Título: Final voto a voto, de "machucar o coração"
Autor: Wallace Nunes
Fonte: Gazeta Mercantil, 04/10/2004, Política, p. A-9
A disputa no Rio de Janeiro foi apertadíssima, mas os cariocas optaram por dar a Cesar Maia (PFL) mais quatro anos no comando da prefeitura da cidade. Como o próprio pefelista previu no início da manhã, foi um final "de machucar o coração, voto a voto". Somente quando foram abertos os últimos votos é que os eleitores tiveram a certeza de que o senador Marcelo Crivella (PL), em segundo lugar na disputa, não tinha mais chances de levar a briga para um novo round.
Além de cheia de expectativa, a eleição no segundo maior colégio eleitoral do Brasil teve intenso boca-de-urna em dia com "cara" de inverno - frio, chuvoso e cinzento. Mas não houve incidentes graves, embora 35 pessoas tenham sido detidas e duas toneladas de material de campanha apreendidas no município. Segundo o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ), 220 urnas tiveram problemas. A ausência do sol fez com que as pessoas deixassem para votar à tarde, causando engarrafamentos em vários pontos da cidade.
A divulgação de pesquisas de opinião apontando para a possibilidade de segundo turno animou cabos eleitorais e militantes do PL, que fizeram muito barulho. Ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, Crivella reuniu pela manhã sete mil fiéis em uma de suas igrejas, onde um bispo falava de forma cifrada para votarem no candidato. Mas a tática não funcionou, nem na reta final.
Cesar Maia liderou a disputa de ponta a ponta e sai da briga fortalecido na opinião de analistas políticos. Mais do que um segundo mandato, o pefelista será uma importante peça na definição de um novo mapa de poder para o Estado e na quebra da hegemonia do ex-governador Anthony Garotinho, principalmente com a derrota do PMDB em várias cidades importantes do interior. As duas lideranças têm pretensões de concorrer à Presidência da República em 2006 e dependem dos resultados da eleição para se fortalecerem.
Segundo o cientista político e presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS), Geraldo Tadeu, com a vitória de César Maia, a tendência é o recrudescimento da polarização entre o peemedebista e o que chama de "forças anti-garotinistas"'', formadas por partidos como PFL, PSDB, PT, PDT e PSB. Este grupo, cujo principal líder é o prefeito, fez alianças ideologicamente impensáveis até pouco tempo com o objetivo de derrubar a máquina política do ex-governador e deve vencer em municípios como Niterói, São Gonçalo, Duque de Caxias e Nova Iguaçu. Cidades que, juntas, respondem por 18% dos eleitores do Rio.
"Somados ao percentual da capital, em torno de 40%, são quase 60% dos eleitores do Estado concentrados em cinco municípios", lembra Tadeu, acrescentando que essa força deverá formar uma barreira de contenção contra o crescimento de Garotinho.
Mas a briga não será fácil. Na outra ponta da gangorra, o ex-governador sai fortalecido em municípios pequenos e médios do interior, principalmente nas regiões Serrana, Sul, Norte e Noroeste, como destaca Geraldo Tadeu. Localidades em que, segundo ele, Garotinho tem o controle da situação, o que não acontece com Cesar Maia nos municípios em que poderá derrotar o PMDB.
Para David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), Maia sai bem fortalecido desta briga e tende a se tornar uma das principais estrelas do PFL. Principalmente com a possível perda de candidatos apoiados por caciques como Jorge Bornhausen, Antônio Carlos Magalhães e Marco Maciel. "Se Cesar Maia conseguir consolidar esta liderança, é o candidato natural do PFL à Presidência em 2006", diz Fleischer.
Sem descartar nada
Embora tenha dito que não faz parte de seu projeto político concorrer à presidência, Cesar Maia declarou na sexta-feira que "o político não pode descartar rigorosamente nada". Ele afirmou que se sentia "''90% preparado para ser presidente"'', e que o percentual só não era 100% porque não falava inglês. O pefelista foi prefeito pela primeira vez de 1993 a 1996, quando conseguiu eleger o sucessor, Luiz Paulo Conde, por mais quatro anos. Em 2000, voltou à prefeitura, derrotando Conde.