Título: Apagão na saúde
Autor: Braga, Gustavo Henrique ; Gabriel, Caprioli
Fonte: Correio Braziliense, 07/04/2011, Economia, p. 14

Os usuários de planos de saúde que procurarem hoje os hospitais e as clínicas particulares em busca de atendimento médico vão ficar na mão. A classe médica e outros profissionais de saúde, como os dentistas, aderiram à paralisação nacional organizada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e pela Federação Nacional dos Médicos (Fenam) contra as operadoras de planos. No Distrito Federal, o protesto deve atingir toda a rede privada, de pequenos consultórios aos grandes hospitais. Além das consultas que estavam agendadas e foram remarcadas, serão afetados os exames e até mesmo o atendimento de emergência. Somente casos graves serão atendidos.

Os médicos reivindicam o aumento da remuneração oferecida pelos planos para um mínimo de R$ 60 por consulta ¿ a média atual é de R$ 30 ¿, além da adoção de critérios contratuais que definam um parâmetro e uma periodicidade para reajustes futuros. Os profissionais reclamam ainda do excesso de burocracia e do descaso de algumas empresas com os próprios pacientes. ¿A força da mobilização é um indicativo de que todos estão descontentes com os planos¿, afirmou o ortopedista Weldson Pereira.

A expectativa é de grande adesão ao manifesto, já que todas as principais entidades representativas dos profissionais aprovaram a iniciativa com apoio, inclusive, de sindicatos hospitalares e organizações de defesa do consumidor. Apesar dos transtornos esperados para hoje, usuários também manifestaram solidariedade à causa defendida pelos médicos. A aposentada Rosa de Lima Silva, 76 anos, conta que, apesar de ter um convênio, ela precisa desembolsar grandes quantias todos os meses para fazer consultas particulares. ¿A situação é tão crítica que os bons médicos se recusam a atender pelo plano. Então, fico sem alternativa¿, desabafou. Já o funcionário público Ivanei Moreira, 46 anos, conta com a cobertura de duas operadoras, mas nem assim está satisfeito: ¿Comecei um tratamento dermatológico, mas no meio tive de mudar de especialista porque ele já não atendia pelo plano¿.

Os centros médicos da capital federal não estão apoiando oficialmente a paralisação, mas, na prática, quem procurar atendimento deve se frustrar, pois os médicos prometem não comparecer ao trabalho. Por meio de sua assessoria, o Hospital Santa Lúcia informou que a estrutura da instituição funcionará normalmente para internações eletivas (aquelas que não chegam ao local via pronto-socorro), mas que as consultas e exames ambulatoriais foram remarcados. A direção do Hospital Daher, no qual profissionais da área de ginecologia e obstetrícia confirmaram a paralisação geral, preferiu não se pronunciar sobre a movimentação. Os usuários que se sentirem prejudicados podem registrar queixa no Procon e na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) por falta de cobertura.

Reclamações A ginecologista Sônia Ferri, que atende em um consultório particular, admitiu que ouviu reclamações ao remarcar todas as consultas de hoje. ¿Mas estou negociando com cada uma das pacientes conforme a necessidade e a gravidade dos casos. Não vou deixar nenhuma desamparada¿, garantiu. A preocupação dela, todavia, não foi verificada em todos os centros médicos. Pacientes de outros ginecologistas relataram ao Correio que seus atendimentos foram adiados em até um mês.

Ferri contou que começou a restringir o atendimento via convênios há cerca de dois anos: ¿Enfrentava diariamente restrições dos planos às consultas, às internações e a uma série de exames. Preferi selecionar melhor e parar de atender alguns¿. Uma obstetra carioca, que preferiu não se identificar, diz ficar constrangida com o procedimento de algumas empresas que obrigam o médico a justificarem mais de um atendimento mensal para o mesmo paciente. ¿Eu passo horas preenchendo relatórios para explicar o óbvio, que uma paciente no fim da gravidez precisa ser consultada toda semana¿, reclamou.

Dentistas Em solidariedade aos médicos, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) orientou os dentistas a também pararem as atividades hoje. ¿Nossa situação é tão precária quanto à das especialidades médicas, por isso apoiamos o movimento¿, declarou João Carlos Tavares, diretor de Convênios e Credenciamentos do Sindicato dos Odontologistas do Distrito Federal. Em Brasília, toda a categoria promete fazer um ato em frente ao Centro Clínico, localizado na 716 Sul.

Insatisfação Os médicos também mostram indignação contra a ANS devido à ineficiência da reguladora em contribuir com avanços nas negociações. Diogo Mendes, diretor de saúde suplementar do Sindicato dos Médicos de Brasília, diz que a agência atua em favor dos convênios e chama atenção para o fato de que os executivos são ligados aos planos de saúde. Mauricio Ceschin, diretor-presidente, por exemplo, é ex-comandante da Qualicorp e Leandro Reis Tavares, outro diretor, foi chefe de emergência da Amil em Niterói, antes de ingressar na agência responsável pela fiscalização das operadoras.