Título: Sebrae constata que pequenas não têm crédito
Autor: Luciana Otoni
Fonte: Gazeta Mercantil, 26/08/2004, Finanças & Mercados, p. B-2

A taxa média de juros de 40,3% ao ano - já descontada a inflação - paga pelos tomadores de crédito no Brasil é a mais alta num grupo de 93 países. O dado consta no diagnóstico sobre o setor financeiro divulgado ontem pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), segundo o qual o dinheiro disponível nos bancos, além de caro, é de difícil acesso. Uma combinação especialmente prejudicial para 4,6 milhões de pequenos negócios que empregam 14,5 milhões de pessoas.

Pesquisa feita pelo Sebrae com um grupo de 450 empresários de São Paulo constatou que 78% das micro e pequenas empresas consultadas não tomaram empréstimos no setor financeiro neste ano. Nesse segmento, a maior parte da demanda (55%) é por capital de giro, sendo que mais da metade (52%) solicita empréstimos de até R$ 10 mil e a maioria (66%) pede prazo de pagamento inferior a 30 meses. Entre as empresas pesquisadas, 61% nunca tomaram empréstimos bancários tradicionais e 74% desconhecem ou possuem pouca informação sobre o programa de microcrédito.

A restrição ao crédito tem empurrado os empreendedores para a ciranda dos cheques pré-datados, modalidade de financiamento utilizada por 45% das empresas. O financiamento por cartão de crédito e cheque especial é a opção utilizada por 29% das pessoas jurídicas de pequeno porte. Como uma deficiência acaba por acarretar outra, quando o empresário obtém acesso ao sistema, o desconto de duplicatas e notas promissórias é a modalidade mais ofertada. "O crédito é feito a partir de negócios já ocorridos, com baixa criação de poder de compra novo e taxas de juros que comprometem a rentabilidade e a capitalização das empresas", constatou o diagnóstico.

Apesar das inúmeras restrições, o diretor Administrativo-Financeiro do Sebrae, Paulo Okamoto, diz acreditar que a tendência é de redução das barreiras ao crédito. "Os bancos perceberam que precisam se posicionar no nicho das micro e pequenas empresas. E quem fizer isso vai ter mais chances de ganhar dinheiro", avaliou.

A falta de garantias reais (40%) é a principal barreira citada nas negociações com os bancos. No ranking das exigências, constam também registro no Cadin/Serasa (16%), insuficiência de documentos (12%), inadimplência da empresa (9%) e linhas de créditos fechadas (7%).

O diagnóstico apurou também que freqüentemente o bolso do dono é usado para pagar as contas das empresas. Entre os 450 empresários pesquisados, 89% informaram ter conseguido obter empréstimo em seu nome. Na análise de Paulo Okamoto, quatro fatores tendem a reduzir essas dificuldades: a permanência de um ambiente de crescimento; a formação de um sistema de garantias voltado para os pequenos; a oferta de informações mais completas sobre a gestão desses negócios; e a expansão das cooperativas de crédito.

Para além das avaliações técnicas, o chão de fábrica reclama o acesso a recursos capazes de impedir a mortalidade dos pequenos negócios. Em Minas Gerais, as dificuldades da economia, combinadas com a restrição ao crédito e a falta de preparo em gestão, reduziram de 2.200 para 400 o número de filiados à Associação Mineira das Micro e Pequenas Empresas (Amipeme), entre 2000 e 2003.

"É preciso encontrar formas de emprestar dinheiro para quem não têm cadastro positivo", comentou o empresário Ildeu de Oliveira Santos, que integra o conselho da Amipeme. Dono de uma metalúrgica, Ildeu de Oliveira é um dos empreendedores que tenta reerguer negócios em dificuldades. "Se a empresa tem algum tipo de restrição cadastral o financiamento não sai e com isso não se consegue reestruturá-la", lamentou.

Segundo o diagnóstico do Sebrae, a maior parte dos pedidos de empréstimos é para capital de giro. Os empréstimos mais desejados são para compra de mercadorias e insumos (55%), máquinas e equipamentos (36%), reforma (21%), pagamento de dívidas (21%) e pagamento de impostos e aluguel (7%). Recente pesquisa mostrou que das 470 mil micro e pequenas empresas que abrem as portas a cada ano no Brasil 49,4% quebram antes de completar dois anos.