Título: O plantio da safra 2004/05
Autor: Fernando Homem de Melo
Fonte: Gazeta Mercantil, 12/11/2004, Opinião, p. A-3

A queda nos preços internacionais dos grãos é preocupante. A safra 2004/05 está sendo plantada na região Centro-Sul em condições econômicas bastante adversas. Primeiro, a acentuada queda nos preços de grãos, particularmente da soja, no mercado internacional. Segundo, a apreciação de nossa taxa de câmbio que, perigosamente, está batendo na cotação de R$ 2,80/US$. Isso é preocupante, não só para a agropecuária. Terceiro, os aumentos dos custos de produção, em especial causados pelos fertilizantes. Finalmente, em quarto lugar, está a questão do crédito agrícola, escasso na parte que é "barata" (juros) e cara na parte livremente pactuada. Talvez a única variável econômica favorável seja o crescimento da economia agora em 2004 e previsto para 2005.

Mesmo nessas circunstâncias, o primeiro levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento - Conab (intenção de plantio) para a safra de grãos de 2005 (sendo agora plantada) mostra números relativamente favoráveis, tanto para a área como para as produções previstas. É até possível que o levantamento tenha sido feito cedo demais (início de outubro) no ano-agrícola. Isso, caso verdade, indicaria possíveis revisões para baixo nos próximos levantamentos. Caso contrário, como veremos com os números a seguir, cabe a pergunta: será que os agricultores estão sendo excessivamente especulativos? Será que as decisões já haviam sido tomadas no primeiro semestre e tornaram-se irreversíveis?

Vejamos os principais números. Primeiro, os de área a ser plantada, os dados mais confiáveis da pesquisa da Conab. A surpresa com a perspectiva de um crescimento na faixa de 0,8%-2,2% para a área plantada com os principais grãos (algodão, arroz, feijão - 1 safra; milho - 1 safra; e soja). Isso poderia representar um crescimento pouco superior a um milhão de hectares. É certo que a soja seria o carro-chefe, mas o algodão também mostraria aumento de área. Os números (médios) específicos são os seguintes: algodão, 6,0%; arroz, 2,3%; feijão, 1 safra, 6,3%; milho, 1 safra, 2,0%; soja, 4,7%. Somente este produto seria responsável por um aumento (ponto médio) de 1,003 milhão de hectares! Será que para soja e algodão a explicação seria uma maior expansão (ilegal) de variedades transgênicas?

Isso chama muito a atenção. Pujança da agricultura brasileira em um ambiente econômico desfavorável? Comparando-se os preços previstos para 2005 (em dólares) nas bolsas internacionais de Chicago e de Nova York com os realizados em 2004, obtemos as seguintes variações: algodão, 12,5%; soja, 28,5%; milho, 10,1%. Isso, combinado à apreciação da taxa de câmbio real, indica uma sensível queda nos preços recebidos pelos produtores no momento da comercialização no primeiro semestre de 2005. Acrescente-se a isso custos maiores e maiores juros médios e forma-se um quadro preocupante para todos os envolvidos, inclusive o governo.

A safra total está prevista (ponto médio do intervalo) em 129,889 milhão de toneladas. É possível que os níveis de produtividade estimados pela Conab estejam sobre-estimados, principalmente pelo menor uso de fertilizantes por hectare. As variações por produto são as seguintes: algodão, 7,1%; arroz, 5,7%; feijão, 1 safra, 2,1%; milho, 1 safra; 2,6%; e soja, 20,9% (recuperando a perda climática da safra de 2004). É certo que a agricultura brasileira está mostrando expressivos ganhos de produtividade e de competitividade, mas um pouco de prudência indica a necessidade de se esperar por dados da Conab com o ano agrícola um pouco mais avançado.

kicker: A variável econômica favorável é o crescimento da economia em 2004 e 2005