Título: Estiagem pode reduzir área de arroz
Autor: Neila Baldi
Fonte: Gazeta Mercantil, 24/08/2004, Agribusiness, p. B-12

Região oeste do Rio Grande do Sul, maior produtora do grão, sofre com a falta de chuvas. A seca no Rio Grande do Sul poderá afetar o abastecimento de arroz no País no próximo ano. A falta de chuva pode comprometer o cultivo do grão, que começa oficialmente em setembro. Há estimativas de redução de área de até 20% no estado. Além disso, o produtor gaúcho enfrenta outro problema: a safra 2003/04 está encalhada. Apenas 30% da produção foi comercializada, para uma média histórica de 45% nesta época do ano.

Segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o prognóstico é de pouca chuva para o trimestre, principalmente no oeste do estado, onde estão concentradas de 30% das lavouras do grão.

"Se até meados de setembro não chover, haverá redução de área", afirma Aldo Lobo, analista da Safras & Mercado. Segundo ele, até o momento havia indícios de manutenção ou leve queda no plantio do grão (1%), mas já há quem fale em diminuir entre 10% e 20%. "Se isso ocorrer, pode afetar o abastecimento", afirma Lobo. A estimativa da consultoria é de que o consumo do grão para o próximo ano fique em 12,7 milhões de toneladas para uma produção de 13 milhões de toneladas, sem redução de área. Mas se o plantio for menor, pode-se ter uma produção inferior ao consumo. Além disso, segundo o consultor, se a seca persistir poderá haver perda também com a produtividade.

O presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Valter Pöetter, é ainda mais alarmista. Segundo ele, fala-se em redução de até 50% da área cultivada no oeste do estado, queda de 20% na campanha e 10% na zona sul. Em média, ele acredita que o Rio Grande do Sul terá uma área cultivada 30% inferior à safra passada. De acordo com Pöetter, uma alternativa de plantio para o arrozeiro seria a soja, mas no oeste do estado, apenas 30% da área é de terras altas, propícias à oleaginosa.

Déficit hídrico

Segundo o presidente da Associação Brasileira da Cadeia Produtiva do Arroz (Abrarroz), Arthur Albuquerque é preciso chover 500 milímetros até o final de setembro para que a situação volte ao normal. No entanto, ele diz que as previsões meteorológicas indicam índices pluviométricos de 200 a 400 milímetros. "Confirmada esta tendência de deficiência hídrica, vai haver redução no plantio", afirma. Albuquerque afirma que, se o chuva for mínima, a diminuição no oeste vai ser de 50%. Do contrário, a tendência é de área 20% a 30% menor.

"Há uma constatação de que o oeste do Rio Grande do Sul está com as represas com baixo nível de água, mas ainda há tempo para reverter. Os produtores estão preparando a terra como se tudo fosse normal", diz Paulo Morceli, analista da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Para o consultor Carlos Cogo, ainda há tempo para o clima reverter, pois a maior parte do plantio ocorre em outubro (cerca de 50%). Mas para ele, a situação está preocupante porque além da previsão de chuva irregular para o trimestre, há incertezas quanto à presença ou não do fenômeno "El Niño". Segundo ele, há indícios de déficit hídrico de 60% na fronteira oeste do estado. "Qualquer baque no Rio Grande do Sul afeta o restante do País, pois daqui saem mais de 50% da produção", afirma Cogo.

O Rio Grande do Sul vem enfrentando problemas de estiagem deste o início do ano, quando houve perda superior a 40% da produção de soja. A seca de 2000, por exemplo, afetou a produtividade do arroz, que no Sul do estado foi contaminado pela salinidade das lagoas. Naquela safra, a produtividade ficou em 5,4 toneladas por hectare, 4% inferior ao ano anterior.

Para o diretor comercial do Instituto Riograndense do Arroz (Irga), ainda não há como calcular se haverá ou não redução de área plantada, mas que há informações de barragens com apenas 50% de suas capacidades. Ele salienta, no entanto, que o restante do estado não está sofrendo com a estiagem.

Comercialização

A entrada do arroz do Mercosul a preços mais baratos que os praticados no Rio Grande do Sul também poderá influenciar na decisão de plantio. Segundo o presidente da Federarroz, apenas 50% da safra - colhida em março - foi vendida.

"Está lenta a venda, pois já entrou mais de 500 mil sacas do Mercosul", afirma Pöetter. De acordo com ele, o grão dos países vizinhos chega ao Brasil a valores de US$ 8,50 a US$ 9 a saca (50 quilos), enquanto o custo da produção gaúcha pode ficar em até US$ 10 a saca. Por isso, os produtores solicitaram que o governo barre a entrada do grão do Mercosul até dezembro, passando a aplicar a Tarifa Externa Comum (TEC).

"A entrada deste arroz pode deprimir ainda mais os preços, desestimulando o plantio", avalia o presidente da Federarroz.

No início da colheita, o preço do grão estava cotado a R$ 34 a saca e atualmente é comercializado a R$ 30 a saca, uma variação negativa de 11,8%, segunda a Safras & Mercado. Lobo informa que, este ano, devido a super safra de arroz, as indústria compraram mais produto de Mato Grosso no primeiro semestre e, além disso, passaram a se abastecer do grão do Mercosul, que entra a R$ 27 a saca no País.

De acordo com os dados da Conab, o Brasil produziu um excedente de 100 mil sacas de arroz sobre o consumo, mas tradicionalmente importa entre 700 e 800 mil sacas do Mercosul. A expectativa é de que este ano, mesmo com safra cheia, as indústrias comprem dos países vizinhos volumes idênticos à média histórica.

Albuquerque avalia que a comercialização pode destravar no início do plantio, quando o produtor vai precisar de recursos. "Hoje, quem tem arroz já pagou suas dívidas, não precisa vender", avalia. Segundo ele, ao invés de taxar o produto do Mercosul, uma alternativa é convencer os países vizinhos a plantarem menos. Para isso, haverá uma reunião no próximo dia 9, na cidade do Paraná, na Argentina.