Título: O negócio bilionário de persuadir
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 04/10/2004, Panorama Setorial, p. A-8

O setor movimenta em escala global mais de US$ 342 bilhões ao ano. Você pode escolher, entre as diversas definições de "publicidade", a que mais lhe agradar. Publicidade, escreveu o historiador inglês H. G. Wells, é a arte de ensinar as pessoas a querer algo. Uma versão mais cínica diz que o objetivo da publicidade é convencer as pessoas a comprar o que não precisam. Para o lendário Bill Bernbach, que foi talvez o mais respeitado guru da Madison Avenue - o centro psicológico da propaganda norte-americana -, a publicidade era "fundamentalmente persuasão", e ele assegurava que "a persuasão é uma arte".

Na opinião de um presidente dos Estados Unidos, Calvin Coolidge, a publicidade "é a mais profunda influência para adaptar e mudar os hábitos e modos de vida, afetando o que comemos, o que vestimos e também o funcionamento e o papel de uma nação". Mas a influência da publicidade foi exagerada tanto pelos seus defensores como pelos seus críticos: dificilmente um consumidor comprará repetidamente um mau produto, ou será levado a fazer o que não quer, seja qual for a capacidade de persuasão de um anúncio.

Há certo consenso em considerar que o objetivo da publicidade é predispor favoravelmente o consumidor ou a opinião pública a respeito de produtos, instituições, idéias ou iniciativas. Em termos práticos, o anunciante pode recorrer à publicidade para aumentar o valor de sua marca e assim ter um maior controle sobre os preços de seus produtos. Nos mercados consolidados, a publicidade pretende, também, reforçar a fidelidade dos consumidores.

Um negócio de US$ 342 bilhões

A publicidade é um negócio de extraordinárias dimensões. Este ano, os gastos mundiais em publicidade deverão chegar a US$ 342,6 bilhões, dos quais, quase a metade nos EUA, na estimativa da ZenithOptimedia, uma empresa que faz a intermediação da compra de tempo e espaço nos veículos de comunicação. Os grandes grupos globais de marketing e publicidade, em dimensões semelhantes às de alguns de seus maiores clientes, movimentam, cada um deles, dezenas de bilhões de dólares, e têm uma receita líquida superior aos US$ 7 bilhões. As grandes corporações acreditam que a publicidade pode alavancar seus negócios e investem nela uma parte considerável dos seus orçamentos. O maior anunciante mundial, a multinacional Procter & Gamble, gasta em torno de US$ 5 bilhões por ano para promover seus produtos.

No entanto, como não é possível avaliar com precisão o resultado dos anúncios, as empresas questionam constantemente sua eficácia. É bem conhecida a velha frase de que metade da publicidade é um desperdício; o problema é saber qual é essa metade. O professor John Philip Jones, da Universidade de Siracusa, nos EUA, afirmou, segundo The Economist, que "muitos clientes americanos consideram a publicidade um mal necessário, cujos resultados não são mensuráveis".

O grande desafio da publicidade

A tendência observada entre os anunciantes de gastar cada vez mais dinheiro em mala-direta, promoção do produto no ponto-de-venda e serviços de marketing apóia-se, entre outros fatores, em que os resultados dessas atividades são mais fáceis de mensurar. Por esse motivo, o grande desafio da publicidade tem sido o de desenvolver ferramentas de medição e avaliação, que mostrem os resultados das campanhas publicitárias.

É provável que o futuro da publicidade dependa, em grande parte, dessas avaliações e que cada vez mais fique intimamente integrada com as operações de marketing das empresas, em lugar de ser olhada como uma atividade praticamente independente, com a única função de desenvolver e intermediar anúncios.

Está ficando para trás a época em que era mais fácil aprovar uma campanha publicitária quando o pessoal de marketing do cliente não estava presente. O mais provável é que, hoje, o pessoal de marketing não apenas esteja dentro da sala como coordene a reunião.

Da publicidade ao marketing

Uma vez que as agências de publicidade não podiam ir contra a corrente, preferiram remar a favor dela. Em lugar de ir contra os gastos de seus clientes em serviços de marketing, passaram, elas mesmas, a prestar esses serviços. A partir da década de 80, observaram-se dois movimentos no mercado mundial de publicidade. O primeiro é a ampliação dos serviços oferecidos pelas agências, além da criação e da intermediação dos anúncios, como uma comunicação integrada. O segundo é a segmentação do atendimento, por meio de empresas especializadas.

Alguns exemplos. Dentro do Grey Global Group, holding norte-americana que foi recentemente adquirida pela WPP, menos da metade de sua receita é proveniente do negócio publicitário. Para a WPP, desde 1998 a área de publicidade representa menos de 50% do volume total das operações.

O marketing em crescimento acelerado

O valor dos serviços especializados prestados na área de comunicação ultrapassa amplamente os gastos com publicidade. Nos maiores mercados mundiais, o conjunto desses serviços (promoções, relações públicas, marketing direto e de relacionamento, "call centers", design, etc) representa aproximadamente dois terços do total de gastos com marketing e comunicação; a publicidade, o terço restante, de acordo com os levantamentos da Veronis Suhler, um banco norte-americano de investimentos especializado em fusões, aquisições e consultoria de serviços de comunicação. O valor total supera amplamente US$ 1 trilhão por ano.

No Brasil, essa tendência também pode ser observada facilmente. Desde meados dos anos 90, os anunciantes de diversos setores têm aumentado mais rapidamente suas verbas de comunicação e marketing do que as de publicidade.

Pesquisa da InterScience deixa clara a fragmentação dos investimentos em marketing. Em 2002, os cem maiores anunciantes do País gastavam com publicidade 53% de suas verbas; no ano seguinte, essa proporção já tinha caído para 48%. É talvez uma prova de que a arte da persuasão não se resume em fazer anúncios.