Título: "Cobertor curto" para produtor rural
Autor: Neila Baldi e Riomar Trindade
Fonte: Gazeta Mercantil, 11/11/2004, Relatório da Gazeta Mercantil, p. 4

Normatização de crédito demorou dois meses para sair, reclamam setores do agronegócio. P ara os produtores rurais brasileiros, o ano de 2004 tem se caracterizado por dificuldades de obtenção de crédito. Apesar de o Plano Safra, divulgado em junho pelo governo, ter prometido melhorias nessa área, houve demora na normatização do crédito. Outro fator negativo foi o aumento dos recursos a juros livres e, com isso, a redução do crédito subsidiado. "O cobertor está curto", tem dito o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Roberto Rodrigues.

Levantamento realizado pelo ministério mostra que durante o mês de julho, o primeiro do ano-safra 2004/05, houve uma redução de 42% nos empréstimos de custeio liberados aos agricultores pelo Banco do Brasil se comparado ao mesmo período do ano passado. O número de operações totalizou R$ 885 milhões. Nos últimos dois me-ses, as operações se intensificaram e, de julho a novembro, o banco deve totalizar R$ 15,5 bilhões de recursos disponíveis, 26,15% a mais que no mesmo período do ano passado.

Desse total, R$ 12,2 bilhões fo-ram para o custeio (variação de 43,66%), R$ 1,5 bilhão para inves-timento (alta de 27,76%) e R$ 1,7 bilhão para a comercialização (queda de 31,52%).

No entanto, desse volume, R$ 5 bilhões estão sendo desembolsados neste mês. "Estamos injetando dinheiro na veia do produtor", disse José Carlos Vaz, gerente executivo de Agronegócio do banco. Luciano Carvalho, assessor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), ressalta que, apesar disso, os recursos foram liberados tardiamente, pois o plantio começou em outubro. O certo é que, tanto bancos quanto produtores têm também outra ex-plicação, além dos trâmites burocráticos, para a demora: a greve dos bancários.

Vaz ressaltou o crescimento das operações com Cédulas do Produto Rural (CPR), negociadas por intermédio do Banco do Brasil. Até outubro, foram R$ 3,1 bilhões, o que significa um aumento de 321% em relação ao valor negociado em 2003, que foi de R$ 987 milhões. Este ano, o banco não só avalizou operações com CPRs como comprou cédulas financeiras, num total de R$ 900 milhões.

A entrada do banco como comprador contribuiu para derrubar a taxa de juro e outros encargos que envolvem a operação - mudança elogiada pelo setor produtivo. Outra reclamação dos produtores se refere à oferta de crédito para investimento, que também estava com o ritmo lento na sua liberação.

Nesse caso, houve atraso também na divulgação das normas: isso ocorreu em 11 de agosto, quase dois meses após o anúncio do Plano Safra 2004/05. Segundo levantamento feito pelo setor o tempo entre o recebimento do pedido de crédito até a liberação do financiamento foi de 140 dias nesta safra, em média; no ano passado, girava em torno de 120 dias.

Segundo Vaz, as operações de investimento agropecuário com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) se normalizaram, após ajustes nos sistemas de contratação de crédito da Finame Rural. Este ano, já foram liberados cerca de R$ 440 milhões. "O crédito está moroso, restrito e com acompanhamento de juros complementares", diz Carlos Sperotto, presidente da Comissão de Crédito da CNA. Ele complementa dizendo que recursos a juros altos estão sobrando. "Tememos que, com isso, se repita o endividamento que onerou o setor agrícola há 11 anos", afirma.

Carvalho acrescenta que, apesar de o Banco do Brasil dizer que os recursos de investimentos estão normalizados, produtores reclamam da demora e, no caso da aquisição de maquinário, há quem esteja cancelando as compras. Em outubro, as vendas de máquinas agrícolas foram menores 5,6% que no mesmo período do ano passado. "Este ano houve uma pressão maior pelo crédito porque as tradings saíram do financiamento, devido a problemas na safra passada", afirma Carvalho.