Título: Projeto Sara tem potencial para ser vendido nos EUA
Autor: Virgínia Silveira
Fonte: Gazeta Mercantil, 27/10/2004, Telecomunicações & Informática, p. A14

O satélite permitirá a realização de experimentos de microgravidade. O Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) desenvolveu uma plataforma espacial inédita para a realização de experimentos em ambiente de microgravidade, em que a influência da aceleração gravitacional é mínima (10-6 g). O projeto, batizado de Sara (Satélite de Reentrada Atmosférica), é considerado uma complementação acessível e eficiente dos meios já disponíveis, como as torres de queda-livre, vôo parabólico, foguete de sondagem, ônibus espacial e estações espaciais (Mir, ISS).

O Sara, segundo Paulo Moraes, coordenador do projeto no IAE, um dos institutos do Centro Técnico Aeroespacial (CTA), também representa a possibilidade real para cientistas de universidades e institutos de pesquisa brasileiros realizarem seus experimentos e desenvolverem tecnologias e produtos por meio de um veículo dedicado, com reserva e proteção de resultados.

Um levantamento inicial feito pelo pesquisador sobre a demanda por esse tipo de plataforma no mercado externo mostrou que ela tem grande potencial de vendas em países como os Estados Unidos.

"Com o Sara o Brasil poderá fazer pesquisa estratégica sem precisar ficar na fila por uma vaga no ônibus espacial ou esperar pela conclusão da Estação Espacial Internacional (ISS), ainda sem prazo definido", explica. Um dos objetivos do projeto, segundo Moraes, é que ele atinja um custo de US$ 1.000 por quilo por hora de experimento.

As torres de queda livre conseguem produzir de 4 a 8 segundos de microgravidade, mas seu custo é de US$ 5 mil por experimento. No caso da aeronave em vôo parabólico, esse nível de baixa gravidade chega a 20 segundos e o custo é de US$ 50 mil. Os foguetes de sondagem, como o VSB30, VS30 e VS40, produzidos pelo IAE, oferecem até oito minutos de microgravidade. O custo de um foguete dessa categoria é variável, mas na média atinge US$ 500 mil.

Uma missão no ônibus espacial custa apenas US$ 100 por quilo por hora de experimento. No caso dos foguetes de sondagem esse custo é de US$ 100 mil e dos aviões, cerca de US$ 10 mil. O valor máximo nesse quesito é o das torres de queda livre que custam até US$ 1 milhão por quilo por hora de experimento.

A primeira versão do Sara será configurada para executar uma missão suborbital, sem inserção em órbita e com um sistema de recuperação da carga útil. Também está previsto um segundo vôo suborbital, para que se possa corrigir eventuais problemas detectados no primeiro veículo e também fazer a incorporação de novos sistemas.

O primeiro vôo do Sara suborbital está previsto para setembro do próximo ano, e o segundo, para três anos depois.

A versão para inserção em órbita, por sua vez, terá capacidade para transportar até 55 quilos de experimentos, que poderão desfrutar de um tempo total de microgravidade de 10 dias, o mesmo período oferecido por um ônibus espacial. "A desvantagem do ônibus espacial para o Brasil é o custo alto e a qualidade do ambiente de microgravidade, que fica alterada pelo movimento das pessoas dentro do veículo", diz Moraes.

O Sara também poderá apoiar o programa de microgravidade brasileiro, criado pela Agência Espacial Brasileira (AEB), para promover pesquisas científicas e tecnológicas em ambiente de baixa gravidade. A influência mínima da ação gravitacional gera um ambiente propício à obtenção de composições homogêneas, eficientes na produção de ligas metálicas, cerâmicas, crescimento de cristais, combustão, comportamento de fluidos e experimentos biológicos como degeneração de tecidos, síntese de proteínas e cultura de células.

O desenvolvimento do projeto completo, segundo Paulo Moraes, está estimado em US$ 12 milhões, sem contar o lançamento, que custa em torno de US$ 6 milhões. "Já temos recursos para realizar o primeiro lançamento suborbital e fazer a revisão crítica do projeto no começo de 2005", explicou.

Pela complexidade técnica do projeto e a necessidade de reduzir custos e riscos de desenvolvimento, o IAE decidiu compartilhar as responsabilidades do Sara com algumas universidades e institutos congêneres: UFRJ, UFPR, UFRGS, ITA e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), além de empresas . "Com essa estratégia incentivamos a formação de núcleos de competência na área espacial fora do CTA, aumentando a capacitação de grupos universitários e das empresas".

Dessa forma, o IAE ficou responsável pela especificação, coordenação e futura integração do veículo. As universidades e os institutos participam do desenvolvimento das tecnologias necessárias para que o veículo tenha um bom desempenho na fase de reentrada atmosférica: cálculos térmicos, o código computacional para a transferência de calor na parte da calota, um sistema que simula o escoamento em altas altitudes e o desenvolvimento de uma câmara que simula a resistência dos materiais do Sara na reentrada (veja box abaixo).

A participação das universidades foi garantida com recursos do programa Uniespaço, que visa o aperfeiçoamento da base de pesquisa na área espacial. O programa selecionou 16 projetos que vão receber R$ 900 mil nos próximos dois anos. O prazo de execução é de 24 meses.