Título: "Spread" e crédito garantem lucros
Autor: Adriana Cotias
Fonte: Gazeta Mercantil, 23/08/2004, Finanças e Mercados, p. B-1

Composição de ativos começa a ser modificada: empréstimos ganham mais relevância. A combinação de "spreads" ainda altos com o aumento dos volumes emprestados levou os bancos que operam no Brasil a manter resultados exuberantes no primeiro semestre. Mesmo com a queda de mais de dez pontos da Selic entre junho de 2003 e junho de 2004 - de 26,5% para 16% anuais -, as instituições foram eficientes em preservar margens e garantir boa rentabilidade ao capital empregado pelos acionistas. Na média, o resultado operacional caiu, mas, no "bottom line", a elevação das receitas de serviços e as menores provisões com crédito e tributos fizeram a diferença.

Segundo levantamento da Austin Rating, com uma amostra de 22 bancos que já divulgaram seus balanços, o retorno anualizado sobre o patrimônio líquido passou de 21,2% para 21,7% na média. No conjunto, o lucro líquido subiu 20,1%, de R$ 5,9 bilhões para R$ 7,1 bilhões. "A retomada da atividade econômica a partir do segundo trimestre puxou as operações de crédito", diz o presidente da consultoria, Erivelto Rodrigues.

De um primeiro semestre para outro, as carteiras de crédito das instituições assinalaram incremento de 19,7%, para R$ 268,7 bilhões. Entre bancos de grande porte, a maior evolução foi observada no ABN Amro Real, que incorporou os ativos do Sudameris Brasil. O estoque de crédito foi ampliado em 56,5%, a R$ 28,9 bilhões. Segundo o presidente do ABN, Fábio Barbosa, excluindo a aquisição, as operações cresceram 14%.

Outro que se destacou em crédito foi o Banespa, com uma ampliação de 30,6%, a R$ 8,0 bilhões. O Banco do Brasil, que detém a maior carteira do Sistema Financeiro Nacional (SFN), aumentou o portfólio em 21,1%, a R$ 83,1 bilhões.

"Houve redução nos resultados com títulos públicos e aumento das receitas com operações de crédito, reflexo já de um `trade off¿ no mix de ativos, com queda no valor da carteira de papéis e elevação dos volumes de crédito", diz o economista da Lopes Filho & Associados, João Augusto Salles. "O que está por trás disso é a queda de Selic, que induz à menor rentabilidade em títulos e valores mobiliários e na carteira, propriamente dita." Isso está refletido no encolhimento do resultado operacional, de 29% no Bradesco, a R$ 1,4 bilhão; de 6,4% no Itaú, a R$ 3,0 bilhões; de 15% no Unibanco, para R$ 871,4 milhões; e de 18,5% no Banespa, para R$ 916,7 milhões.

Mas com a ampliação dos volumes emprestados melhorou a rentabilidade das carteiras, que passou de 16,9% para 19,6%. O índice considera as receitas obtidas com as operações, menos despesas com provisões, sobre o portfólio geral. Não contempla, porém, o custo de captação. "A taxa básica caiu numa velocidade mais rápida do que os `spreads¿, por isso os ganhos", diz Rodrigues, da Austin.

Para o ano completo, o especialista espera, na média, uma expansão de 22% para a atividade de crédito, considerando-se um crescimento de 4,2% para o Produto Interno Bruto (PIB). "Os bancos estão empoçados de liquidez, há muito recurso para emprestar."

O analista da Técnica Assessoria de Mercado de Capitais, Catarino José Ribeiro, prevê ampliação de até 30% para as carteiras em 2004. "A base é muito fraca, porque o crédito veio comprimido desde 2002, no ano das eleições."

Outro ponto que favoreceu o resultado final, principalmente nos três maiores bancos privados, Bradesco, Itaú e Unibanco, foi a queda das despesas com provisões para devedores duvidosos em 23%, 55% e 9,7%, respectivamente. "Do lado da oferta, os bancos têm operado com maior eficiência, sendo mais seletivos", diz Salles, da Lopes Filho. "E, no lado da demanda, os agentes estão mais precavidos, saldando dívidas e fazendo a reestruturação orçamentária."

Entre os grandes, a exceção foi o Banco do Brasil, que aumentou as despesas para créditos de liquidação duvidosa em 54,8%, para R$ 2,6 bilhões. "Isso se explica porque a carteira de pessoas físicas apresentou aumento significativo e a elevação da inadimplência está implícita, mas como ganhou escala em crédito, o impacto final foi favorável", conclui Salles.