Título: Progressista, só o partido
Autor: Mello, Alessandra
Fonte: Correio Braziliense, 03/04/2011, Política, p. 4

Declarações de Jair Bolsonaro, apontadas como racistas, são manifestações do padrão de comportamento do deputado de ideias polêmicas, que o levaram a enfrentar 20 representações por quebra de decoro

Tirando as declarações polêmicas, nada mais notabilizou o deputado federal fluminense Jair Bolsonaro, 56 anos, que por obra da ironia e do falido sistema partidário brasileiro é filiado ao Partido Progressista. Eleito pela sexta vez com pouco mais de 120 mil votos e sem nenhum grande projeto de destaque aprovado pelo Congresso Nacional durante todos esses anos de parlamento, o deputado ganhou projeção nacional esta semana ao tecer comentários preconceituosos contra negros e gays durante entrevista a um programa televisivo de humor.

Despertou também a fúria de diversos segmentos da sociedade, passando pela Procuradoria- Geral da República, Ordem dos Advogados do Brasil, Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e movimentos de defesa dos direitos dos homossexuais e dos negros. A Organização das Nações Unidas para a Educação (Unesco) também se manifestou, exigindo apuração de declarações racistas e homofóbicas feitas por parlamentares brasileiros. ¿A Unesco Brasil reafirma seu compromisso com valores universais de tolerância, respeito à diversidade e aos direitos humanos.¿ Até mesmo uma bancada boa de colegas de parlamento de Bolsonaro repudiaram sua as declarações, alvo, somente esta semana, de seis representações por quebra de decoro parlamentar na Corregedoria da Câmara dos Deputados.

O motivo foi a entrevista em que ele afirma não correr o risco de ver algum de seus filhos casados com uma negra porque eles ¿foram muito bem educados¿. ¿E não viveram em ambientes como lamentavelmente é o teu¿, completou o parlamentar, que respondia pergunta feita por Preta Gil, filha do cantor Gilberto Gil, ex-ministro da Cultura. No mesmo programa de televisão, Bolsonaro afirmou ainda ser contra a cota para negros em universidades públicas e disse que nunca entraria em avião pilotado por cotista. Para completar, ressaltou que nenhum de seus filhos corre risco de ser homossexual, pois ¿tiveram boa educação¿ e que nunca iria a uma parada gay porque tal evento ¿promove maus costumes¿.

Tortura Em se tratando de Bolsonaro, nenhuma das declarações causa espanto. Por causa de outras tão polêmicas ele já sofreu vinte representações por quebra de decoro durante o exercício do mandato. O motivo foi sempre o mesmo: ataques a mulheres, gays, vítimas da ditadura e defesa da tortura. Nem mesmo os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva escaparam da sanha. Lula foi chamado de ignorante, homossexual e analfabeto. No caso de Fernando Henrique, Bolsonaro chegou a sugerir que ele fosse fuzilado. Em discussão com um representante de uma tribo de Rondônia, na Câmara dos Deputados, sugeriu que ele comesse capim para ¿voltar as origens¿. Nesse embate, um dos índios jogou um copo de água na cara do deputado, que militar e professor de educação física.

Estupro A hoje ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, foi empurrada e chamada por ele de vagabunda durante discussão no Congresso. O bate-boca ocorreu, em 2005, quando ela era deputada federal. ¿Jamais iria estuprar você porque você não merece¿, disse o deputado, ao ser acusado por Rosário, na época, de incitar casos de estupro. Abalada, Maria do Rosário saiu chorando do salão. Nada aconteceu com Bolsonaro que, reiteradas vezes, já disse que o Congresso não tem moral para cassar seu mandato por quebra de decoro.

Surpreso com a repercussão negativa de suas últimas declarações, o deputado divulgou nota dizendo que houve mal-entendido e que nunca fez comentários racistas contra ninguém. Em relação à acusação de homofobia, disse que apenas não faz apologia ao homossexualismo por entender que tal prática ¿não é motivo de orgulho¿.

No entanto, Bolsonaro tem feito escola. Sua votação, ainda que não muito expressiva, tem aumentado a cada legislatura. No ano passado, teve 20 mil votos a mais do que nas eleições de 2006 e cerca de 31 mil a mais do que no pleito de 2002. Além disso, ele já tem discípulos: os dois filhos. Flávio Bolsonaro é deputado estadual pelo PP do Rio de Janeiro e Carlos Bolsonaro (PP), vereador na Câmara Municipal do Rio. Todos têm a mesma plataforma. Outro com afinidade de ideais é o deputado federal e pastor Marco Feliciano (PSC-SP), eleito com 211 mil votos. Para ele, os africanos são malditos por serem descendetes de Cam, supostamente autor do primeiro ato gay. Procurado pela reportagem, Bolsonaro não retornou os pedidos de entrevista.

Esterilidade contra a miséria Em seus anos de Congresso, a maioria das propostas apresentadas por Bolsonaro dizem respeito aos direitos dos militares, da polícia e do Exército. Outros tantos tentam diminuir a maioridade penal, autorizar o porte de arma, aumentar o número de pontos que levam à cassação da carteira de motorista e diminuir a idade para a esterilização de homens e mulheres. Ele já chegou a propor que a vasectomia e a laqueadura de trompas fossem usada como política de combate à miséria e a criminalidade.

Quem é Nome: Jair Messias Bolsonaro Idade: 56 anos Partido: PP-RJ Profissão: militar e professor de educação física Histórico parlamentar: Sexto mandato de deputado. Já foi filiado ao PDC, PPR, PPB, PTB e PFL (hoje DEM) Votação na última eleição: 120.646 votos

Projetos apresentados pelo deputado

* Permite comercialização e uso de armas de fogo.

* Inclui como crime hediondo o roubo de veículos automotores.

* Reduz para 21 anos a idade que permite esterelização voluntária e revoga o dispositivo que exige o consentimento do cônjuge em caso de sociedade conjugal.

* Estabelece que o disparo de arma de fogo em caso de legítima defesa própria ou de outrem não se configurará como crime inafiançável.

* Exclui da relação de circunstâncias atenuantes em casos de crime o fato de o agente ter idade entre 18 (dezoito)

e 21 (vinte e um) anos.

* Exige que civis, de ambos os sexos, coloquem a mão direita sobre o lado esquerdo do peito durante a execução do Hino Nacional e apresentação da Bandeira Nacional.

* Prevê a realização de laqueadura tubária e vasectomia para fins de planejamento familiar e controle de natalidade.