Título: Serra costura alianças e diz que está à esquerda do PT
Autor: Otto Filgueiras
Fonte: Gazeta Mercantil, 04/10/2004, Política, p. A-11

Tucanos querem apoio dos eleitores de todos os outros partidos. De olho também no segundo turno, o candidato José Serra acordou cedo ontem e às 9h50 chegou para votar no Colégio Santa Cruz, localizado em Pinheiros, bairro de classe média da zona sul da cidade. Ele carregava no colo o neto Antônio, de dois anos, e estava acompanhado dos filhos, do governador Geraldo Alckmin, do deputado Walter Feldman (PSDB) e outros correligionários. Cercado por um batalhão de fotógrafos e repórteres, Serra foi aplaudido, cumprimentou eleitores, votou e fez um V da vitória.

Na praça Padre Charbonneau, José Serra disse à imprensa que estava tranqüilo, porque "é povo que está decidindo, é o aspecto melhor da democracia e o voto de cada pessoa é um voto igual a de qualquer outra". Ele afirmou que "sem dúvida nenhuma" está à esquerda de Marta Suplicy em relação à administração municipal e também à esquerda da política econômica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Afinal, a política econômica do governo Lula é a mesma dos tempos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com juros altos e superávit primário alto, que José Serra criticava durante os oitos anos do PSDB no governo da República.

Além disso, Serra é um filho de imigrantes italianos, que nasceu em 1945 no então bairro operário da Mooca, na capital paulista, foi militante de esquerda em 1963, quando se elegeu presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) e um dos fundadores da organização de esquerda Ação Popular (AP). Depois do golpe militar em 1964, ele terminou indo para o Chile, onde continuou sua militância até o golpe que derrubou o presidente Salvador Allende, em 1973.

O deputado Walter Feldman, que também foi militante de esquerda no passado, disse que "o PT no governo federal não fez ruptura, acomodou-se ao sistema, mantém uma política econômica de juros altos e ortodoxa". Em relação aos apoios que José Serra poderá ter no segundo turno, Feldman disse que "nosso compromisso é com os eleitores, mas vamos procurar as lideranças partidárias".

A busca de votos e de alianças continuou no Jockey Clube, onde o governador Geraldo Alckmin votou na 49 seção da 346 zona eleitoral. Na saída o governador disse que participará da campanha de José Serra no segundo turno, "na hora do almoço, nos intervalos e com grande alegria". E quando perguntado se será candidato a presidente da República nas eleições de 2006, principalmente se José Serra for eleito prefeito de São Paulo, Geraldo Alckmin disse que não há relação entre o pleito de 2004 e o de 2006. Disse que a eleição municipal agora "é importante por si mesma e queremos que o PSDB se fortaleça no Brasil".

Mas, nas eleições municipais de São Paulo, o PSDB de José Serra e Geraldo Alckmin querem se fortalecer no eleitorado mais pobre da zona leste, o maior colégio eleitoral da cidade, onde votam 2,5 milhões de eleitores. Foi lá que a comitiva tucana desembarcou de helicóptero e se dirigiu até a Escola Salim Farah Maluf, na rua Jardim Tamoio, bairro de Guaianazes. Centenas e centenas de militantes do PT, do PSDB e de outros partidos estavam na porta da escola fazendo boca de urna e Terezinha Romão, de 50 anos, chefe de um grupo numeroso, recebeu a comitiva tucana, dando beijos em Serra e em Alckmin. Medindo 1,60m de altura e com o sangue negro visível nos cabelos encaracolados, a mulher é auxiliar de enfermagem, trabalha num hospital no bairro de Itaquera há 30 anos, onde recebe um salário mensal de R$ 736.

De outro lado, chefiando um grupo de militantes do PT, estava Paula Ferreira, de 23 anos. Ela aproximou-se da comitiva gritando para José Serra votar em Marta. O candidato deixou a moça chegar perto dele e conversaram amigavelmente. Paula Ferreira, que ganha a vida trabalhando de babá por R$ 300 mensais, e o grupo de militantes petistas que comandava, são parecidos na pobreza e na vestimenta modesta com o grupo de militantes tucanos.

Um tipo de gente diferente das pessoas abastadas que votaram no Colégio Santa Cruz e na Universidade Mackenzie, para onde a comitiva de José Serra seguiu de helicóptero e encerrou a caminhada.