Título: Seminário discute como chegar às classes populares
Autor: Denise Bueno
Fonte: Gazeta Mercantil, 10/11/2004, Finanças, p. B-2

O principal desafio do mercado de seguros em 2004 e também em 2005, segundo as principais lideranças do setor, é aumentar a base de consumidores, hoje restrita as classes A, B e C. Para debater o porquê da dificuldade de vender seguro para a população de baixa renda, a Associação Paulista dos Técnicos em Seguro (APTS) e o Instituto Roncarati de Ciências do Seguro escolheram como tema para a terceira edição do Seminário Ética e Transparência na Atividade Seguradora o "Seguro Possível".

"O brasileiro não consome mais seguro por que é caro ou por que as coberturas são inadequadas ou ineficazes", questionou Antonio Penteado Mendonça, consultor e advogado especializado em seguro, e um dos organizadores do evento, que reuniu ontem, em São Paulo, as principais lideranças do setor. É pelas duas razões.

O seguro residencial foi um exemplo citado. O produto tem valores anuais a partir de R$ 100 para coberturas básicas. Mas poucas pessoas têm. Segundo Marcelo Blay, vice-presidente da Itaú Seguros, há um potencial estimado de 19 milhões de residências sem seguro. "Temos 47,6 milhões de domicílios no Brasil, dos quais menos de 2 milhões estão segurados", informou durante sua palestra. Enquanto nos Estados Unidos 92% das residências próprias têm seguro, no Brasil esse índice cai para menos de 4%.

Segundo Blay, um dos fatores que explica o baixo índice de venda é o desconhecimento de que o prêmio é inferior ao de um automóvel, apesar de a importância segurada de um imóvel ser muito superior a de um veículo. Ou seja, o produto é considerado barato. "Há cobertura de seguro para inundações. Para quem mora no alto da avenida Paulista. Dificilmente alguém que more próximo a uma região com risco de alagamento conseguirá cobertura", comentou Mendonça.

A discussão sobre coberturas avançou para o seguro de vida, comercializado por seguradoras ligadas a bancos, e de automóvel, dominado pelos corretores independentes. "A Bradesco vendeu mais de 1,5 milhão de apólices do seguro popular de vida. E não foi preciso alterar legislação ou mudar normas. Bastou a boa vontade", disse Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente da Bradesco Seguros e Previdência. "Mas você sabe quanto custa a cobrança bancária? Ela é quem inviabiliza a venda de produtos populares", alfinetou Leôncio de Arruda, presidente do Sindicato dos Corretores de São Paulo (Sincor-SP).

Já em automóvel, o produto popular só vai existir se a sociedade quiser, segundo Trabuco. Para viabilizar um seguro mais barato as seguradoras alegam que precisam reduzir a cobertura, pois o segmento já trabalha com margens apertadas. "Precisamos discutir o uso de peças usadas, compartilhar o risco com o segurado com franquia para colisão, discutir a adoção de oficinas referenciadas para poder reduzir o preço", relatou. A saúde foi citada como exemplo. "Para os agentes econômicos a saúde não tem preço. Mas tem. Se você descasar ativos e passivos compromete a saúde financeira da empresa. O BNH quebrou porque ativos e passivos foram descasados, com uma inflação de 42% e reajuste de prestações de 20%."

Para Mendonça, o seguro possível é aquele que protege a sociedade brasileira com um todo. "Por que não temos seguro rural, quando o agribusiness é a locomotiva da economia brasileira?". Segundo os agricultores, não há coberturas adequadas. Para se ter coberturas contra o tempo, o preço é alto, e por isso os governos de países desenvolvidos subsidiam o prêmio.

Para Trabuco, é preciso sair do chamado efeito "tostines": se o seguro é caro porque a base de clientes é pequena ou se a base é pequena porque o seguro é caro. "O seguro possível está ligado ao crescimento do país e à distribuição de renda e isso não acontece da noite para o dia. E também depende de um choque de treinamento e de educação de todos os envolvidos no processo", resumiu.