Título: PPP e obstáculos ao agronegócio
Autor: Rodolpho Tourinho
Fonte: Gazeta Mercantil, 08/11/2004, Opinião, p. A-3

Poucas vezes a história econômica registrou um crescimento tão espetacular como o do agronegócio brasileiro nos últimos dois anos. Na safra de 1996/97, o Brasil produziu 78,9 milhões de toneladas de grãos, resultado que, em 2003/2004, chegou a 119 milhões de toneladas. Além do aumento do emprego e da renda no campo, houve também um crescimento das exportações. Dos US$ 90 bilhões de vendas de nossos produtos no mercado internacional, previstos para 2004, a balança do agronegócio vai contribuir com pelo menos US$ 33 bilhões, segundo as projeções mais conservadoras. Desde o ano passado, por exemplo, o Brasil se consolidou na liderança das vendas mundiais das carnes de boi e de frango.

Uma análise feita recentemente pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), porém, alerta que a safra brasileira já poderia estar registrando números muito mais expressivos. Porém não avançou tanto por conta de deficiências na infra-estrutura, principalmente de logística.

Esses gargalos já ameaçam até mesmo anular a expansão obtida nos últimos dois anos, que foi alcançada, diga-se de passagem, mesmo enfrentando inúmeras barreiras impostas aos nossos produtos. Um bom termômetro disso está em um estudo recente realizado pela Coordenação dos Programas em Engenharia e Administração (Coppead), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que mostra, por exemplo, que 48 das 100 principais empresas exportadoras apontam os problemas de infra-estrutura como os mais graves. Na verdade, já se sabe que as dificuldades de transportes em nossas rodovias e ferrovias não impedem a chegada de produtos do campo apenas aos portos, mas também aos centros processadores e até mesmo ao interior do País.

Como bem lembrou, recentemente, o ex-ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Pratini de Moraes, isso se torna mais grave por ser o Brasil um país distante de grandes mercados compradores como Japão e China, e ainda em razão de alguns de nossos grandes concorrentes do agronegócio, como EUA e Austrália, além de estarem próximos daqueles mercados, não terem os problemas de logística que tanto nos afligem.

É claro que os problemas em nossa infra-estrutura - que não incluem gargalos apenas nos transportes - exigem investimentos que o governo já deixou claro que não tem condições de arcar sozinho. E é neste momento que aumenta a importância do projeto de lei das Parcerias Público-Privadas (PPP), ora em tramitação no Senado.

Em toda a área de infra-estrutura calcula-se que sejam necessários investimentos de R$ 40 bilhões por ano. Só no setor elétrico a estimativa é de R$ 20 bilhões, dos quais o governo, na melhor das hipóteses, poderá atingir R$ 8 bilhões. Na área de transportes, a utilização dos recursos da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) pode resolver o problema das rodovias, mas não das ferrovias e dos portos.

Não é exagero dizer que as PPP representam um avanço institucional para melhorar as condições de infra-estrutura. Trata-se de um caminho para que o governo, sem os recursos financeiros necessários, firme contratos com parceiros privados tendo por objetivo viabilizar a provisão de serviços fundamentais para o País.

Difere claramente da privatização ou da concessão pura e espera-se, como resultado, que o retorno social exceda o retorno privado.

Mas, para que se alcance esse objetivo respaldado pelos princípios basilares da legalidade e da moralidade, é preciso introduzir na lei das PPP a garantia de segurança aos investidores a partir de pilares fundamentais: no primeiro caso, o respeito absoluto à Lei de Responsabilidade Fiscal e à Lei de Licitações; e, no segundo, que a avaliação da demonstração das vantagens socioeconômicas seja chancelada por uma instituição independente.

Com essas medidas, as Parcerias Público-Privadas terão uma blindagem de qualidade e propiciarão maior atração de investimentos, de capital externo ou mesmo nacional. Seguramente haverá também uma redução no custo do financiamento, o que é essencial para a realização de obras de infra-estrutura.

Sozinhas, as PPP não são suficientes para solucionar os gargalos da infra-estrutura do País, como alguns setores do governo vêm anunciando. Mesmo porque seu sucesso dependerá principalmente da capacidade do País em atrair investimentos.

Mas o Senado está construindo um projeto avançado e blindado naqueles aspectos fundamentais da responsabilidade fiscal, do não-dirigismo nas licitações e da avaliação da qualidade de projetos. O momento é de negociação e bom senso entre o governo e o Congresso para tornarmos as PPP viáveis.

Até porque o agronegócio, que vem sendo o verdadeiro motor da economia brasileira, aguarda esse novo instrumento institucional com entusiasmo para afirmar ainda mais a sua liderança mundial em tantos outros produtos e em novos mercados.

kicker: As PPP sãoum avanço institucional para melhorar as condições de infra-estrutura