Título: Estudo prevê "explosão" dos presídios
Autor: Hugo Marques
Fonte: Gazeta Mercantil, 19/08/2004, Nacional, p. A-4

Estudo reservado do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça, já entregue ao ministro Márcio Thomaz Bastos, prevê a "explosão" do sistema penitenciário nos próximos três anos, como conseqüência da falta de vagas nos presídios, da política criminal e da desarticulação dos órgãos da execução penal, incluindo as secretarias estaduais de administração penitenciária.

O documento, redigido pelo diretor do Depen, Clayton Nunes, prevê um crescimento "impressionante" no déficit de vagas no sistema penitenciário. No ano de 2007, diz o estudo, "o déficit será superior ao número de vagas no sistema penitenciário", e "não haverá vaga para a metade da população prisional".

Mudança para crimes hediondos

O estudo do Depen contribui para a campanha que o ministro Thomaz Bastos vem realizando para mudar a Lei de Crimes Hediondos, pela qual as penas para crimes como estupro, homicídio qualificado e tráfico de drogas têm de ser cumpridas em regime fechado. Também explica a campanha do governo pela ampliação das penas alternativas. Estas duas medidas desafogariam os presídios.

O Depen explica no documento que, hoje, o déficit de vagas chega a 111 mil presos. No ano que vem atingirá 146 mil vagas. Em 2006, o número sobe para 188 mil vagas. Em 2007, pela estimativa do Depen, o déficit atinge 223 mil vagas. Os cálculos são feitos com base na entrada e na saída de presos do sistema. Por mês, entram 9,3 mil presos e saem 5,8 mil. Há um "saldo" positivo de 3,5 mil presos por mês. Até dezembro de 2007, o Brasil passa a ter um total de 476 mil presos.

A "explosão" independe de novos investimentos. "Dinheiro não será a solução", alerta o documento. Para construir as vagas necessárias para abrigar os presos que entram a cada mês no sistema, o governo federal teria de investir R$ 3,36 bilhões até dezembro de 2007, "montantes que nunca se colocaram viáveis" no contexto do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), diz o estudo.

O Depen aponta a desarticulação institucional entre os órgãos da execução penal como um dos fatores que "gera conseqüências desastrosas" no sistema. Alerta para o "imenso descompasso" entre o crescimento do nível de aprisionamento e o potencial do governo federal em combater o déficit de vagas.

Em 1992, o País tinha 114 mil presos, ou 0,07% da população. Em dezembro último, o percentual subiu para 0,17% da população na cadeia, ou 308 mil presos. "Verifica-se que o País passou a prender, ou a manter preso, mais que o dobro de indivíduos em pouco mais de uma década". O estudo conclui que, salvo "pouquíssimos casos", a privação de liberdade não é a medida mais adequada para o controle da criminalidade.

"Prender menos e soltar mais"

O Depen sugere que o Estado adote o princípio do "prender menos e soltar mais". O estudo também critica a necessidade de obtenção de superávit primário do governo federal, de 4,25% do PIB, um "fator restritivo" e "impeditivo" para a contratação de operações de crédito para obter recursos financeiros para ampliar os recursos do Funpen. A liberação dos recursos do Funpen, diz o estudo, daria para construir 15 mil vagas no sistema.

Ainda ontem, o ministro da Justiça voltou a defender que os presídios sejam reservados só aos chefes de quadrilha ou aos presos que representam riscos à sociedade.

Evitar sanção penal para o usuário de entorpecentes é uma das propostas do Depen para diminuir o número de presos no País. Outra proposta é evitar excessos ou desvios nas prisões em flagrante para usuários de drogas, além da "injusta condenação" do dependente. O Depen sugere que seja evitado o aprisionamento antes da decisão penal transitada em julgado, permanecendo como exceções as prisões em flagrante, temporária e preventiva. O Depen incentiva a aplicação de mais penas alternativas. A série de mudanças sugeridas pelo Depen exige alterações no Código Penal e na Lei de Execuções Penais.

Presos farão próteses dentárias

Os presos passarão a contribuir para repor os dentes da população mais pobre. O Ministério da Saúde anunciou ontem a construção de 50 laboratórios para a fabricação de próteses dentárias, oito deles dentro de presídios. Um dos laboratórios poderá ser instalado em presídio do Rio de Janeiro.

O governo pretende treinar protéticos dentro dos presídios e ao mesmo tempo fornecer dentaduras aos pobres. Pelo projeto, a União vai financiar a construção dos laboratórios e fornecer todo o material para a fabricação das próteses.

As dentaduras serão compradas pelas secretarias municipais nos estados e distribuídas à população.