Título: Falta de ousadia no apoio ao investimento
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Fonte: Gazeta Mercantil, 05/10/2004, Opinião, p. A-3
Ao editar na quinta-feira passada a Medida Provisória 219, instituindo o programa "Invista Já", o governo deu por concluído o seu programa de redução de tributos para estimular o crescimento. Encerramento prematuro, em nossa avaliação, pois ninguém, à exceção do governo, está a esperar tanto de tão pouco.
Trata-se de um programa muito tímido, na avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), ante a magnitude do problema, que se expressa na baixa propensão a investir, como resultado da combinação perversa entre o peso excessivo da carga tributária, à conta do Ministério da Fazenda e taxas de juros elevadíssimas, à conta do Banco Central.
Com o "Invista já", observa-se que se encontram alojadas num mesmo governo forças conflitantes. Estas neutralizam-se mutuamente na perseguição de seus objetivos, opondo, de um lado, medidas promotoras do crescimento e, de outro, medidas inibidoras do crescimento. Como produto desse jogo de soma zero, tem-se a situação atual, que se caracteriza pela escassez de confiança na sustentabilidade do crescimento, induzida pela ambigüidade e pela esquizofrenia nas ações oficiais de comando e controle.
Novas medidas de alívio fiscal, somente em 2005, informou o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, ao enumerar dezesseis medidas de desoneração tributária tomadas pelo governo neste ano, correspondente à renúncia fiscal de R$ 4 bilhões, segundo cálculo oficial.
De fato, em agosto, quando previu arrecadar em 2004 R$ 12 bilhões além do estimado inicialmente, o governo deu início a um processo de redução seletiva de impostos. A primeira leva incluía medidas como redução do Imposto de Renda sobre ganhos com ações, redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a compra de máquinas, redução do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre seguros de vida, incentivo para modernização e ampliação de portos, isenção de parte dos tributos sobre financiamento habi-tacional e criação de alíquotas menores para aplicações financeiras de longo prazo. Semanas antes, o governo anunciara redução do Imposto de Renda das pessoas físicas e eliminação do PIS/Pasep e da Cofins sobre produtos da cesta básica. O governo tem anunciado também redução de impostos sobre as operações de crédito, sobre os fundos de previdência complementar e sobre os produtos e serviços relacionados à tecnologia de informação (software).
Como afirma o Iedi, não se devem desmerecer a direção e a qualidade de tais medidas. É indiscutível a necessidade de se incentivar o mercado de capitais, o alongamento do prazo das aplicações, os investimentos em fundos de previdência ou as aquisições de títulos do mercado imobiliário. É igualmente relevante desonerar a cesta básica e a redução do custo do crédito para o consumidor. Todas essas medidas concorrem para estimular o crescimento do mercado interno e o investimento, com a geração de emprego e renda.
É preciso convir, no entanto, em que do ponto de vista quantitativo o "pacote de bondade" não passa de um tira-gosto, a aguçar o apetite por porções mais generosas. Tanto mais quanto se sabe que é reconhecidamente desproporcional a diferença entre o montante que o governo retira por elevação de impostos da atividade produtiva e o que a ela devolve por Medida Provisória na forma de renúncia fiscal.
Para se ter uma idéia de quanto o governo poderia abrir mão - e não abriu -, as medidas anunciadas representarão, segundo o governo, uma redução anual de impostos de R$ 4 bilhões, nada comparável, por exemplo, ao aumento ocorrido somente na arrecadação da Cofins referente ao primeiro semestre do ano sobre o mesmo período de 2003. Em valores de junho, monta a R$ 6,4 bilhões. É igualmente desconcertante, por se constituir em desestímulo ao investimento, a decisão na semana passada do Conselho Monetário Nacional de manter a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) em 9,75%, em vez de baixá-la em pelo menos um ponto percentual em atendimento à solicitação de todo o setor produtivo, empresários e trabalhadores. Como se sabe, a TJLP incorpora em seu spread o componente "risco país", quando deveria ocorrer o contrário, com a sua remoção, pois investir é contribuir para assegurar a sustentabilidade do serviço da dívida pública e, portanto, contribuir para a redução do "risco país".
Precisado de investimentos maciços, o País carece de uma estratégia conseqüente de estímulo às inversões produtivas, em especial nos setores de infra-estrutura e indústria de base, que estão a demandar um programa provisório de desoneração total de tributos.
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kicker: Investimentos na infra-estrutura e na indústria de base estão a demandar um programa de desoneração total de tributos