálculo da apólice, são analisados fatores como a importância segurada; aspectos internos da empresa (potencial poluidor, se há sistema de gestão ambiental, relações com a comunidade) e exposição a terceiros, ou seja, como a poluição súbita ou gradual pode afetar a população no entorno da empresa. Assim, acaba "ganhando pontos" o cliente que tiver um programa sólido de gestão ambiental e investimentos contínuos na área. "Ainda é cedo para se falar no custo das apólices de seguro ambiental, mas as cotações preliminares apontam para um valor surpreendentemente abaixo do esperávamos", diz Nagamine, da Unibanco AIG.
O risco inerente ao lançamento de um produto inédito no Brasil foi muito bem calculado pela seguradora, com base na experiência da American International Group (AIG) em seguro ambiental, visto que detém 70% de market share no mundo todo, o que representa um volume de US$ 200 milhões em prêmios. Só nos EUA a empresa responde por 60% do mercado, com um volume deUS$ 1,3 bilhões de prêmio emitido.
Mercado criativo
Para a advogada Vera Carvalho Pinto, é necessário que o caminho seja exatamente esse: da iniciativa privada formatar o produto, independente de pressões legais. "Para que o seguro ambiental tenha êxito no Brasil, é necessário que o mercado caminhe com calma, incentivando a criatividade das seguradoras", diz. Sua opinião é compartilhada por Walter Polido, diretor técnico e jurídico da Müchener do Brasil, subsidiária do Munich Re Group. "O seguro ambiental não pode constituir uma licença para poluir, e a sua obrigatoriedade no Brasil praticamente criaria essa situação insustentável", afirma.
Para Luis Nagamine, o seguro ambiental pode ser uma ferramenta para que as empresas possam captar recursos junto às instituições bancárias que tenham como diretriz a concessão de crédito a partir de análise de risco socioambiental. "Os três maiores bancos privados brasileiros são signatários do Princípio do Equador, o que dá uma pista de como o seguro pode ajudar", completa.
kicker: Cobertura da apólice atingirá US$ 35 milhões e vai abranger a contaminação gradual