Título: Relações Brasil-Rússia em novo patamar
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 18/11/2004, Opinião, p. A3

É auspiciosa a notícia da assinatura de um acordo de investimento de mais de US$ 1 bilhão entre um consórcio de empresas russas de energia e a Petrobras, na segunda-feira, quando do encontro entre o presidente Vladimir Putin e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Brasília. Pois, a despeito do ingente esforço da diplomacia comercial brasileira para estreitar as relações bilaterais com a Rússia - visita a Moscou de quatro ministros de Estado e do vice-presidente José Alencar, em um ano -, nada de muito substancial se havia alcançado até agora, um fato especialmente frustrante para o presidente Lula, que em seu discurso de posse destacara as relações com a Rússia como uma das prioridades da agenda externa de seu governo.

Entre outras operações, o acordo prevê a construção de uma refinaria de petróleo no Brasil com equipamentos e tecnologia da Rússia - previsão que, se vier a ocorrer, vai colocar as relações comerciais e econômicas entre os dois países em um novo patamar. Até agora, apesar dos muitos acenos de mútua disposição para a aproximação bilateral, somente o comércio de mercadorias se havia constituído como o aspecto mais visível dessas relações, inexistindo praticamente vínculos de outra natureza, tais como no comércio de serviços, investimentos diretos de parte a parte ou outras formas de interação econômica bilateral.

No momento em que a Rússia, por determinação do presidente Putin, tem procurado explorar os mercados dos países em desenvolvimento para escoar a produção de sua indústria bélica, autoridades brasileiras e russas reiteram a determinação de intensificar contatos diretos entre os setores privados de ambos os países. Vem de ser constituído o Conselho Empresarial Brasil-Rússia, com o objetivo de dinamizar as relações econômico-comerciais bilaterais, por meio da promoção de ações orientadas à diversificação, nos dois sentidos, da pauta de bens e serviços, em especial no tocante a produtos de maior valor agregado.

Os números recentes do comércio bilateral demonstram o potencial de seu crescimento. A corrente de comércio, depois de atingir US$ 1,5 bilhão em 2001, chegou a US$ 2 bilhões em 2003, um recorde histórico. No ano passado, também foi alcançado o recorde no valor das exportações brasileiras, US$ 1,5 bilhão, o que representou um crescimento de 20% em relação a 2002. Para este ano, confirma-se a continuidade das expectativas de expansão. Até setembro, as exportações brasileiras somaram US$ 1,7 bilhão, um crescimento de 21% em relação a igual período do ano passado. Já as importações alcançaram US$ 555 milhões em 2003, o que representou um aumento de 30% em relação ao ano anterior: para 2004, a expectativa é de um crescimento de 86% em relação ao ano anterior.

Esses resultados atestam que a corrente de comércio atual está longe de corresponder ao potencial de ambas as economias. Além disso, apresenta-se muito concentrada em poucos produtos - agroindustriais, notadamente açúcar e carne, por parte do Brasil, e produtos químicos, em especial fertilizantes, por parte da Rússia.

Interessado em diversificar a pauta, em ambos os sentidos, o Brasil oferece produtos e serviços já vendidos com sucesso em outros mercados, tais como aeronaves executivas; serviços de engenharia; máquinas e equipamentos; partes, peças e utensílios para automóveis; produtos eletrônicos e de automação bancária; software; equipamentos médico-hospitalares, produtos da indústria têxtil e outros, do agronegócio.

A Rússia, por sua vez, como potência energética em crescente expansão, tem diante de si inúmeras oportunidades de cooperação no domínio do gás natural, energia elétrica, combustíveis renováveis, mineração e energia nuclear. As vantagens competitivas da Rússia nessas áreas poderiam ensejar, por exemplo, o desenvolvimento conjunto de turbinas e a formação de "joint ventures" para a fabricação no Brasil de equipamentos e materiais para o setor de energia. Existe também por parte do Brasil interesse em iniciativas de cooperação em tecnologias de geração e transmissão de energia elétrica. No setor de gás e petróleo, o Brasil tem incentivado a participação de empresas russas em licitações no País e a cooperação científica na área de gás natural.

A essas iniciativas a Rússia tem respondido com moderado interesse, empenhada que está, em suas relações bilaterais, em desenvolver parcerias especiais com a China e com a Índia, também na área energética. Também são positivas as expectativas de cooperação na utilização do espaço exterior para fins pacíficos. kicker: As relações bilaterais poderão evoluir da simples troca de mercadorias para acordo de investimentos