Título: Quando o anúncio pode "desvender" um produto
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Fonte: Gazeta Mercantil, 04/10/2004, Panorama Setorial, p. A-8

David Ogilvy, que antes de se tornar uma das mais famosas figuras da História da publicidade foi vendedor de fogões, cozinheiro de um hotel de Paris e trabalhador em uma fazenda de tabaco, fazia anúncios que eram uma delicada mistura de pesquisa e criatividade. Dizia que, em lugar de simplesmente vender um produto, a publicidade deveria criar "uma imagem da marca", uma "personalidade" do produto.

Um produto com uma marca de prestígio pode ser vendido por um preço superior ao de um produto similar, mas com marca pouco conhecida. Para Ogilvy, o uso da pesquisa era comparável aos postes da luz, que não devem servir, como fazem os bêbados, para apoiar-se neles, mas para iluminar o caminho. Também advertia que a publicidade tem seus perigos.

"Conheço uma cervejaria - escreveu em certa ocasião - que vende mais cerveja às pessoas que nunca viram seus anúncios do que às pessoas que os vêem uma vez por semana. A má publicidade pode 'desvender' um produto", contava o guru.

Tinha também noção das dificuldades de fazer um anúncio para produtos de consumo de passa indiferenciados. "Não há nenhuma diferença significativa entre as várias marcas de uísque, ou de cigarros, ou de cerveja. São todas a mesma coisa. Assim como o são as massas para bolo e os detergentes e as margarinas". No entanto, conseguiu fazer anúncios memoráveis para diferentes marcas de produtos de consumo.

Esses potenciais efeitos negativos da publicidade ruim são bem concretos. Neste ano, o Deutsche Bank divulgou um detalhado estudo a respeito da publicidade na televisão: Commercial Noise: Why TV Advertising Doesn't Work for Mature Brands (Por que a Publicidade na TV não Funciona para as Marcas Maduras?).

Foi realizado por Andrew Sore, um analista que, segundo o Financial Times, passou dois anos nos Estados Unidos monitorando as vendas de 23 marcas de produtos embalados. Ele constatou que, embora a publicidade da TV aumentasse as vendas nos 6 a 12 meses seguintes, na maioria dos casos produziu um retorno negativo sobre o investimento: o custo da publicidade foi superior ao lucro bruto gerado pelas vendas adicionais motivadas por ela.

Observou o FT que a situação mudou desde os anos dourados do marketing, nas décadas de 50 a 70, quando a TV permitia aos fabricantes de produtos de consumo apresentar suas mercadorias a um grande número de consumidores. Hoje, a fragmentação da mídia diminuiu o poder da TV, e muitos dos produtos embalados estão próximos do ponto de saturação do mercado.

No Brasil, o cenário é algo diferente do apresentado pelo estudo do Deutsche Bank. A internet e a TV a cabo já começaram a fragmentar as audiências. Mas há ainda uma enorme concentração de espectadores nas redes de televisão aberta, na casa dos 60% das verbas da propaganda. A fragmentação do mercado televisivo no Brasil, no entanto, pode ser uma questão de médio prazo - e a TV poderá começar a dar um retorno negativo para alguns anunciantes, devolvendo parte do que tirou nas últimas décadas para os meios impressos.

Outro estudo lançado em 2001, The Hidden Power of Advertising (O Poder Oculto da Publicidade), de Robert Heath, conclui que as pessoas, na hora de comprar, consideram que os produtos das marcas de maior prestígio têm um desempenho semelhante. Portanto, prestam pouca atenção à publicidade. Mas isto não significa que a publicidade não funcione. Segundo Heath, a publicidade funciona a longo prazo e influência as pessoas muito tempo depois de terem visto os anúncios - ainda que elas não saibam disso.