Título: Conselho decide o futuro da TJLP
Autor: Adriana Cotias
Fonte: Gazeta Mercantil, 29/09/2004, Finanças & Mercados, p. B-2

Fixada em 9,75% ao ano, uma redução, pequena que seja, servirá de estímulo a novos projetos. O Conselho Monetário Nacional (CMN) decide, hoje, que rumo dará à Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) que vigorará no último trimestre do ano. Ela é o custo de referência para os financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) - decisivo para a definição de investimentos de médio e longo prazo. Apesar do aumento de 0,25 ponto percentual imposto à Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central neste mês, a TJLP, fixada em 9,75% ao ano desde abril, não segue, necessariamente, as mesmas alterações da taxa primária da economia, atualmente em 16,25% ao ano.

O BNDES quer reduzir a TJLP para fomentar investimentos e seu presidente Carlos Lessa tem dito que gostaria de vê-la em 8% ao ano. No setor privado, também há quem pense que há espaço para baixá-la mais um pouco ou, no mínimo, mantê-la como está. Mas se o governo entender que o aperto monetário deve se estender aos projetos de investimento, um aumento pode retardar intenções de ampliação de capacidade instalada, já que os desembolsos do BNDES até aqui se concentram nos setores que já vinham ancorando a expansão da atividade: exportações, agronegócios, siderurgia, mineração, papel e celulose.

"O crédito só vai crescer se houver um novo ciclo de demanda para investimentos", diz o presidente recém-empossado da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), João Ayres Rabêllo Filho. "As linhas do BNDES têm sido utilizadas para pequenas reposições. Não se vê uso para instalação de plantas novas e se os investimentos não forem retomados os gargalos começarão a aparecer e não sei que fôlego terá esta economia."

De janeiro a agosto, os desembolsos do BNDES somaram R$ 24,3 bilhões, um acréscimo de 43% em relação do mesmo período do ano passado. Segundo o Banco Central (BC), as aplicações no segmento de comércio e serviços cresceram 47,2%, a R$ 10,8 bilhões. Na indústria, houve um incremento de 30,1%, para R$ 9,1 bilhões, evidenciando o dinamismo das exportações (o que inclui setores automotivo e aeronáutico). Os recursos destinados à atividade agropecuária aumentaram 65,7%, atingindo R$ 4,3 bilhões.

Nos bancos mais ativos em repasses do BNDES esta realidade se replica e mesmo entre aqueles que se abstêm de dar palpites sobre o que acontecerá com a TJLP, a percepção é de que a demanda pelos recursos carimbados para investimento continuará crescente. O Bradesco, por exemplo, já repassou neste ano R$ 1,9 bilhão, uma evolução de 45% sobre o período entre janeiro e agosto do ano passado. Em consulta no BNDES e em fase de enquadramento na rede do conglomerado há mais R$ 2 bilhões, segundo conta o diretor executivo da instituição, Paulo Isola.

"O mercado de capitais brasileiro começa a despontar, mas ainda é pouco ativo e as linhas do BNDES são, praticamente, as únicas formas de financiamento de longo prazo disponíveis no País", diz. "No passado, ainda havia a oportunidade de captação longa no exterior, mas com a tributação atual essa não é a melhor opção para as empresas." As linhas do BNDES têm prazos que variam entre cinco e oito anos, enquanto a maturidade média dos empréstimos bancários livremente direcionados às pessoas jurídicas situa-se em 197 dias corridos.

O Banco do Brasil (BB) antecipou-se ao aquecimento da atividade e desde o segundo semestre de 2003 vem se preparando para atender ao aumento da procura por desembolsos oficiais: reforçou a equipe de vendas, treinou gerentes e até criou uma linha pré-aprovada para os melhores nomes da carteira de BNDES. "A decisão de investimento não acontece de uma hora para outra e foi lá atrás que fizemos a leitura de que o cenário de retomada elevaria a demanda por crédito de longo prazo", diz o vice-presidente Adezio Lima.

Até agosto, o BB repassou R$ 1,89 bilhão, mais do que o dobro do que aplicou em todo ano passado. No Banco Votorantim, o volume de desembolsos chegou a R$ 340 milhões e há mais R$ 700 milhões na linha de produção, segundo conta o gerente de Corporate, José Roberto Curan. Para o executivo, técnicamente, a TJLP representa um custo justo para fomentar novos projetos. Mas Curan acredita que há espaço para uma pequena redução. "Será um componente de estímulo aos novos investimentos."

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Newton de Mello, o CMN deve manter a TJLP no atual patamar. "Só no longo prazo, a elevação da Selic se refletiria na taxa, já que há mecanismos amortecedores e quando a Selic caiu, no ano passado, não houve um decréscimo na mesma proporção."

De acordo com o diretor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida, na ponta, os empréstimos do BNDES chegam entre 14% e 18%. Isola, do Bradesco, conta que o "spread" do banco de fomento varia de 1% a 4,5%, enquanto os juros das instituições intermediadoras - o "del credere" - situam-se entre 1% e 4%. Mello, da Abimaq, reconhece que, mesmo na pior das hipóteses, quando o custo final esbarra nos 20% trata-se de uma taxa atrativa. "Não há linha bancária com este custo", diz. Na média, os juros das operações destinadas às empresas fica em 28,8%, segundo o BC.

Comparando-se ao mercado internacional, a TJLP representa, entretanto, uma distorção, já que é uma linha de longo prazo com custo inferior às opções de capital de giro, teoricamente com risco menores. "Falta muito para ter um sistema de crédito e financiamento no Brasil", diz Almeida, do Iedi. "Acabar com o BNDES seria impensável, não vejo como suprir esta lacuna, a menos que o Brasil tenha dez anos de crescimento muito grande no mercado de crédito e de capitais."