Título: Crédito ao consumidor pode promover a inclusão social
Autor: Lívia Ferrari
Fonte: Gazeta Mercantil, 18/08/2004, Nacional, p. A-4

Em países emergentes, é importante crescer com eqüidade, diz Dymski. O professor de Economia da Universidade da Califórnia em Riverside, Gary Dymski, está convencido de que os mercados de créditos ao consumidor em países emergentes podem ser importante instrumento de inclusão social e de crescimento econômico, com maior eqüidade e justiça social.

"Mas, para isso, é preciso criar mecanismos específicos, condições especiais e modalidades diferenciadas para o acesso dos pobres ao sistema de financiamentos", diz ele, que está no Brasil para participar de seminário sobre regulação financeira e mercados de créditos, realizado pelo Instituto de Economia (IE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O evento visa a discutir mudanças no quadro global da regulação financeira, considerando a composição das empresas financeiras que operam em países em desenvolvimento e mecanismos de financiamentos voltados para os pequenos negócios e indivíduos excluídos do sistema.

Dymski faz um paralelo entre o Brasil e a África do Sul, os dois grandes líderes dos continentes sul-americano e africano, respectivamente, com milhares de pobres excluídos do mercado de consumo. Ele lembra que ambos os países elegeram presidentes progressistas nas últimas eleições (Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil, e Thabo Mbek, reeleito na África do Sul) com grande maioria de votos, o que, em seu entender, dá maior legitimidade para a promoção de reformas no sistema de crédito, com ênfase a políticas de microcrédito eficazes, capazes de cumprir de fato seu objetivo.

Na África do Sul, pós-apartheid, vivem mais de dois milhões de negros em Soweto. No Brasil, eqüivalem às favelas. Ambos os países enfrentam graves problema de moradia a camadas de baixa renda. "O problema fundamental é o mesmo nos dois países, onde pobres e negros são excluídos do sistema de financiamentos. Os pobres não têm sequer fiador ou garantias a apresentar", observa Dymski, acreditando que cabe ao Estado orientar políticas de acesso ao crédito a essa faixa da população. Na África do Sul, o mercado de crédito ao consumidor atinge cerca de 360 bilhões de rands por ano (equivalente a US$ 30 bilhões). Os bancos respondem por 88% da oferta desse mercado.

A África do Sul está adotando algumas iniciativas no sentido da inclusão social, através das quais empréstimos até 10 mil rands (cerca de US$ 1 mil) ficam livres da cobrança de taxas de juros. Esse mercado de microcrédito eqüivale a cerca de 15% do mercado global de crédito ao consumidor. Já na faixa dos 85% restantes (com operações acima de 10 mil rands), os juros atingem 26% ao ano.

Além disso, os tomadores sul-africanos pagam algo em torno de R$ 90 bilhões de rands por ano em taxas financeiras e outros encargos associados ao crédito. Isso representa custo médio do empréstimo de 25%.

O professor da Universidade da Califórnia citou o caso dos Estados Unidos, onde, segundo ele, o acesso ao crédito é abrangente. O sistema financeiro americano tem o compromisso de atender a maior parte possível da população, como uma espécie de contrapartida aos serviços oferecidos pelo Federal Reserve (Fed, o Banco Central norte-americano) de guardião da tranqüilidade bancária, de administrador das taxa de juros básicos, além do papel da autoridade monetária de garantidor dos depósitos bancários, destaca Gary Dymski.

A experiência sul-africana de financiamentos será detalhada pelo diretor do Conselho Regulatório sul-africano de Microcrédito, Gabriel Davell, também palestrante no seminário da UFRJ, coordenado pelo professor do IE, Fernando Cardim.