Título: João Paulo leva plano do setor aéreo a José Viegas
Autor: Daniel Pereira
Fonte: Gazeta Mercantil, 27/10/2004, Política, p. A8

Proposta prevê mais tempo ao pagamento de dívida e aporte do BNDES. O presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), entrega hoje ao ministro da Defesa, José Viegas, uma proposta de reformulação do setor aéreo brasileiro. Elaborada pelas comissões de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio e de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Casa, a proposta é divida em duas etapas.

A primeira delas é uma espécie de "Proar" e prevê a adoção de medidas que garantam mais tempo para o pagamento de dívidas, aporte de recursos e reestruturação societária das empresas.

É considerada fundamental para assegurar que companhias em dificuldades financeiras, como a Varig e a Vasp, sobrevivam até a segunda etapa - a aprovação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) pelo Congresso Nacional e a definição de um marco regulatório para o setor. A criação do órgão regulador foi debatido no governo Fernando Henrique Cardoso, mas por divergências com as empresas, o projeto foi arquivado no final de 2001.

"A crise está se aprofundando sem que nenhuma medida transparente seja anunciada. A postergação da situação prejudica os passageiros e as empresas, que estão ficando sem oxigênio para operar", disse ontem a deputada federal Yeda Crusius (PSDB-RS), relatora da proposta.

Para dar fôlego às companhias, os deputados defendem a manutenção das condições de parcelamento de dívidas fiscais e previdenciárias e a ampliação do prazo para pagamento de débitos com estatais, como Infraero e BR Distribuidora. A dívida das empresas apenas com a administradora dos aeroportos é de cerca de R$ 1,5 bilhão, dos quais R$ 760 milhões e R$ 344 milhões são devidos, respectivamente, por Vasp e Varig. Pela proposta, o prazo para o acerto de contas será estendido até a decisão da Justiça sobre os pedidos de indenização movidos pelo setor contra a União.

As companhias querem do Tesouro Nacional ressarcimento por supostos prejuízos provocados por congelamento de tarifas entre 1986 e 1992. Estão em jogo valores que podem variar de R$ 5 bilhões a R$ 10 bilhões, dependendo do autor da estimativa. A deputada Yeda Crusius disse ontem que o presidente da Câmara fará um pedido formal aos presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Edson Vidigal, para que os processos sejam julgados o mais rápido possível. Decisões favoráveis permitiriam um encontro de contas entre as partes.

A posição oficial do Executivo é contrária ao direito a indenizações. Mesmo assim, os deputados incluíram na proposta um pedido de encontro de contas antes mesmo do desfecho dos processos judiciais. O governo transformaria os créditos reivindicados pelas companhias aéreas em títulos, resgatáveis em até seis anos, sem deságio, que poderiam ser utilizados para pagar dívidas com a União. O precedente da Transbrasil, que recebeu R$ 1,5 bilhão do Tesouro Nacional em 1997, é o principal argumento apresentado para convencer o governo.

De acordo com a deputada Yeda Crusius, o encontro de contas só seria feito se as empresas aceitassem passar por uma reestruturação societária. A idéia é transformar créditos em mãos do governo e dos trabalhadores em ações e conseguir recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para garantir à continuidade da operação das empresas. Nada a fundo perdido. No caso específico da Varig, a Fundação Rubem Berta teria de deixar o controle da empresa.

"Assim como o Proer salvou os correntistas, o Proar dará tempo para as empresas esperarem pela Anac e não deixará os passageiros à deriva", declarou a deputada. A aprovação da agência reguladora e a definição de um marco regulatório compõem a segunda etapa da proposta. "É fundamental que o Congresso Nacional participe das decisões que virão a constituir o novo marco legal em que operarão as empresas do setor. Nos últimos quinze anos, as principais decisões relativas ao ordenamento jurídico da aviação civil regular foram tomadas pelo Poder Executivo de maneira isolada", diz o documento dos deputados.

"Esta falta de participação dos setores envolvidos e da própria população pode estar na origem dos desequilíbrios hoje existentes e no adiamento de solução para sua correção, com altos custos privados e sociais", acrescenta. A depender dos deputados, o novo marco regulatório acabará com a livre concorrência, a fim de dar cabo do que chamam de "competição predatória", e terá um modelo em que consumidores de rotas lucrativas custearão rotas de menor procura.