Título: O crescente interesse da Ásia pelo Brasil
Autor: Henrique Altemani de Oliveira
Fonte: Gazeta Mercantil, 12/11/2004, Opinião, p. A-3

A visita oficial ao Brasil dos presidentes da China, Hu Jintao; Coréia do Sul, Roh Moo-hyun; e Vietnã, Tran Duc Luong, demonstra o crescente interesse da Ásia pelo País. Para quem acompanha o relacionamento brasileiro com essa região, chamava a atenção o fato de Fernando Henrique Cardoso, quando presidente da República, ter viajado primeiro à China e só depois ao Japão. O gesto, indicador de prioridades governamentais, repetiu-se com a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Pequim, em maio passado, antes de Tóquio, para onde irá em abril próximo.

Também é emblemático o fato de a economia chinesa, a partir de 2002, estar superando a nipônica como o principal destino das exportações brasileiras à Ásia. Esse fato é muito relevante se considerado que, até meados dos anos 90, nossa aproximação com a Ásia estava restrita, no plano econômico, ao relacionamento com o Japão e, no aspecto político, com a China.

No entanto, o quadro recente de certo distanciamento e de apatia na relação bilateral com Tóquio teve uma reversão com a inesperada visita do primeiro-ministro Junichiro Koizumi ao Brasil em setembro passado. O Japão recuperou a confiança que teve no País nos anos 70 e que fora abalada pela crise da dívida externa dos 80 e a instabilidade econômica. Por fim, os fatos de o chefe de Estado estar acompanhado da federação das empresas japonesas, a Keidanren, e de ter proposto a abertura de negociações para a assinatura de um acordo bilateral de livre comércio indicam que se busca o aprofundamento do intercâmbio.

Essa nova atitude japonesa pode ser creditada, de um lado, aos receios de que a Alca e/ou de o aventado acordo Mercosul-União Européia possam limitar suas possibilidades no Brasil e até na América Latina. Sem dúvida, a visita de Koizumi também pode ser atribuída à preocupação com a crescente presença chinesa no Brasil e com o fato de o Japão estar sendo substituído na posição de principal parceiro asiático. Já a presente visita de Hu Jintao pode, de um lado, ser considerada uma retribuição à de Lula em maio e, de outro, uma demonstração do interesse na manutenção da parceria estratégica estabelecida entre os dois países.

Destaca-se que o relacionamento sino-brasileiro apresenta-se como altamente promissor pela constatação de inúmeras complementaridades no plano econômico e, de outro, pela presença em ambos os países, nos últimos 30 anos, de uma real vontade política de estabelecimento de cooperação no plano bilateral e de atuação conjunta na agenda internacional. Se a China era privilegiada como parceiro político, hoje é também importante partner econômico. No entanto, no plano comercial, aparentemente é o Brasil que mais necessita da China. Nosso principal produto nesse relacionamento, a soja, sofre grande concorrência, em particular dos Estados Unidos, que pressionam os chineses para que ampliem as compras de seu cereal a fim de reduzir o forte superávit bilateral favorável à nação asiática.

A visita de Hu Jintao, todavia, introduz uma questão pontual que coloca em xeque a perspectiva estratégica do relacionamento entre os dois países. A China pressiona o Brasil para que lhe confira o status de economia de mercado, o que representaria a aceitação de que os preços dos produtos chineses são formados de acordo com as leis naturais da economia e não pela intervenção estatal. De outro lado, deve ser assinado o acordo que classifica o Brasil como destino turístico aprovado.

Enquanto o Japão, por intermédio de sua participação no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), financia encontros sobre o Focalal, tanto a China quanto a Coréia do Sul procuram apoio brasileiro para sua admissão como membros do BID. A Coréia do Sul desponta como parceiro interessante, enquanto apresenta a tendência de investimentos no Brasil, voltados à instalação de indústrias com produtos direcionados à exportação e ao mercado interno. Ao contrário dos propalados investimentos chineses, que seguem a tendência já implementada anteriormente pelo Japão, de priorizar projetos que garantam fonte segura e contínua de fornecimento de produtos básicos.

Nesse sentido, a proposta coreana não deixa de ser atrativa, ao não se enquadrar na percepção asiática do Brasil fornecedor de produtos básicos. Destarte, no que tange a esses países, a política externa brasileira depara com um momento positivo ao poder restabelecer a forte parceria econômica que mantinha com o Japão, agregar à parceria estratégica a relação econômica com a China e abrigar a Coréia do Sul como produtora de manufaturados no território nacional. Por fim, um alerta: se com o país do sol nascente não há empecilhos políticos, com a China será necessário ter o cuidado de evitar que questões comerciais estremeçam os laços que marcam a atuação conjunta nos fóruns multilaterais.

kicker: A China já era parceiro político, agora tambémé importante partner econômico