Título: Falta eucalipto para reflorestamento em MG
Autor: Durval Guimarães
Fonte: Gazeta Mercantil, 26/08/2004, Agribusiness, p. B-12

Minas Gerais está vivendo intensa retomada no plantio de florestas para a produção de carvão vegetal, motivada pela falta de madeira e, sobretudo pela saída da China do mercado internacional de ferro-gusa, no qual competia com 5 milhões de toneladas anuais. Em decorrência, explodiram as exportações brasileiras do produto e também não há mudas de eucalipto suficientes para atender às siderúrgicas interessadas em expandir seus negócios e aos fazendeiros ansiosos para entrar no ramo de reflorestamento. Cada tonelada de ferro necessita de 750 quilos de carvão (ou 25 árvores), que são jogados no alto-forno para liberar o carbono e formar a liga. Coincidentemente, a produção mineira de ferro-gusa em 2003 foi de 5 milhões de toneladas, está em crescimento e, do total, a metade segue ao exterior, informa o sindicato do setor.

Com mais de 25 mil quilômetros de área plantada, as florestas de eucalipto em Minas Gerais são tão vastas que dariam para cobrir o estado de Sergipe. A Acesita Energética e a Plantar são as principais empresas mineiras fornecedoras de matrizes de eucalipto, que é a espécie preferida nos reflorestamentos e produzem anualmente mais de 120 milhões de mudas a partir de árvores clonadas. Ainda assim, toda produção do próximo ano já está vendida, segundo a diretoria. Em muitos casos, os pedidos foram pagos antecipadamente. No momento, há apenas sementes disponíveis, que nem sempre brotam depois do plantio ou, ainda, mudas produzidas diretamente dos grãos, que apresentam produtividade muito acanhada.

Só sete anos após o plantio que o eucalipto oferece condições econômicas para ser abatido. Mas, ainda que a China esmoreça em suas compras, esse reflorestamento avassalador não estará perdido, pois o mercado potencial continuará gigantesco. Mais da metade do aço que sai das siderúrgicas mineiras é produzida a partir do carvão mineral, que poderia ser substituído, com grande vantagem técnica pelo vegetal, embora uma mudança em alto-forno seja operação demorada, exigindo meses de trabalho. Outra superioridade está no preço: enquanto a tonelada de carvão vegetal está a US$ 140, a do mineral não para de oscilar e já chegou a ser vendida a US$ 450.

A situação tem causado embaraço aos tradicionais fornecedores de mudas, sobretudo a Acesita Energética, que há um mês anunciou o desenvolvimento da variedade HC-1528, capaz de produzir 262 toneladas de madeira por hectare. Essa árvore tem produtividade quase dez vezes superior que as plantadas, em 1974, quando foi iniciado o grande programa de reflorestamento em Minas. De imediato, seus clientes não serão beneficiados por essa conquista, pois a empresa pretende até reduzir drasticamente a oferta do produto para atender a um provável aumento de demanda interna. "Tenho recebido muitos pedidos de produtores de ferro-gusa, mas nada poderá ser feito, já que teremos de triplicar nosso próprio plantio a partir de janeiro, que atualmente é de 4,5 mil hectares anuais", afirma Paulo Sadi, diretor de florestas da energética.

Importação de florestas

A reflorestadora se depara com a mesma angústia dos seus clientes. Sua atividade prioritária é a de produzir carvão para a principal empresa do grupo, a siderúrgica Acesita, que hoje alcança 12,5 mil toneladas mensais. Caso a usina volte a produzir ferro-gusa em seus dois fornos e não apenas em um, como ocorre no momento, o fornecimento será duplicado. Em 1996, seduzida pela paridade entre o real e o dólar a siderúrgica converteu um dos seus fornos para carvão mineral e, agora, com a tonelada de carvão mineral cotada a valores superiores ao do vegetal, o que era vantagem tornou-se um problema e a empresa examina até a possibilidade de importar florestas.

Com ou sem mudas de grande qualidade ou, então, se submetendo às incertezas das sementes jogadas no solo, os mineiros estão plantando muito. Segundo o engenheiro florestal, José Batuíra de Assis, secretário executivo da Associação Mineira de Silvicultura, entidade que reúne os principais reflorestadores e consumidores de madeira no estado, deverão ser plantados 120 mil hectares de eucalipto no estado em 2004, quantidade 50% superior ao plantio de 2003, por sua vez, já foi maior que a do ano anterior. "Ainda assim, deverá faltar madeira e, diante disso, teremos um verdadeiro apagão florestal, dentro de dois anos", diz.

Segundo o professor Laércio Couto, do curso de pós graduação em Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, esse problema não estaria acontecendo, caso o governo federal, na década passada, não tivesse cortado o programa de financiamento ao plantio de florestas. Sem crédito, os plantios, que eram superiores a 100 mil hectares ao ano, foram se amesquinhando até cair para menos de 60 mil. "A atividade foi negligenciada e, agora, a sociedade está pagando um preço muito caro, incluindo o abate clandestino de florestas nativas."

Compras chinesas

Grande responsabilidade pelo problema também deve ser atribuída ao governo chinês que, desde o início do ano, saiu do mercado exportador e tornou-se grande importador de produtos siderúrgicos. Em decorrência dessa mudança de comportamento, os pedidos de compra de ferro-gusa avolumaram-se nas mesas dos industriais mineiros. Em janeiro, os 41 produtores mineiros de ferro-gusa, que vinham trabalhando com muitos fornos apagados, acenderam todos eles, com objetivo de atender a demandas que não param de crescer. O preço da tonelada do produto foi às alturas, com mais de 100% de aumento e hoje é colocada a US$ 310 dólares, no porto de Vitória (ES).

No mesmo ritmo trabalham siderúrgicas e indústrias de fundição, sendo que as últimas, até o final do ano, deverão encostar no limite da sua capacidade instalada, que é de três milhões de toneladas de peças fundidas em ferro. Para se produzir uma tonelada de gusa as siderúrgicas necessitam de pelos 750 quilos de carvão, venha de onde vier.