Título: Os enganos dos programas sociais
Autor: José Eloy dos Santos Cardoso
Fonte: Gazeta Mercantil, 18/10/2004, Opinião, p. A-3
Só 17% das verbas do PIB para projetos sociais chegam à classe de baixa renda. Até que ponto os programas governamentais como o Fome Zero e o Bolsa Escola deixam de ser simples projetos políticos e beneficiam realmente as classes sociais menos favorecidas?
No governo José Sarney, que durou entre os anos 1985 e 1989, o ex-ministro do Planejamento Aníbal Teixeira de Souza, ao afirmar que só 30% dos recursos destinados à merenda escolar chegavam realmente a seu destino, causou grande desconforto para os que estavam no poder naquela época. Infelizmente, estava mais do que certo. Na realidade, programas sociais desse tipo muito pouco ou quase nenhum impacto positivo causam nos fins a que se destinam.
Pouco tempo atrás, um conceituado jornal mineiro colocou em seu editorial as conclusões do professor Peter Lindert, da Universidade da Califórnia (uma das mais bem conceituadas dos EUA), que, ao estudar problemas brasileiros, chegou à triste conclusão de que só 17% dos recursos do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil destinados a projetos sociais chegam realmente às classes de baixa renda.
Baseando-se em estudos do Banco Mundial, Lindert diz, por exemplo, que 92% dos alunos das universidades públicas no Brasil são provenientes das camadas mais ricas da população. Isso mostra mais uma vez que quem aqui neste país realmente pode pagar a conta de financiamento das universidades não paga. Os restantes 8% chegam até as universidades do governo depois de ter de pagar os altos custos dos cursos médios dos melhores colégios particulares que, justamente, são aqueles que possuem e pagam melhor seus professores. Esses alunos são aqueles que possuem as melhores condições e conseguem passar nos exames vestibulares. As distorções brasileiras não ficam por aqui. Das verbas orçamentárias, 70% vão para os cursos superiores.
Enquanto o poder aquisitivo dos salários dos brasileiros vai sendo cada vez mais corroído pela inflação, as classes mais favorecidas vão aumentando sua participação no bolo da divisão das rendas disponíveis, o exército de desempregados vai engrossando o coro daqueles que hoje vivem da economia informal, o número de velhos em proporção ao restante da população vai crescendo e provocando um aumento na demanda por recursos da Previdência Social que, por sua vez, também não consegue tapar os rombos nos orçamentos que seriam destinados aos aposentados e pensionistas.
É a dura realidade que os empresários sempre denunciam e o governo faz de conta que não está ouvindo, até que o estouro das contas previdenciárias terá de ter, de qualquer maneira, uma solução. Enquanto poucos navegam nos mares calmos, a maioria dos brasileiros terá de enfrentar os terremotos e os furacões da quase nula sensibilidade daqueles que são os responsáveis pelos destinos da Nação.