Título: Indícios de expansão, mesmo com aperto da política econômica
Autor: Adriana Cotias
Fonte: Gazeta Mercantil, 11/11/2004, Relatório da Gazeta Mercantil, p. 1
Recuperação da renda e do emprego anima previsão de crescimento neste ano. D epois de anos sem crescer a taxas reais, o crédito bancário no Brasil esboça reação e promete fechar 2004 com uma expansão nominal de 20% - ante inflação projetada de 7,2% pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Apesar do aperto na política monetária, empreendido a partir de setembro, a recuperação da renda e do emprego tem garantido continuidade às contratações de empréstimos, com clara ênfase nas áreas de consumo e de pequenas e médias empresas. Para o ano que vem, a expectativa de analistas e banqueiros é de que os saldos de empréstimo cresçam até 25%.
A grande tendência é de que à medida em que os juros comecem a cair - conforme as previsões, a partir do segundo trimestre de 2005 -, o segmento corporativo procure opções de financiamento via mercado de capitais e que o varejo participe mais nas carteiras das instituições financeiras. "O financiamento à produção, que demanda recursos de longo prazo, não deve escoar pelo crédito bancário e sim por emissão de ações ou títulos de dívida", disse o professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA-USP), José Roberto Securato.
De janeiro a setembro, o estoque de crédito no sistema financeiro nacional (SFN) aumentou 12,3%, a R$ 460,3 bilhões, de acordo com os dados do Banco Central. No mesmo período, as emissões primárias e secundárias de ações, debêntures, notas promissórias e outros instrumentos de dívida, registrados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), atingiram R$ 16,9 bilhões - 51% acima do volume de todo o ano passado- e há ainda R$ 6,2 bilhões em análise.
Trata-se de um universo ainda pequeno quando comparado ao total de R$ 156,7 bilhões em recursos livres aplicados pelos bancos em operações corporativas. Mas já é uma massa que vem mobilizado as equipes dos bancos de investimento: com a migração, o que era receita de intermediação financeira passa a ser substituído por comissão pela prestação de serviços.
Natal mais gordo
Em 12 meses, o incremento das operações de crédito no sistema financeiro chegou a 18,1%, o que ampara estimativas de um percentual mais polpudo até dezembro, já que os três últimos meses do ano são sazonalmente melhores para a atividade econômica em geral. "Tudo indica que o Brasil terá o melhor Natal desde 1996", previu o ex-ministro da Fazenda, Mailson da Nóbrega, mesmo apostando num novo ajuste da Selic neste mês. "O País está trilhando um dos melhores caminhos para a recuperação do crédito". O sócio da Tendências Consultoria atribui o ambiente benigno à reação da renda e do emprego, combinada com a queda da inadimplência.
A maior pontualidade dos tomadores de crédito tem permitido o alargamento dos prazos e, conseqüentemente, reduzido o valor das prestações. "Isso aumenta a capacidade de pagamento dos tomadores, o que leva à redução do risco e do spread, com recuo adicional das taxas de juros", explica o especialista. Ele reconhece, porém, o spread bancário como um grande limitador, pois os fatores que condicionantes sua formação são de difícil remoção no curto e médio prazos.
Ele lista os compulsórios, a cunha fiscal, a inadimplência e as incertezas no campo jurídico como custos usualmente transferidos para o tomador. Para completar, a rolagem sistemática da dívida do Tesouro via títulos públicos garante uma fonte certa de retorno para as tesourarias a riscos baixos.
Por tudo isso, no cômputo geral o estoque de crédito do sistema equivale a apenas 26,3% do Produto Interno Bruto (PIB), proporção bem abaixo da verificada em países industrializados ou mesmo em economias em desenvolvimento. Segundo levantamento do banco suíço UBS Warburg com bases em dados da International Foundation for Science (IFS), o índice brasileiro está pouco acima da média da América Latina, salvo exceções como o Chile, onde a relação supera os 60%, equiparando-se à alavancagem norte-americana. Na China, a taxa é de mais de 140% e na emergente África do Sul fica acima dos 80%.