Título: Diversificação na geração de energia
Autor: Xisto Vieira Filho
Fonte: Gazeta Mercantil, 10/11/2004, Editorial, p. A-3
Está mais do que comprovado que nenhum sistema pode ficar sem diversificação de fontes energéticas, tema atualmente bastante discutido em âmbito internacional. No Brasil, a importância da diversificação está fundamentada na segurança eletroenergética: o País não pode mais conviver com racionamentos de energia nem com blecautes por colocar todas as suas fichas em uma só forma de geração e em transmissões carregadas à longa distância - a fórmula perfeita, diga-se de passagem, para se obter apagões. Com relação ao gás natural, as riquezas do País não deixam dúvidas de que é um vetor fundamental a ser considerado em nossa matriz energética. As reservas provadas nacionais são da ordem de 219,8 bilhões de metros cúbicos, podendo chegar a 400 bilhões após a confirmação das novas descobertas, nas quais se destacam diversos estados: Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Amazonas, São Paulo, Espírito Santo, Bahia, entre outros. O desafio é chegar em 2010 com uma participação de 12% do gás natural na matriz energética brasileira. Para isso seria necessário ultrapassar a marca dos 100 milhões de metros cúbicos, mais do que triplicando o consumo diário registrado nos últimos anos da década de 90. De acordo com a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), o consumo do gás natural no segmento termelétrico experimentou um aumento acumulado de 63,7% de janeiro a junho de 2004 em relação ao mesmo período do ano anterior. O crescimento da utilização do gás natural nas térmicas, com a entrada de novas usinas, alavancou o crescimento do percentual de consumo total. Somente o Centro-Oeste apresentou alta de 272,1%, causada sobretudo pela térmica de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, de 360 MW, que consome 100 milhões de metros cúbicos por dia. Vale destacar os programas de energias renováveis a biomassa, mais especificamente de cana-de-açúcar. O Brasil é riquíssimo em bagaço de cana e pode diversificar ainda mais seus combustíveis utilizando geração com essa importante fonte energética. A safra 2003/2004 de cana-de-açúcar foi de aproximadamente 350 milhões de toneladas e a estimativa para 2004/2005 é de que chegue a 390 milhões de toneladas, suficientes para uma geração da ordem de 7 a 8 mil MW de energia, segundo estimativas de Onório Kitayama, da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica). A geração pode ser ainda muito maior, considerando-se a previsão de que a produção de cana-de-açúcar chegue a 550 milhões de toneladas anuais em 2011. Estes dados confirmam o grande potencial de geração de energia a partir do bagaço de cana. Infelizmente, no entanto, as usinas só produzem atualmente cerca de 2000 MW de energia, suficientes apenas para o consumo próprio. A continuação de um programa de desenvolvimento de geração a gás natural, iniciado pelo ex-ministro Rodolpho Tourinho, em conjunto com um programa de bioeletricidade, daria ao País um excepcional nível de confiabilidade eletroenergética por meio de uma estratégia de diversificação de combustíveis consonante com os recursos do País. É preciso também ressaltar sempre que é absolutamente indispensável desenvolver a co-geração com mais intensidade porque, além de grande eficiência energética, - tendo em vista a utilização do gás para a geração simultânea de eletricidade e vapor/frio para uso industrial e comercial -, está próxima do centro de carga. Nos últimos anos, alguns passos foram dados em direção à regulamentação do setor energético que favoreceram investimentos em co-geração. Entre eles, destaca-se a legislação voltada para o autoprodutor e para o produtor independente. Essa legislação faculta às empresas a possibilidade de se tornarem autônomas ou venderem energia, o que até então era autorizado apenas em casos especiais. A Abraget tem defendido ardorosamente a necessidade de diversificação de combustíveis em nosso setor elétrico. A necessidade de tal diversificação atualmente já é tecnicamente consagrada em nível mundial, mas não podemos deixar de levar em conta a priorização adequada dos combustíveis. O nosso carvão do Sul já é consagrado; não restam mais dúvidas quanto à necessidade premente de desenvolver o setor de gás natural, que pode oferecer energia limpa e flexível; biomassa, utilizando o bagaço de cana, é outro combustível indispensável para participar dessa grande estratégia; e não se pode esquecer a eficiência energética associada a projetos de co-geração. Portanto, é fundamental que a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que certamente fará um planejamento equilibrado da matriz energética brasileira, leve em consideração todos esses aspectos de segurança energética quando estabelecer os princípios básicos da nossa matriz. kicker: A térmica de Três Lagoas (MS) consome 100 milhões de metros cúbicos de gás por dia