Título: O peso das contas de eletricidade
Autor: Luiz Alberto Ortiz
Fonte: Gazeta Mercantil, 30/09/2004, Opinião, p. A-3
A energia elétrica consumida pelas ligações clandestinas é paga por você. Quem nunca ouviu ou nunca disse que a conta de luz é cara? A sentença é verídica e a responsabilidade é atribuída por nós às distribuidoras de energia elétrica. Mas seriam elas as únicas vilãs?
Nossa fatura omite um importante fator oneroso: o índice de perdas globais da concessionária. Desconhecido pelos consumidores, o índice é composto pelas perdas técnica e comercial. As perdas técnicas estão ligadas a características físicas da rede de distribuição, como dissipação de energia no cabo ou no transformador. O problema é inevitável e reduzido com manutenção e expansão ou adequação técnica ao crescimento da carga e casas atendidas. Hoje, esses níveis variam entre 5% e 9%.
Mas uma significativa porcentagem do que pagamos advém de inadimplência e fraudes na medição, as perdas comerciais. Ou seja, a energia consumida pelas ligações clandestinas é paga por você.
Na capital paulista, por exemplo, a cada ano cerca de dois milhões de megawatts/hora de energia são perdidos, o suficiente para abastecer a cidade por 15 dias. A distribuidora responsável pela região e mais 23 cidades de São Paulo registrou um prejuízo de R$ 596 milhões em 2003.
A legislação que regulamenta o setor prevê a punição dos fraudadores, mas, na prática, liminares na Justiça atrasam o processo e postergam o retorno financeiro pelo uso indevido de energia. E nossa conta sobe mais.
Mas a situação pode ser revertida, e a principal aliada nessa guerra é a tecnologia, capaz de dificultar a vida de contraventores e identificar onde a fraude ocorre. Algumas concessionárias transferiram a medição do consumo das casas para a rua. O medidor é colocado dentro de uma caixa presa ao poste e, por meio de uma lente de aumento, o leiturista e o consumidor conferem o gasto de energia.
A mudança é vantajosa para todos. A concessionária evita o uso ilegal e a alteração dos aparelhos de medição, pois se torna necessária uma exposição do transgressor para subir no poste e violar o lacre dos relógios. O consumidor fica mais seguro, não precisando abrir as portas de sua casa para alguém que se identifica como leiturista. Incêndios em áreas com ligações clandestinas, problema comum em grandes centros urbanos, causados por sobrecarga de energia são eliminados. Acidentes com pipas e crianças nos fios de eletricidade diminuem, além da limpeza na rede de distribuição e a queda da poluição visual.
A cidade de Belém (PA) reverteu sua situação de crise. Em 1998, a Centrais Elétricas do Pará (Celpa) totalizava mais de 30% em perdas comerciais. Após a transferência dos relógios de luz para os postes, o índice caiu a cerca de 20%.
As consultorias especializadas em soluções tecnológicas são outra peça-chave para redução de perdas comerciais. Algumas delas, oriundas do próprio setor elétrico, são ainda mais eficientes na elaboração de meios para amenizar os danos causados por uso indevido de energia. Especialistas na aplicação apropriada de recursos tecnológicos diagnosticam a doença e prescrevem a receita médica, uma eficiente forma de enfraquecer a epidemia que assola o setor.
kicker: Cerca de dois milhões de megawatts/hora são perdidos por ano só em São Paulo