Título: Reformas de Putin redesenham mapa político
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Fonte: Gazeta Mercantil, 29/09/2004, Internacional, p. A-12

O Kremlin ameaçou ontem derrubar os líderes regionais da Rússia que não concordarem com os planos radicais do presidente Vladimir Putin de centralizar o poder no país. Ao mesmo tempo, Putin enviou ao Parlamento um projeto de lei que lhe dá o direito de nomear os governadores locais, numa série de alterações que pode redesenhar o mapa po-lítico da Rússia e que despertou preocupação na comunidade internacional.

Apesar dos protestos da oposição e do desconforto de alguns de seus próprios seguidores, tudo indica que o partido Rússia Unida caminha para reforçar seu controle sobre as assembléias regionais.

O cada vez mais autoritário Putin anunciou pretender nomear os líderes de 89 regiões - que hoje são eleitos e desfrutam de grande poder longe do Kremlin -, numa medida que faz parte da tentativa de reforçar o Estado para combater o terrorismo. A decisão foi tomada depois do ataque, neste mês, a uma escola do sul da Rússia, em Beslan, por rebeldes separatistas chechenos. No seqüestro, morreram 320 reféns. Metade era criança.

Os críticos de Putin dizem que as medidas são um meio de acumular mais poder, aproveitando-se da tragédia de Beslan. Pesquisas mostram que os russos as desaprovam. Ontem, um assessor do Kremlin advertiu os líderes locais de que Putin pode usar sua autoridade para dissolver as assembléias que se recusarem a aprovar sua indicação para governador.

"O presidente tem direito a duas tentativas (de impor um candidato). Se esse candidato não for confirmado depois de duas tentativas, o presidente tem o direito de nomear um líder", disse o assessor, Vladislav Surkov, a jornalistas. "A Assembléia Legislativa pode ser dissolvida, ou talvez não".

Segundo Surkov, vice-chefe da administração presidencial, a lei deve estar em vigor em 2009, mais ou menos no fim do segundo mandato de Putin. Uma importante autoridade do Kremlin, que não quis se identificar, concorda com o argumento de Putin de que as mudanças são necessárias. "Estou pessoalmente convencido de que os terroristas estão aí para destruir o Estado russo. Sei que alguns encaram isso como um início de paranóia", disse a fonte.

Mas ele reconheceu que a medida traz consigo um "enorme risco" para a democracia. O projeto de Putin deve ser aprovado com facilidade na Duma, a câmara baixa do Parlamento, já que o partido Rússia Unida tem mais de dois terços das 450 cadeiras.