Título: O difícil entendimento entre os atores da saúde
Autor: Lucas Callegari
Fonte: Gazeta Mercantil, 08/11/2004, Panorama Setorial, p. A-6
A determinação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) de que novos contratos deveriam ser assinados entre operadoras e prestadoras de serviços hospitalares, incluindo necessariamente alguns parâmetros mínimos, revelou que a relação entre os diversos atores da saúde privada no Brasil não anda bem. Mostrou, principalmente, que a crise da saúde suplementar impede o entendimento.
A contratualização foi determinada pela ANS em 2003, por meio da Resolução Normativa nº 42. Os contratos deveriam ser firmados até 30 de abril de 2004, mas o prazo não foi cumprido, pois, na maioria dos casos, não houve consenso sobre os itens que constariam nos contratos.
Para Dante Montagna, presidente do Sindhosp, o setor hospitalar sempre pediu um instrumento que estabelecesse uma relação justa entre as duas partes. A contratualização seria a oportunidade de estabelecer, por exemplo, prazos para faturamento e pagamento de serviços prestados pelo hospital, definição de rotina para a conferência e certificação das faturas recebidas pela operadora e definição de prazo de revisão periódica dos preços contratados.
Segundo Montagna, não há "uma relação estreita entre hospitais e operadoras". Uma pesquisa junto a 50 hospitais privados da Grande São Paulo, realizada pelo Sindhosp, mostrou que apenas 9,2% dos contratos haviam sido assinados até o final de junho último e que mais de 53% das operadoras ainda não tinham iniciado o processo de negociação com os hospitais.
A pesquisa ainda apurou que apenas 8% dos contratos enviados pelos convênios consideraram um índice de reajuste. A maioria das propostas previa que o índice ou a forma de reajuste seria discutido no futuro. Outro dado da pesquisa foi que praticamente todos os contratos não faziam menção à implantação da Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM), reivindicada pela classe médica.
As operadoras se defenderam do resultado da pesquisa. O presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), Arlindo de Almeida, declarou que "na parte da medicina de grupo os números são diferentes, pois 38% dos contratos enviados haviam sido assinados e 34% estavam em negociação".
Já a Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (Fenaseg) afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que no "universo da pesquisa do Sindhosp apenas 12% das operadoras incluídas correspondem às seguradoras especializadas em saúde. Não estão discriminados claramente que resultados da pesquisa correspondem especificamente às seguradoras, já que são resultados gerais". A Fenaseg também assegurou que enviou propostas a todos os prestadores, conforme foi determinado pela Resolução da ANS.
As operadoras resistem em estabelecer um parâmetro de reajustes nos contratos. Para o presidente da Abramge, isso não é possível porque "não sabem o percentual dos futuros reajustes da ANS". A imprevisibilidade do aumento dos custos na área da saúde é outro argumento.
O que dificulta o entendimento é a crise do setor de saúde suplementar, que se tem manifestado de várias formas: endividamento dos hospitais, estagnação do mercado de planos e seguros de saúde, baixa remuneração dos médicos, dificuldades da população para ter um convênio e queda das vendas dos fornecedores de equipamentos e serviços. Diante desse cenário, os hospitais e médicos tentam estabelecer regras para interromper o contínuo processo de descapitalização. Já o movimento das operadoras está dentro de sua estratégia de melhorar o controle de custos.