Título: EUA recorrem de condenação da OMC
Autor: Alexandre Inacio
Fonte: Gazeta Mercantil, 19/10/2004, Agribusiness, p. B-12

Ficou para o último dia, mas o governo americano não abriu mão de recorrer do parecer da Organização Mundial do Comércio (OMC), que considerou ilegal os subsídios concedidos aos produtores de algodão dos Estados Unidos. Ontem, representantes do governo Bush entregaram oficialmente a apelação da decisão da entidade internacional, que suspende os US$ 3 bilhões fornecidos na forma de subsídios aos agricultores daquele país.

"Essa posição já era esperada. No dia que a OMC deu parecer favorável ao Brasil os americanos já anunciaram que apelariam da decisão", afirma Pedro Camargo Neto, precursor das negociações do algodão na OMC. Segundo Camargo Neto, um corpo de três árbitros deverá julgar o pedido dos Estados Unidos, que deverá estar concluído entre o final de janeiro e início de fevereiro de 2005.

Gastos maiores

Mais do que a demora em um resultado efetivo, a retomada do processo na OMC deverá gerar mais custos aos produtores brasileiros. Além dos US$ 2 milhões já investidos na primeira etapa, desde 2002 - 85% desse valor pago pelo setor privado - a segunda rodada de negócios vai custar algo entre US$ 300 mil e US$ 500 mil aos produtores nacionais.

Independente dos gastos adicionais que os agricultores venham a ter, o otimismo impera entre as lideranças do setor no Brasil. "Os americanos não podem apresentar mais nenhum fato novo. Eles só poderão contestar as interpretações já realizadas pelos juízes que julgaram a primeira etapa. Acreditamos que sairemos vitoriosos novamente", afirma João Luiz Ribas Pessa, presidente da Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa). "Acho que não haverá surpresa. Tivemos uma vitória muito firme na primeira instância", diz Camargo Neto.

Apesar de não terem sido comunicadas oficialmente, as autoridades brasileiras aguardam pelo cronograma da OMC nos próximos dias. "O procedimento agora é aguardar a chegada desse cronograma para vermos como ficará a situação. Nada garante, no entanto, que esse cronograma seja rigorosamente cumprido pela OMC", afirma Hélio Tollini, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa).

Mudança de planos

Se a OMC mantiver sua decisão inicial, favorável ao Brasil, o caso obriga os Estados Unidos a alterarem suas leis de subsídios aos produtores de algodão e pode fazer com que parte dos agricultores americanos migre para uma outra cultura. A cadeia do algodão movimentou no ano passado cerca de US$ 5,6 bilhões nos EUA.

"É quase inevitável que esse tipo de decisão gere recursos. A rota para acordo na OMC não traz resultados rápidos a ninguém. Após um recurso ser derrotado, geralmente as coisas se arrastam mais um pouco até que a decisão seja cumprida", diz Jonathan Branton, sócio do escritório de advocacia Hammonds, em Bruxelas, que costuma acompanhar esse tipo de disputa na OMC.

Decisão política

A decisão do governo americano de pedir revisão do processo na OMC se deve muito mais por questões políticas do que por questões econômicas. De acordo com Pessa, os representantes políticos dos Estados Unidos precisavam esgotar todas as possibilidades perante a entidade internacional. "Eles precisam justificar perante o Congresso que tudo foi feito, independente da decisão da OMC", explica Pessa, da Ampa.

"A vitória que o Brasil já conseguiu na OMC serviu para colocar o País como uma das principais autoridades internacionais. Ganhamos visibilidade com todo esse processo", afirma Tollini, da Abrapa. Sem os subsídios, a produção americana de algodão diminuiria em quase 30% e os preços mundiais do produto subiriam mais de 12%, segundo pesquisa realizada em nome do governo brasileiro por Daniel Sumner, economista da Universidade da Califórnia.